Responsabilidades
Justiça de Brasília entende que Google Brasil não é responsável pela inserção de conteúdos em blog
Em maio de 2010, o autor alegou que simpatizantes de um pré-candidato às eleições para governador do DF publicaram no blog uma nota caluniosa, afirmando que o autor teria sido preso por desvio de verbas de programas sociais do Ministério do Esporte. O governador afirmou que a informação não é verídica e pediu para Google Brasil retirar o conteúdo do site imediatamente, sob pena de multa diária de R$ 10 mil.
A ré contestou, sob o argumento de que não é possível fiscalizar previamente o conteúdo e fornecimento de dados pessoais, como RG, CPF e endereços. A Google Brasil se respaldou no princípio da liberdade de expressão e de manifestação do pensamento.
Na decisão, o juiz salientou que não há fundamento para atribuir à ré a obrigação de retirar do site as opiniões realizadas por terceiros. O magistrado explicou que a relação jurídica entre o blogueiro e a ré é definida no termo de adesão disponível na internet. No termo consta que o usuário concorda em isentar e desresponsabilizar o Google de qualquer despesa proveniente de queixas, perdas, danos, ações judiciais, sentenças, despesas processuais ou honorários de qualquer tipo e natureza.
Segundo o magistrado, "a empresa Google Brasil Internet Ltda não gerencia nem administra o blog 'azulroriz', de modo que não é responsável pelas inserções realizadas". O juiz esclareceu também que as publicações injuriosas e caluniosas contra o autor decorreram do processo eleitoral e que o TRE possui mecanismos e instrumentos próprios tanto para identificar os ofensores quanto para coibir a ação de terceiros, facilmente identificável pelo internet protocol (IP). "A conduta informada neste processo chega mesmo a constituir, em tese, crime eleitoral previsto no art. 324 do Código Eleitoral (clique aqui)", acrescentou o juiz.
O magistrado julgou improcedente o pedido e condenou o autor ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, fixados em R$ 1.500.
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Processo : 2010.01.1.102524-0 - clique aqui.
Confira abaixo a decisão na íntegra.
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SENTENÇA
Trata-se de ação de rito ordinário proposta por Agnelo Santos Queiroz Filho, com pedido de condenação em obrigação de fazer, contra Google Brasil Internet Ltda.
Diz o autor que em maio passado simpatizantes de um pré-candidato às eleições para Governador do Distrito Federal, autores do "blog do azul" publicaram nota difamatória, injuriosa e caluniosa à pessoa do autor, a qual dava conta da sua prisão, decretada sob o fundamento de envolvimento com desvio de verbas de programas sociais do Ministério do Esporte, informação que afirma ser totalmente inverídica.
Afirma que em razão do caráter quase apócrifo do blog e da afirmação de que a ré estimula a existência de tais serviços, pede seja ela condenada na obrigação de retirar imediatamente a notícia, sob pena de multa diária de R$ 10.000,00. Juntou os documentos de fl. 01 e seguintes.
Citada (fl. 30), a ré contestou, prestando informações sobre o seu funcionamento e sobre o blogger. Diz que há impossibilidade técnica e fática de fiscalização prévia de conteúdo e de fornecimento de dados pessoais como RG, CPF e endereços. Afirma, entretanto, que é possível a identificação dos computadores de onde se origina o conteúdo com o IP, que é o "internet protocol"
Respalda-se no princípio da liberdade de manifestação do pensamento e da liberdade de expressão para concluir pela inexistência de responsabilidade civil no que se refere à obrigação de fazer, também afirmando que não há nexo causal entre o suposto dano e a conduta da Google.
Pede a improcedência do pedido e junta os documentos de fl. 63 e seguintes.
Houve réplica (fl. 100).
É o breve relatório.
DECIDO.
Não há provas a serem produzidas, além das já constantes dos autos, pois os fatos controvertidos podem ser conhecidos à luz dos documentos juntados. É caso, pois, de julgamento antecipado da lide, na forma do art. 330, inciso I do CPC.
Não há questões processuais a serem decididas, razão pela qual passo a examinar o mérito.
O que pretende o autor é imputar à ré a responsabilidade pelo cumprimento da obrigação de retirar conteúdo de matéria inserida na rede mundial de computadores através do blog referido.
