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Idade na Magistratura

Tramitam no Congresso Nacional duas Propostas de Emendas à Constituição nº. 457/05 (clique aqui) e 260/08 (clique aqui), esta em apenso a 61/99 (clique aqui), que merecem ser analisadas, quando se discute sobre a influência da idade no exercício da magistratura

14/7/2008


Idade na Magistratura

Antonio Pessoa Cardoso*

Tramitam no Congresso Nacional duas Propostas de Emendas à Constituição nº. 457/05 (clique aqui) e 260/08 (clique aqui), esta em apenso a 61/99 (clique aqui), que merecem ser analisadas, quando se discute sobre a influência da idade no exercício da magistratura. A primeira altera o inc. II, parágrafo 1º, art. 40 para aumentar o tempo limite da aposentadoria compulsória dos funcionários públicos, incluindo aí os magistrados, de 70 para 75 anos; a segunda fixa a idade mínima de trinta e cinco e o período mínimo de dez anos de efetivo exercício de advocacia como requisitos para ingresso na carreira, alterando assim o inc. I, art. 93. Esta Emenda é festejada, porque não há lei regulamentando idade mínima para acesso à carreira de magistrado.

A Emenda nº. 457/05 é medida salutar, apesar de contestada por uns, defensores da manutenção do dispositivo constitucional, vigente desde 1946, sob o argumento de que a continuação dos magistrados com mais de 70 anos na ativa causa maior tempo no exercício da jurisdição e prejudica a ascensão dos novos juízes, além de impedir a renovação de idéias e jurisprudências nos tribunais.

O preceito legal que descarta o septuagenário sadio do trabalho e classifica-o como absolutamente incapaz para a judicatura é entendido por eminentes juristas como autoritário, irracional, além de ferir a própria Constituição (clique aqui) que proíbe o preconceito de idade, inc. IV, art. 3º e garante a liberdade de trabalho; a garantia da vitaliciedade, inc. I, art. 95, e a suspensão da vitaliciedade, inc. II, art. 40 se chocam na Lei maior, porque se acaba com a garantia constitucional pela incidência da idade; assegura ainda que o aumento da idade média do cidadão, bem diferente de 1946, quando foi estabelecida a compulsória, permite a continuidade no trabalho, diante das boas condições físicas e intelectuais do idoso. Se verificarmos que a idade média do homem brasileiro nos anos 40 era de apenas 39 anos e atualmente passou para mais de 72 anos, vê-se a desatualização e a impropriedade do dispositivo que pode e deve ser alterado; afinal a lei reflete o momento social.

A Carta Imperial estatuía a "vitaliciedade perpétua dos juízes", art. 153; a Constituição de 1891 (clique aqui) foi a primeira a usar o termo "aposentadoria", prevendo que esta situação só ocorreria para os funcionários públicos em caso de invalidez no serviço da Nação, art. 75; a Constituição de 1934 (clique aqui)instituiu a aposentadoria compulsória aos 75 anos, art. 64, a); a Carta ditatorial de 1937 diminuiu a compulsória para 68 anos, arts. 91, a) e 156, d) e a partir de 1946 ficou estabelecida a idade de 70 anos para a "invalidez intelectual", quando a longevidade do homem era comprometida pela qualidade de vida, situação que presentemente não acontece.

Não se deve encarar o assunto sob o prisma do corporativismo, alicerçadas somente no crescimento profissional do magistrado, porque a matéria é eminentemente de interesse público. Merecem estudos sobre benefícios e custos para o erário, originados da aposentadoria dos funcionários públicos, particularmente dos juízes, analisados neste trabalho, a exemplo do procedimento adotado pelas empresas privadas que buscam equilíbrio entre gastos com os inativos e produtividade dos ativos, entre recursos auferidos com contribuições e benefícios concedidos. Aliás, a Constituição estatui o regime de previdência social de caráter contributivo, mediante contribuição dos servidores ativos e inativos e dos pensionistas, "observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial..."

A pensão concedida ao aposentado presta-se para garantir aos que não mais podem trabalhar e nunca para assegurar um segundo salário para pessoas que ainda tem condições de exercer a atividade. Como se vê, o Estado garante a aposentadoria de seus funcionários, em parte, porquanto os servidores da ativa e até mesmo os inativos são obrigados a contribuírem para preservar o equilíbrio financeiro do sistema previdenciário.

Privilégios

Nesta área, o privilégio dos funcionários públicos é incontestável, pois o diferencial do benefício entre um e outro segmento é bastante elevado. O valor das aposentadorias dos funcionários do Judiciário situa-se em mais de 20 vezes os beneficiados do INSS; do Legislativo a diferença torna-se mais elevada. Nem se pode alegar o fato de ser superior a contribuição, pois mesmo se considerarmos este fato, constatamos que, enquanto a contribuição média é mais alta, em torno de 3,5 vezes para os contribuintes do INSS, o benefício daqueles supera em oito vezes. Por isto, a aposentadoria dos servidores públicos, inclusive dos juízes, coincide com a busca de recursos públicos para cobrir os gastos elevados que não guardam similitude com as contribuições.

