Empresa X Sindicato
Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo é condenado a pagar indenização por danos materiais à empresa
Em sentença proferida, a juíza da 6ª vara Cível do Fórum Central João Mendes Júnior, Dra. Lúcia Caninéo Campanhã, julgou parcialmente procedente a ação de indenização por danos materiais movida pela empresa Ilumatic S/A Iluminação e Eletrometalúrgica contra o Sindicato dos Metalúrgicos do Estado de São Paulo, condenado a pagar indenização no valor de R$ 82.684,87.
Em 20 de outubro de 2005, a empresa sofreu total paralisação de suas atividades devido a um bloqueio, promovido pelo sindicato, em sua principal de via de acesso, impedindo, dessa forma, o ingresso dos funcionários na empresa.
Conforme texto da sentença, "o requerido compeliu a autora a ceder seus empregados para que participassem de manifestação de cunho político em outra empresa da região, sob pena de impedir os demais funcionários de adentrar na empresa autora".
Diante da publicação na imprensa de uma nota da empresa de repúdio ao ato, o sindicato retornou ao local, em 28 de outubro de 2005, e novamente impediu a entrada de funcionários, desta vez, por uma hora.
A juíza decidiu, em 26 de julho de 2010, que "em razão da paralisação ilegal e imotivada, a empresa sofreu danos materiais no valor de R$ 82.684,87, referente à folha de pagamento, despesas fixas, lucro líquido sobre os produtos não produzidos".
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Leia abaixo a sentença na íntegra.
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Vistos.
ILUMATIC S/A ILUMINAÇÃO E ELETROMETALÚRGICA moveu Ação de Indenização contra SINDICATO DOS METALÚRGICOS DE SÃO PAULO, MOGI DAS CRUZES E REGIÃO, alegando que sofreu total paralisação de suas atividades no dia 20 de outubro de 2005, uma vez que o requerido bloqueou a principal via de acesso à empresa, impedindo o ingresso dos trabalhadores; alguns funcionários sofreram ameaças de terem seus veículos avariados; o requerido compeliu a autora a ceder seus empregados para que participassem de manifestação de cunho político em outra empresa da região, sob pena de impedir os demais funcionários de adentrar na empresa autora; as partes estavam em tratativas para o dissídio da classe, não existindo motivo aparente para a paralisação; notificou o requerido extrajudicialmente e publicou na imprensa nota de repúdio ao ato; em retaliação à notificação, o requerido retornou à empresa no dia 28 de outubro de 2005 e mais uma vez impediu a entrada dos trabalhadores, diretores e gerentes, dessa vez por apenas uma hora; nessa segunda oportunidade, representante do sindicato citou nominalmente os funcionários que lhe encaminharam notificações se opondo ao desconto da contribuição confederativa; em novembro daquele ano as propostas de reajuste da categoria foram aprovadas sem maiores conseqüências; na data de 18 de agosto de 2005, o requerido exigiu que a empresa fornecesse quarenta empregados para manifestação de movimento “contra a corrupção no governo federal”, cedeu com medo de represálias; no dia 6 de setembro de 2005, repetiu-se a exigência para movimento “contra o mensalão e contra os juros altos”, contra sua vontade, mais uma vez cedeu dessa vez vinte empregados, sendo constantemente vítima das imposições do sindicato; em razão da paralisação ilegal e imotivada sofreu danos materiais no valor de R$ 82.684,87, referente à folha de pagamento, despesas fixas, lucro líquido sobre os produtos não produzidos e uma hora do dia 28; sofreu ofensa à honra objetiva, os fornecedores, clientes e bancos não compreendiam os motivos da paralisação e a comunicação foi interrompida por falta de operador do sistema de telefonia; os diretores e funcionários da área administrativa foram arrancados do interior de seus veículos, sofrendo abalo psicológico.
Requereu a condenação do réu no pagamento de indenização por danos materiais no valor de R$ 82.684,87 e por danos morais no valor a ser arbitrado pelo juízo. Nos autos da medida cautelar, deferido parcialmente o pedido de liminar para assegurar o acesso dos funcionários às dependências da autora, sob pena de multa no valor de R$ 10.000,00.
Interposto recurso de agravo, negaram-lhe provimento.
Aditada a petição inicial para atribuir aos danos morais o valor de trinta salários mínimos, equivalente a R$ 10.500,00. O réu foi citado e apresentou contestação, alegando preliminares de incompetência absoluta e ilegitimidade de parte.