Entretanto, não vislumbro fundamento para imputar à última o cumprimento da obrigação de fazer retirar do site as imputações e opiniões realizadas por terceiros. Com efeito, a relação jurídica que se estabelece entre o blogueiro e a ré é definida no termo de adesão disponível na "rede", onde consta:
"Você concorda em isentar e desresponsabilizar o Google e suas subsidiárias, afiliadas, representantes, agentes e funcionários de queixas de terceiros causadas pela ou relacionadas a sua utilização do Serviço, incluindo qualquer responsabilidade ou despesa proveniente de queixas, perdas, danos (diretos e conseqüentes), ações judiciais, sentenças, despesas processuais ou honorários de qualquer tipo e natureza. Em tais casos, o Google o notificará por escrito quanto à queixa, ação judicial ou ao processo." (https://www.blogger.com/terms.g, em 19.03.2011, às 09:10).
E empresa Google Brasil Internet Ltda não gerencia nem administra o blog "azulroriz", de modo que não é responsável pelas inserções realizadas. Com efeito, a empresa ré não explora atividade típica dos jornais, que consiste em editar e divulgar fatos e opiniões, nem pode se comprometeu a selecionar aquilo que publica, de conformidade com critérios pessoais. A sua atividade consiste em disponibilizar ferramentas tecnológicas, cabendo a cada jornal, mídia ou pessoa física a responsabilidade pelo conteúdo inserido.
"AGRAVO DE INSTRUMENTO. GOOGLE. SITE DE RELACIONAMENTO. BLOQUEIO.
Sites como Google consistem em meros instrumentos de disponibilização de informações, bem como que os conteúdos publicados na Internet são inseridos livremente pelos milhões de usuários. Estão disponíveis, no mundo virtual, inúmeros sites de imagens, de busca e de relacionamento, que também podem divulgar as informações reputadas ofensivas aos autores. Esse fato revela a impossibilidade material de o Google se responsabilizar por toda e qualquer publicação ofensiva aos agravados que esteja disponível na Internet.
Não se mostra possível tecnicamente a determinação para que uma instituição como o Google efetue juízo de valor sobre o que é ou não ofensivo e bloqueie o acesso aos conteúdos que reputar ofensivos, não se revelando praticável, igualmente, a ordem para que todos os conteúdos referentes aos fatos narrados na inicial sejam bloqueados, uma vez que inexiste tecnologia para tanto. Agravo de instrumento conhecido e parcialmente provido." (20100020007066AGI, Relator ANA MARIA DUARTE AMARANTE BRITO, 6ª Turma Cível, julgado em 28/04/2010, DJ 06/05/2010 p. 109)
Por isso, não há responsabilidade da ré pelo cumprimento da obrigação que lhe é imputada. Considero até a possibilidade de, em caso extremo, utilizar os meios tecnológicos da ré para compelir o cumprimento de uma obrigação de fazer não atendida pelo responsável principal, em face do que dispõe o art. 634 do CPC.
"Art. 634. Se o fato puder ser prestado por terceiro, é lícito ao juiz, a requerimento do exeqüente, decidir que aquele o realize à custa do executado."
É que ao Google, como a todo cidadão, é imposta a obrigação de colaborar com o Poder Judiciário no restabelecimento da legalidade, mas não lhe pode ser imputada a função de censor por não estar preparada tecnicamente para isso e por não ter essa missão, que é mesmo incompatível com o regime democrático em que nos inserimos.
Mas não é disso que se trata no presente processo, pois não há notícia de que o ofensor tenha sido citado ou intimado para cumprir obrigação de retirar o conteúdo reputado ofensivo.
Como afirma o próprio autor, as publicações injuriosas e caluniosas à pessoa do autor decorreram do processo eleitoral então deflagrado, para cuja fiscalização e acompanhamento é competente o Tribunal Regional Eleitoral, o qual dispõe de mecanismos e instrumentos próprios tanto para identificar os ofensores quanto para coibir a ação de terceiros, facilmente identificável pelo intenert protocol (IP). A conduta informada neste processo chega mesmo a constituir, em tese, crime eleitoral previsto no art. 324 do Código Eleitoral.
Observe-se que o réu afirma a possibilidade técnica de o autor do blog retirar o conteúdo (fl. 33) e poderia o autor, como pré-candidato a Governador do Distrito Federal acionar o Tribunal Regional Eleitoral para identificar o responsável pelo conteúdo caso tivesse alguma dúvida sobre a origem. Não se compreende porque o autor evitou acionar o autor do blog e acionou diretamente a ré.
ANTE O EXPOSTO, julgo improcedente o pedido. Condeno o autor ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, os quais fixo em R$ 1.500,00.
Cumpra, o devedor, a obrigação de pagar ora estabelecida, no prazo de 15 dias, sob pena de multa de 10%, na forma do art. 475-J do CPC.
Brasília - DF, segunda-feira, 21/03/2011 às 13h46.
AISTON HENRIQUE DE SOUSA
Juiz de Direito
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