Quem acompanha a pauta política sabe que a Reforma Administrativa segue em discussão. E isso importa a todas as pessoas que trabalham para o Estado.
A mudança do “tamanho”, do papel e da composição do Estado está na ordem do dia do Congresso Nacional, do Governo Federal e de sindicatos, federações e confederações de servidores.
O grande desafio posto sobre a mesa é a confluência das questões e necessidades debatidas nessas três esferas em uma proposta que transforme positivamente o serviço público brasileiro e atenda toda a sociedade.
Se no Poder Legislativo a briga se dá em torno da PEC 32/19, elaborada pelo Governo Bolsonaro e que diminui o tamanho do Estado, no Poder Executivo a tônica é a conciliação formada por uma Câmara Técnica composta por 17 membros do chamado Conselhão, 10 convidados que representam diferentes setores e por técnicos do governo federal e membros de ministérios. Já nos grupos de representantes dos trabalhadores, o tema é causa de apreensão pela possibilidade de retrocessos e retirada de direitos conquistados.
Estado mínimo
A novidade na área é a possibilidade de uma Reforma Administrativa baseada na ampliação e melhoria do serviço público ofertado à população, e uma visão que coloca os servidores como agentes públicos de transformação do Estado e ampliadores da quantidade e qualidade dos serviços oferecidos. Uma proposta que agrada o alto escalão do atual governo, representado pela Ministra da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos do Brasil, Esther Dweck.
Esta proposta, busca ampliar a diversidade dos servidores públicos, reduzir a quantidade de tabelas remuneratórias e carreiras, além do fortalecimento da premissa de estabilidade para os servidores. Ao contrário da Reforma Administrativa proposta pela equipe econômica do ex-presidente Bolsonaro, que era baseada na premissa negacionista de inchaço do Estado.
Conforme estudo realizado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), a trajetória da despesa com pessoal de 2002 a 2022 foi praticamente estável, com acréscimo de 1% em relação ao PIB. Ou seja, mesmo com a internalização de serviços públicos de saúde e educação, houve uma alta pequena de gastos públicos.
Contudo, apesar de não ter sido votada, a PEC nº 32 influenciou o atual governo na drástica redução de despesas com pessoal. Não reajustou salários, com exceção dos militares e forças policiais, não realizou concurso público e congelou os salários durante a pandemia, impedindo que os servidores tivessem os reajustes salariais decorrentes de progressões e promoções.
A consequência dessa política foi sentida em todo país, em menor ou maior escala. Por exemplo, houve paralisação de pesquisas, aumento do garimpo e desmatamento por falta de fiscalização nas florestas. Custou vidas, como vimos no caso dos Yanomamis.
O custo de um Estado que atenda ao País
Para analisar o impacto de uma Reforma Administrativa por uma perspectiva fiscal é preciso compreender qual será a reforma. Uma resposta que ainda não temos. Portanto, talvez o momento atual seja propício a reflexão em relação a qual reforma a administração pública precisa passar para entregar à sociedade um serviço público mais eficiente e que colabore com o desenvolvimento do País.
Que seja capaz de elaborar políticas públicas eficientes, fiscalizar, fazer com que o orçamento chegue na ponta, atender a sociedade em suas diversas demandas como, saúde, educação, segurança, cultura, esportes, previdência, entre outros, tem um custo.
Atualmente, do total das despesas públicas da União, o gasto com pessoal e encargos sociais é de 6,20% do PIB. Contudo, a mudança no serviço público não deve ser encarada apenas pelo viés fiscal.
Ampliar e melhorar a qualidade dos serviços públicos depende também de melhor gestão e melhor utilização de tecnologias. Mas ainda assim depende muito de mão de obra qualificada para a prestação desses serviços, o que passa pela valorização desses profissionais.
O papel do servidor em um serviço público renovado
A diversidade no serviço público deve estar no centro do debate, não apenas no ingresso, mas também e, principalmente, nos cargos de alto escalão. A participação e representatividade de grupos sociais marginalizados no serviço público poderá dar maior efetividade às políticas públicas, aproximando a burocracia da cidadania.
Há bons indicativos nesse sentido que independem de uma reforma administrativa discutida no Congresso, tais como a lei de cotas para cargos comissionados e o concurso público unificado com ampliação das cotas raciais. No âmbito do Poder Judiciário, recentemente foi aprovada pelo Conselho Nacional de Justiça a política de alternância de gênero no preenchimento de vagas para a segunda instância.
Essas medidas podem romper com a homogeneidade que permeia os melhores cargos do setor público.
É muito difícil compor tantos interesses. Mas há algumas pautas que, sem alterar o orçamento, poderiam ser boas para o Estado e para os servidores públicos: 1) Aprovação de legislação nacional que garantisse o direito de negociação entre servidores e administração pública – há um grupo de trabalho com a missão de elaborar uma proposta para regulamentação da Convenção nº 151 da OIT que versa sobre negociação coletiva, direito de greve e liberdade sindical. 2) Normatização clara com as diretrizes para os planos de carreira, a fim de reduzir as iniquidades existentes. Hoje existem mais de 300 tabelas salariais, só no Executivo Federal. 3) Facilitar a mobilidade dos servidores públicos, de acordo com sua aptidão e qualificação profissional.
Por último, é necessário ressaltar dois aspectos fundamentais para que o serviço público brasileiro mantenha seu caráter institucional e protetor dos valores democrático: a laicidade e a proteção contra o conflito de interesse público com o privado. É preciso também fortalecê-los e garantir a democracia.