No mérito sustentou que os trabalhadores realizaram movimento paredista no dia 20 de outubro de 2005, no curso da campanha salarial, pois a data-base da categoria é no dia 1º de novembro; a greve consiste numa forma legítima de reivindicação da classe trabalhadora para provocar a negociação coletiva; o movimento foi legítimo e resultou na celebração da Convenção Coletiva de Trabalho; no dia 28 de outubro de 2005, realizada apenas uma assembléia e não paralisação; nos dias 18 de agosto e 6 de setembro de 2005, a empresa cedeu os trabalhadores para participarem das manifestações apontadas, não houve qualquer exigência nesse sentido, mas apenas uma solicitação; manteve assistência aos trabalhadores, comparecendo na porta da empresa; seus representantes não invadiram nem proferiram palavras desrespeitosas, apenas acompanharam o movimento grevista deflagrado pelos próprios trabalhadores; jamais impediu o direito de acesso às dependências da autora, a manifestação foi realizada de forma mansa e pacífica; a polícia militar retirou-se sem lavrar qualquer ocorrência; em 27 de junho de 2005 instaurado Dissídio Coletivo de Greve e as partes se compuseram; assegurado constitucionalmente o direito de greve; não praticado ato ilícito nem deu causa a prejuízos da autora; não demonstrado que houve exposição da imagem da empresa; requereu a realização de perícia técnica para apurar o faturamento diário da autora e que eventual indenização por danos morais não supere o valor de R$ 1.000,00.
Frustrada a tentativa de conciliação. Acolhida a preliminar de incompetência absoluta. Interposto recurso de agravo, deram-lhe provimento. Designada audiência de instrução e julgamento, foram ouvidos o representante legal da autora em depoimento pessoal e quatro testemunhas. As partes manifestaram-se em alegações finais.
É o relatório.
DECIDO.
Trata-se de ação de indenização por danos materiais e morais decorrentes da paralisação das atividades da empresa supostamente promovida pelo sindicato requerido, nas datas de 20 e 28 de outubro de 2005.
A preliminar de incompetência absoluta ficou superada, em conformidade com o v. acórdão (fls.324/327). Afasto a preliminar de ilegitimidade passiva.
Consta da petição inicial que representantes do requerido bloquearam a principal via de acesso à empresa e impediram o ingresso dos trabalhadores de forma autoritária, abusiva e ilegal.
Considerando que se atribui aos representantes do réu a prática de ato ilícito, vislumbra-se a sua legitimidade para figurar no pólo passivo da ação de indenização. No mérito, a ação é parcialmente procedente. O
requerido não nega a paralisação do dia 20 de outubro de 2005, mas alega que se tratou de um movimento grevista, no curso da campanha salarial, deflagrado pelos próprios trabalhadores e que não impediu o acesso às dependências da autora. Quanto ao movimento do dia 28 de outubro de 2005, sustentou que se tratou apenas de uma assembléia.
Nas datas de 18 de agosto de 2005 e 6 de setembro de 2005, a autora cedeu seus funcionários para que participassem dos movimentos denominados “contra a corrupção no governo federal” e “contra o mensalão e contra os juros altos”. Consta da petição inicial, que a autora cedeu às exigências do requerido com receio de sofrer represálias, enquanto que na contestação o requerido alega que não houve qualquer exigência nesse sentido e sim uma mera solicitação. Durante a instrução, o representante da autora contou que em outubro de 2005, estacionaram três ônibus na frente da empresa para que os funcionários participassem de manifestação no bairro da Mooca. A empresa não cedeu os trabalhadores, o que ocasionou a paralisação de suas atividades. Naquela ocasião não havia nenhuma reivindicação dos empregados (fls.381/383).
A testemunha Sr. Mário trabalhou na empresa autora como gerente administrativo financeiro e confirmou que representantes do sindicato estacionaram dois ou três ônibus na manhã do dia 20 de outubro para levar os trabalhadores até uma empresa da Mooca, que não tem nenhuma relação com a autora. Os funcionários queriam entrar, mas ninguém foi autorizado e naquele dia as atividades ficaram paralisadas. No dia 28 de outubro, a manifestação dos representantes do requerido durou em torno de uma hora ou uma hora e meia, oportunidade em que lidos os nomes daqueles que se opunham ao desconto das contribuições, com gracinhas e chacotas. Acrescentou que a empresa teve diversos prejuízos (fls.384/390). O técnico de segurança do trabalho Sr. Antônio Carlos reiterou que no dia 20 de outubro os funcionários da autora foram impedidos de entrar para trabalhar e levados em três ônibus para outra empresa que fica na Zona Leste. Depois que os trabalhadores foram embora, somente quatro ou cinco funcionários do administrativo puderam entrar na empresa, mas não os da fábrica. A maioria dos funcionários queria entrar, mas não pôde por causa do bloqueio e uma minoria aderiu espontaneamente à manifestação. Acrescentou que provavelmente o sindicato estivesse em campanha salarial (fls.291/396).
