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Projeto de Lei nº 7.077/02

Seria altamente recomendável que nossos congressistas adquirissem o hábito da leitura e começassem, vez por outra, a dar uma espiada na Constituição Federal. Pode não ser literatura das mais agradáveis mas como também não é tão extensa assim, não será grande sacrifício. Soletrando devagar e só durante os vôos decorrentes do êxodo semanal, brasiliense, no máximo em dois fins de semana estará lida.

11/11/2004

Projeto de Lei nº 7.077/02


Zanon de Paula Barros*

Seria altamente recomendável que nossos congressistas adquirissem o hábito da leitura e começassem, vez por outra, a dar uma espiada na Constituição Federal. Pode não ser literatura das mais agradáveis mas como também não é tão extensa assim, não será grande sacrifício. Soletrando devagar e só durante os vôos decorrentes do êxodo semanal, brasiliense, no máximo em dois fins de semana estará lida.

Digo isto por conta do Projeto de Lei nº 7.077, de 19/7/02 em tramitação na Câmara dos Deputados, já tendo sido aprovado no Senado. O referido Projeto de Lei institui a Certidão Negativa de Débitos Trabalhistas – CNDT, que será (se aprovada a excrescência) de apresentação obrigatória, entre outras coisas, “na contratação ou renovação de contrato com o Poder Público para fornecimento de bens ou serviços”.

Se o autor do projeto (e os senadores que o aprovaram) em suas horas vagas, dessem uma olhada no “livrinho” (dizia-se que era assim que o Presidente Dutra chamava a Constituição) aprovado em 1988, veriam que o que pretendem é juridicamente inviável.

O inciso XXI, do artigo 37, da Constituição Federal determina de forma clara:

XXI – ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratadas mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações.

Ora “somente” significa com a exclusão de qualquer outra coisa, ou seja, pelo inciso XXI do art. 37, o processo licitatório nada pode exigir além da prova de qualificação técnica e econômica dos proponentes e assim mesmo só as indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações.

A existência de débito de qualquer espécie, ainda que em execução, não significa, por si só, incapacidade econômica a qual se afere pela aplicação dos índices específicos nas demonstrações financeiras.

Há, porém, uma exceção mas feita pela própria Constituição, única norma com poder para excepcionar o citado inciso XXI, do art. 37: diz respeito às contribuições sociais. De fato, o § 3º, do art. 195, da Carta, impede que a pessoa jurídica em débito com o sistema de seguridade social contrate com o Poder Público ou dele receba benefícios fiscais ou creditícios.

Assim, qualquer lei que, para as contratações de fornecimento de bens ou serviços ao Poder Público, estabeleça exigências diferentes das determinadas em caráter exclusivo pelo artigo 37, inciso XXI e artigo 195, § 3º, ambos da Constituição Federal, não terá a menor validade.

Se não houver, na Câmara, mais lucidez do que no Senado, teremos mais uma lei inconstitucional, cuja finalidade única será entupir mais ainda o Poder Judiciário com sucessivos mandados de segurança contra editais de licitação. Se a intenção dos autores do Projeto de Lei era atazanar as empresas e dificultar mais ainda o Judiciário, por certo o conseguirão.
_______

* Advogado do escritório Leite, Tosto e Barros - Advogados Associados










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Acrescenta o Título VII-A ao Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943 (Consolidação das Leis do Trabalho – CLT), instituindo a Certidão Negativa de Débitos Trabalhistas – CNDT, e dá outras providências.

O Congresso Nacional decreta:

Art. 1º A Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, passa a vigorar acrescida do seguinte Título VII-A:

Título VII-A
da prova de inexistência de débito trabalhista

“Art. 642-A. É exigida a Certidão Negativa de Débitos Trabalhistas – CNDT, fornecida por órgão competente da Justiça do Trabalho, nos seguintes casos:

I – da empresa, individual ou coletiva:

a) na contratação ou renovação de contrato com o Poder Público para fornecimento de bens ou serviços;

b) no recebimento de benefícios, ou incentivo fiscal, ou creditício concedidos pelo Poder Público, diretamente, ou através de seus agentes financeiros;

c) na alienação, ou na oneração, a qualquer título, de bem imóvel ou direito a ele relativo;

d) no registro, ou no arquivamento, no órgão próprio, de ato relativo a baixa ou redução de capital de firma individual, redução de capital social, cisão total ou parcial, transformação, ou extinção de entidade ou sociedade comercial, ou civil e transferência de controle de cotas de sociedade de responsabilidade limitada;

II – do proprietário, pessoa física ou jurídica, de obra de construção civil, quando de sua averbação no registro de imóveis;

III – da pessoa física, nas hipóteses previstas nas alíneas a, b e c do inciso I deste artigo.

§ 1º Considera-se débito trabalhista, para efeito deste Título:

I - o inadimplemento de obrigações estabelecidas em sentença condenatória transitada em julgado proferida pelos Órgãos da Justiça do Trabalho, ou em acordos judiciais descumpridos, inclusive no concernente aos recolhimentos previdenciários, honorários, custas, emolumentos ou recolhimento determinado em lei;

II - o inadimplemento de obrigações decorrentes de execução de termo de ajuste de conduta celebrado perante o Ministério Público do Trabalho e de termo de acordo firmado perante Comissão de Conciliação Prévia.

§ 2º A prova de inexistência de débito deve ser exigida da empresa em relação a todos os seus estabelecimentos, agências, filiais ou obras de construção civil, independentemente do local onde se encontrem.

§ 3º É dispensada a transcrição, em instrumento público ou particular, do inteiro teor do documento comprobatório de inexistência de débito trabalhista, bastando a referência ao seu número de série e data da emissão, bem como a guarda do documento comprobatório à disposição dos órgãos competentes.

§ 4º O documento comprobatório de inexistência de débito trabalhista poderá ser apresentado por cópia autenticada, dispensada a indicação de sua finalidade.

§ 5º O prazo de validade da Certidão Negativa de Débitos Trabalhistas é de 90 (noventa) dias, contado da data de sua emissão.

§ 6º É a Justiça do Trabalho autorizada a emitir a Certidão Negativa de Débitos Trabalhistas através de meios eletrônicos, devendo, ainda, ser desenvolvido sistema de integração das informações constantes dos bancos de dados dos diversos Órgãos da Justiça do Trabalho.

Art. 642-B. A prática de ato com inobservância do disposto no art. 642-A, ou o seu registro, acarretará a responsabilidade solidária dos contratantes e do oficial que lavrar ou registrar o instrumento, sendo o ato nulo para todos os efeitos.” (NR)

Art. 2º Os arts. 27 e 29 da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, passam a vigorar com a seguinte redação:

“Art.27..............................................................................................................
.......................................................................................................................
IV – regularidade fiscal e trabalhista;
..........................................................................................................” (NR)

“Art. 29. A documentação relativa à regularidade fiscal e trabalhista, conforme o caso, consistirá em:
..............................................................................................................
V – prova de inexistência de débitos trabalhistas para com empregados e desempregados, mediante a apresentação de certidão negativa expedida por órgão competente da Justiça do Trabalho, nos termos do Título VII-A da Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943.” (NR)

Art. 3º Esta Lei entra em vigor 60 (sessenta) dias após a data de sua publicação.




Senado Federal, em 12 de julho de 2002





Senador Ramez Tebet

Presidente do Senado Federal
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