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Arbitragem e sociedades de economia mista

Mais de uma década se passou desde a entrada em vigor da Lei nº. 9.307/96 e a aplicação desta Lei de Arbitragem tornou-se uma realidade nas relações comerciais contemporâneas.

4/9/2007


Arbitragem e sociedades de economia mista

Carlos Rosemberg*

Mais de uma década se passou desde a entrada em vigor da Lei nº. 9.307/96 (clique aqui) e a aplicação desta Lei de Arbitragem tornou-se uma realidade nas relações comerciais contemporâneas. Adiante, comentaremos a posição do Judiciário ao analisar a convenção de arbitragem em contratos celebrados entre sociedades de economia mista e empresas privadas.

A Lei nº. 9.307/96 faculta às pessoas capazes a solução de conflitos por meio de arbitragem, envolvendo os direitos patrimoniais disponíveis. Por conseguinte, a convenção de arbitragem terá validade apenas quando o titular do direito goza de absoluta disponibilidade, podendo "fazer de tudo em relação a aquele, principalmente alienar, e mesmo renunciar"1, ou ainda, na lição de Cláudio Vianna de Lima, "são patrimoniais os direitos relativos a bens que podem ser apreciados economicamente, quantificados <_st13a_personname productid="em moeda. Disponíveis" w:st="on">em moeda. Disponíveis são os direitos que se referem a bens apropriáveis, alienáveis, que se encontram no comércio jurídico"2. Nesse passo, o Código Civil Brasileiro (clique aqui) reforça a vedação legal relativamente à arbitrabilidade de direitos patrimoniais indisponíveis3.

A controvérsia envolvendo os contratos celebrados com a administração pública repousa justamente na parte final do artigo 1º da Lei de Arbitragem, no termo 'direitos patrimoniais disponíveis'. Sabe-se que a sociedade de economia mista ostenta estrutura e funcionamento da empresa particular, porque isto constitui, precisamente, sua própria razão de ser, sendo regidas pelas normas das sociedades mercantis, em especial a Lei das Sociedades Anônimas (Lei nº. 6.404/76 - clique aqui), e o seu objeto pode ser um serviço público ou uma atividade econômica empresarial4.

Pois bem, se há restrição legal para que direito patrimonial indisponível seja objeto de convenção de arbitragem, qual a legitimidade de uma empresa estatal para transigir com o interesse público ?

Em Parecer apresentado nos autos do recurso de agravo de instrumento nº 142.683-1, do Tribunal de Justiça do Paraná5, versando sobre a legalidade da convenção de arbitragem em contrato celebrado entre particular e uma sociedade de economia mista, o Ministério Público opinou pelo desprovimento do recurso, sob o argumento, dentre outros, de que o princípio da autonomia da vontade, requisito para a validade da cláusula compromissória, não se aplicaria aos contratos firmados por administradores de empresa estatal prestadora de serviço público.

Em 25/10/05, a 2ª Turma do STJ, ao apreciar o Resp 612.439/RS6, confrontou o equivocado posicionamento acima sustentado pelo Ministério Público, sob a alegação de que a sociedade de economia mista também pode adotar a arbitragem, sem que para isso dependa de autorização legislativa, sendo o instituto da arbitragem um meio eficaz e necessário para a inserção dos agentes públicos e privados no mercado globalizado. A partir daí, surgiram outras decisões, a exemplo do AGRG no MS 11308/DF7 e o Resp 606345/RS8, trilhando a mesma linha de raciocínio, cujo fundamento reside em permitir às sociedades de economia mista o acesso a um mecanismo de composição de controvérsias dinâmico, eficaz e dotado de alta especialidade técnica na apreciação de cada questão posta a julgamento.

No que pertine ao tema das sociedades de economia mista, faz-se menção aqui ao art. 173, § 1º, inciso II, da Constituição Federal (clique aqui), reconhecendo que a sociedade de economia mista se encontra em situação paritária com a empresa privada nas suas relações comerciais, inexistindo qualquer restrição quanto à convenção de arbitragem para dirimir conflitos de interesses.

No próprio acórdão do Resp 606.345/RS aduziu-se que, "quando os contratos celebrados pela empresa estatal versem sobre atividade econômica em sentido estrito (...), os direitos e as obrigações deles decorrentes serão transacionáveis, disponíveis e, portanto, sujeitos à arbitragem".

Em artigo "Da Validade de Convenção de Arbitragem Pactuada por Sociedade de Economia Mista", de autoria dos professores Arnold Wald, Atlhos Gusmão Carneiro, Miguel Tostes de Alencar e Ruy Janoni Doutrado, publicado na Revista de Direito Bancário do Mercado de Capitais e da Arbitragem, nº 18, ano 5, outubro-dezembro de 2002, página 418, mencionou-se que, "(...) Ao optar pela arbitragem o contratante público não está transigindo com o interesse público, nem abrindo mão de instrumentos de defesa de interesses públicos. Está, sim, escolhendo uma forma mais expedita, ou um meio mais hábil, para a defesa do interesse público. Assim como o juiz, no procedimento judicial deve ser imparcial, também o árbitro deve decidir com imparcialidade. O interesse público não se confunde com o mero interesse da Administração ou da Fazenda Pública; o interesse público está na correta aplicação da lei e se confunde com a realização correta da Justiça."

A verdade é que a própria CF reconhece que a sociedade de economia mista que explore atividade econômica, de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços sujeita-se ao regime jurídico da empresa privada, inclusive quanto aos direitos e obrigações civis, comerciais, trabalhistas e tributários. Assim, não há que se negar a aplicabilidade da arbitragem em litígios onde estiverem presentes direitos patrimoniais do Estado, mas sim incentivá-la, uma vez que não há qualquer impedimento legal capaz de inviabilizar o procedimento arbitral, sem falar nas vantagens inegáveis advindas da sua utilização nas relações comerciais envolvendo sociedades de economia mista.

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1 João Bosco Lee e Clávio de Melo Valença Filho. A arbitragem no Brasil. 1ª ed., Programa CACB-BID de fortalecimento da arbitragem e da mediação comercial no Brasil. Brasília: 2001.

2 Cláudio Vianna de Lima. A Lei de Arbitragem e o artigo 23, XV, da Lei de Concessões. Revista de Direito Administrativo-209, julho/setembro 1997, pág. 92.

3 Art. 852 do Código Civil.

4 Hely Lopes Meirelles. Direito Administrativo Brasileiro, 30ª ed., Malheiros, 2005, págs. 364/365.

5 AgInst. nº 142.683-1. Terceira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Paraná. UEG Araucária Ltda. x COPEL – Companhia Paranaense de Energia. Publicado na Revista de Arbitragem e Mediação, nº 4, ano 2, janeiro-março/2005. RT.

6 REsp nº 612.439 – RS (2003/0212460-3). Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça. AES Uruguaiana Empreendimentos Ltda. x CEEE – Companhia Estadual de Energia Elétrica, DJ 14.9.2006.

7 AgRE no MS nº 11.308 – DF (2005/0212763-0). Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça. União Federal x TMC-Terminal Multimodal de Coroa Grande SPE S/A, DJ 14.8.2006.

8 REsp nº 606.345 – RS (2003/0205290-5). Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça. AES Uruguaiana Empreendimentos Ltda. x CEEE – Companhia Estadual de Energia Elétrica, DJ 8.6.2007.

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*Advogado do escritório Trigueiro Fontes Advogados










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