A última testemunha da autora contou que é fornecedor, tomou conhecimento da paralisação por meio do jornal e que num dia do ano de 2005 não conseguiu entregar mercadorias na empresa autora porque o sindicato obstruiu a sua entrada (fls.367). A testemunha do requerido Sr. Ricardo Rodrigues disse que participa do sindicato e as paralisações decorrem dos erros cometidos pela autora em prejuízo de seus empregados, sempre de forma pacífica e com a concordância desses últimos. Não impedem a passagem dos trabalhadores, o carro de som fica ao lado.
Algumas vezes o sindicato busca os trabalhadores na empresa para participar de passeatas, como por exemplo, contra o Governo, mas sempre com a concordância da empresa, não havendo retaliação em caso de recusa. Frequentemente ocorrem greves nas empresas metalúrgicas no mês de outubro, em campanha salarial, por causa da data-base do dia 1º de novembro. No ano de 2005 houve acordo com o sindicato patronal graças a essas paralisações (fls.368/369). Encerrada a instrução, entendo que comprovada a arbitrariedade da paralisação das atividades da empresa requerida. Não é crível que uma empresa concorde em ceder seus funcionários durante horário de expediente, em prejuízo do trabalho, a fim de participar de manifestações de cunho político, servindo apenas aos interesses dos dirigentes do sindicato, salvo se por receio de represálias, como aconteceu. Conforme constou da contestação e na oitiva da testemunha do requerido em duas oportunidades anteriores, naquele mesmo ano, o requerido levou funcionários da autora para passeatas contra “corrupção” e “mensalão, juros altos.” As testemunhas da autora relatam que no dia 20 de outubro mais uma vez representantes do requerido pretendiam levar os trabalhadores, dessa vez para uma manifestação em empresa na Mooca, sem nenhuma relação com a requerente.
O depoimento dessas testemunhas mostra-se condizente com o histórico de utilização dos empregados da requerente para servir aos interesses políticos do sindicato, devendo ser acolhido. Portanto, a motivação da paralisação em nada se relacionava ao movimento grevista, e ainda que se entendesse em sentido contrário, o direito constitucional à greve não se sobrepõe ao direito ao trabalho, locomoção e livre iniciativa. Os representantes do requerido não podem impedir o acesso dos empregados que desejem trabalhar, dos fornecedores e de terceiros às dependências da empresa, assim como aconteceu, segundo as testemunhas da requerente. Neste ponto, ressalta-se que o depoimento da única testemunha do requerido ficou isolado no contexto probatório. Por outro lado, em contrapartida, não se pode impedir manifestações legítimas do requerido nas imediações da empresa. Desta forma, demonstrado o ato ilícito que acarretou a paralisação das atividades da requente e, em consequência, os prejuízos materiais narrados. Quanto ao montante do prejuízo material, a impugnação genérica da contestação não afasta o valor pleiteado e no momento da especificação de provas não foi requerida perícia alguma (fls.238).
Assim, acolhe-se o valor constante da petição inicial. Afasto, por outro lado, a indenização por danos morais. O dano moral configura-se no momento em que violado um dos direitos da personalidade, por exemplo, ofensas relacionadas à honra, ao nome, afeições legítimas (perda de um ente querido), segurança pessoal e integridade física, dentre outros. A autora não comprovou que abalada a sua honra objetiva em razão da paralisação ou que esse movimento tenha prejudicado sua imagem perante terceiros. Por outro lado, se um ou outro funcionário sofreu pressão psicológica, a requerente não tem legitimidade para pleitear em nome próprio direito alheio.
Diante do exposto, DEFIRO PARCIALMENTE a medida cautelar, confirmando a liminar concedida, e JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a ação principal para condenar o réu no pagamento de indenização por dano material no valor de R$ 82.684,87 (oitenta e dois mil, seiscentos e oitenta e quatro reais e oitenta e sete centavos), acrescido de correção monetária, desde outubro de 2005, e juros de mora de 1% ao mês desde a citação e improcedentes os demais pedidos formulados.
Considerando a sucumbência recíproca, cada parte arcará com os honorários do respectivo patrono e com metade das custas e despesas processuais.
P.R.I.
São Paulo, 26 de julho de 2010.
LÚCIA CANINÉO CAMPANHÃ
Juíza de Direito
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4/12/07 - Nota de repúdio - clique aqui.
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