O aumento da idade para a permanência de magistrados e funcionários públicos no serviço ameniza a dramática situação econômica e previdenciária do país, além de aproveitar a experiência e a maturidade de quem já acumulou conhecimentos por anos na atividade; de outra forma, há profundo desequilíbrio nas contas, porque o Estado é obrigado a pagar proventos ao aposentado que deixa o serviço com salário integral, e ao novo magistrado que ocupa o lugar do inativo. Imaginem-se tais despesas dobradas durante cinco ou mais anos para todos os seus servidores.

O IBGE informa que o percentual da população com mais de 60 anos de idade subiu de 8,66% em 1966 para 10,2% em 2006; destes, o estudo mostra crescimento maior entre os que contam mais de 75 anos, porque passou de 23,5% para 26,1%; em 1975, 70% da população tinham menos de 20 anos; nos dias atuais situa-se abaixo de 45%; esta faixa etária estará reduzida a 37% no ano de 2015; os maiores de 50 anos constituíam apenas 5% da população estando hoje no percentual de 15%.

A fixação de tempo mínimo no efetivo exercício do serviço público, dez anos, e o curso de cinco anos no cargo efetivo em que se dará a aposentadoria, foi providência saneadora, diante dos abusos que se cometiam com a assunção de cargos públicos somente para substancial aumento da aposentadoria. Relembre-se que o juiz ostenta a condição de vitaliciedade após dois anos de atividade, aposenta-se com integralidade de salários, conta com dois meses de férias, além de 15 dias de recesso no final do ano e percebe ótimo salário, se comparado com a maioria da população; é ainda forçado a "vestir o pijama", receber salário todo mês, mesmo com condições para continuar no trabalho.

Mas, quem encara o assunto sob o aspecto de progressão na carreira, está admitindo a compulsória aos 75 anos somente para os integrantes dos tribunais superiores, tais como, Supremo Tribunal Federal, Superior Tribunal de Justiça, Tribunal Superior do Trabalho, Superior Tribunal Militar, vez que estes tribunais não são da carreira dos magistrados.

Cremos que a solução não se situa no aumento ou na manutenção da idade para a aposentadoria compulsória. Esta pode ser extinta, mas, se mantida, deve ser aumentada, principalmente, porque aliviam os gastos do Poder Público com os inativos e aproveita mão de obra especializada e preparada, descartada sem motivação maior, salvo o simples fato de ter tal ou qual idade.

A solução para a renovação e para a permanência, em tempo razoável do juiz no exercício da jurisdição, não se situa no descarte do magistrado que completa 70 anos, mas pode ser buscada na idade para inicio da atividade jurisdicional ou na fixação de tempo de permanência do profissional no cargo. Não se pode admitir a situação atual de exigência para ingresso na carreira de juiz situada somente na demonstração de ser bacharel em direito com três anos de atividade como advogado, não importando a idade; neste caso, o juiz nomeado, por exemplo, com 26 anos, como tem sido comum, poderá ficar no cargo por quarenta e quatro anos, atrapalhando, no conceito dos que defendem a idéia, a alegada oxigenação ou renovação da jurisprudência. Fixada a idade mínima, de conformidade com a Emenda nº. 260/08, proporcionar-se-á o ingresso na carreira de profissionais mais experimentados, tanto na atividade forense, quanto na própria vida pessoal, além de evitar significativo desarranjo aos cofres públicos. Afinal, as faculdades não preparam os jovens para exercitar a profissão de advogado, de magistrado, de promotor, de defensor público, de delegado, etc., mesmo porque não há sintonia do currículo escolar com as necessidades exigidas por essas carreiras. A decadência do ensino do direito apontou providências tomadas pela OAB e consistente em exame prévio para capacitação para o exercício da advocacia.

A arte de julgar situa-se na experiência de vida pessoal e profissional e não na teoria e, ainda assim, o jovem que nem experimentou administrar sua vida pessoal faz concurso e passa a gerir o destino da vida de toda uma comunidade. A impassibilidade do matemático não quadra com o homem da lei, que deve alicerçar-se em valores humanísticos. A comunidade não se cansa de reclamar em seu meio de um bom juiz com fortes princípios éticos e sem sustentação somente nos conhecimentos técnicos.

O professor Miguel Reale e tantos outros professores, juízes, etc., foi impedido de trabalhar no serviço público após completar a idade de 70 anos; no entanto, viveu e trabalhou até os 95 anos e, em função da compulsória, recebeu dos cofres públicos durante 25 anos.

Ao invés de se descartar a força de trabalho de profissionais experimentados, possuidores de potenciais informações e conhecimentos, adquiridos com recursos financeiros do próprio Estado, prorroguem-se o ingresso do jovem na carreira para quando conquistar prática na vida pessoal e profissional, cultura humanística, sem a limitação dos conhecimentos teóricos da atualidade; estabeleça-se tempo de permanência na função de desembargador, de ministro ou diminua-se progressivamente sua atividade a partir dos 65 anos, como se procede na Itália.

Todas essas categorias de profissionais do serviço público, médico, professor, juiz, etc., somente por terem completado 70 anos são considerados inválidos e obrigados a deixarem o serviço público; continuam com salários integrais, sem trabalhar; mudam de atividade, após a compulsória, e dedicam ao segmento privado, na condição de médicos de hospitais particulares, professores da rede de ensino privada, advogados, consultores; recebem do Estado salários como se estivessem trabalhando e ganham na nova atividade, porque se mostram competentes.

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Desembargador do TJ/BA





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