Pergunta interessante recebida, dia 12.3.24, pelo Prof. José Carlos Baroni merece o registro da solução encontrada. O subscritor teve o prazer de participar dos debates da questão consistente em saber se o Poder Público pode ser locador de imóvel de sua propriedade.
Apesar de se tratar de uma hipótese restrita a resposta é afirmativa. A hipótese de locação tendo o Poder Público como locatário é bem mais comum.
As restrições decorrem de três fatores: concessão de uso e doação do imóvel com encargo costumam salvaguardar melhor o interesse público. Além disso, o imóvel não pode ser afetado como bem de uso especial nem bem de uso comum devendo estar enquadrado como bem dominial.
Superada a questão da possibilidade jurídica do contrato passemos a enfrentar o tema referente ao procedimento licitatório adequado.
As modalidades licitatórias previstas na lei federal 14.133/21 (art. 28) são: pregão, concorrência, concurso, leilão e diálogo competitivo.
O concurso é a modalidade adequada para premiação de projeto artístico/técnico não tendo sentido a sua utilização.
Diálogo competitivo é a modalidade para hipóteses de desconhecimento pelo poder público da área a ser licitada e uso de propostas que partam dos licitantes. Não há complexidade temática e/ou técnica numa locação de imóvel.
A concorrência, na nova lei, está restrita a bens e serviços especiais e concessão de serviço público ou, ainda Parceria Público-Privada. Existem padrões no mercado sobre parâmetros para a locação que excluem a concorrência e aproxima-nos da hipótese do pregão.
Além das modalidades licitatórias mencionadas também excluiríamos o credenciamento já que o art. 79 da mencionada lei prevê o credenciamento para contratações paralelas (será uma única contratação), seleção do prestador por terceiros (não é o caso, pois a administração escolherá um único licitante) e, ainda no art. 79, para mercados fluídos com oscilação de valores e cotações variáveis. Nenhuma das três hipóteses se encaixa num contrato de locação.
Passemos, então, à análise da modalidade licitatória leilão.
O Leilão tem previsão no art. 6º, XL como modalidade para alienação de bens imóveis e bens móveis inservíveis.
O primeiro óbice seria o termo “alienação” referente a imóveis que seria uma referência à venda do imóvel.
Não pensamos assim.
O termo “alienação” deve ser interpretada à luz dos artigos 1.196 e seguintes do CPC que tratam da diferenciação dos poderes inerentes à propriedade. A locação pressupõe a manutenção da propriedade e da posse indireta com o locador e a transferência da posse direta ao locatário.
Logo, há alienação de parte dos atributos da propriedade num contrato de locação, aplicando-se, por conseguinte, a modalidade leilão como a mais adequada para a hipótese.
Pode haver alguma diferenciação neste contrato em razão das prerrogativas da administração pública e das cláusulas exorbitantes. A necessidade repentina do uso em razão de uma emergência, por exemplo, autoriza a rescisão e/ou alteração unilateral do contrato.
As garantias a serem exigidas também poderão, eventualmente, ser superiores àquelas exigidas no mercado, dependendo do caso concreto.
Desta forma, a simplicidade corriqueira da habilitação num leilão (identificação e pagamento costuma ser o suficiente), no caso da locação tendo a administração pública como locadora terá fase de habilitação e contratos semelhantes aos contratos de locação do mercado com a somatória das características de um contrato administrativo .
Em síntese: apesar de ser restrita às hipóteses em que a concessão de uso e a doação com encargo não salvaguardem o interesse público e, ainda, restrita à hipótese de bem dominial pode haver locação de imóvel tendo o Poder Público como locador. A modalidade mais adequada é o pregão com fase de habilitação diferenciada em relação à costumeira simplicidade do leilão, presença das características de mercado do contrato de locação além da presença das cláusulas exorbitantes.