Em 9 de junho de 2020, durante a 11ª Reunião Deliberativa, a Diretoria Colegiada da Agência Nacional de Aviação Civil – ANAC aprovou, por unanimidade, a alteração da Resolução 472, de 6 de junho de 2018 – que regulamenta as atividades de fiscalização –, a fim de disciplinar o instituto da infração administrativa de natureza continuada no âmbito da agência.
Nos termos do novo Art. 37-A, que entrará em vigor em 1º de julho de 2020, poderá ser caracterizada como infração continuada a prática, pelo mesmo regulado, de mais de uma ação ou omissão que configurar infração administrativa de natureza idêntica, apuradas em uma mesma oportunidade fiscalizatória.
O §2º do Art. 32 da Resolução 472/18 prevê que as decisões contendo sanções devem discriminar a prática de cada uma das infrações cometidas, exceto se caracterizada a infração continuada. O dispositivo, no entanto, também estabelece a necessidade de regulamentação do instituto da infração continuada.
Em seu voto, o Diretor-Presidente Substituto, Juliano Noman, relator do processo, destacou ser necessária a construção de metodologia própria para o cálculo da infração continuada no âmbito da ANAC, diferentemente do que ocorre, por exemplo, no Direito Penal, pois a penalidade administrativa imposta por descumprimento aos regulamentos de aviação civil “tem por finalidade resguardar o interesse público na segurança operacional e, no limite, na preservação de vidas”.
Na prática, o que muda a partir da entrada em vigor da alteração normativa aprovada é que, nos casos em que ficar caraterizada a infração de natureza continuada, o valor da multa será calculado a partir de uma nova fórmula, que poderá gerar uma redução de 50%, ou até superior, do valor que seria aplicado atualmente. O valor final da mula dependerá do caso específico, visto que serão consideradas para o cálculo circunstâncias atenuantes ou agravantes.
Em números concretos, em casos de infrac¸ões administrativas de natureza ide^ntica, uma multa que hoje seria de um milhão de reais, passaria a ser de quinhentos mil reais ou até menos, a partir da alteração da Resolução 472/18 e da regulamentação da infração continuada pela ANAC.
Outro ponto que merece destaque é o fato de que a alteração vale não só para novos processos, mas para todos os processos em trâmite na ANAC, haja vista a resolução aprovada e publicada estabelecer a aplicabilidade imediata a todos os processos administrativos sancionadores em que não tenha ocorrido o trânsito em julgado administrativo.
Ressalta-se, por fim, que a ANAC também estabeleceu no parágrafo único do novo Art. 37-A que será afastada a caracterização da infração continuada quando evidenciada violação da lealdade e da boa-fé. O objetivo é evitar a repetição das infrações e diferenciar a conduta do regulado que opta por infringir a regulação de forma deliberada da conduta daquele que age de boa-fé.
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*Ricardo Fenelon Jr. é sócio do Fenelon Advogados. Advogado especialista em aviação, infraestrutura e regulação. Ex-Diretor da Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC), professor de Direito Aeronáutico no Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP) e presidente do Instituto Brasileiro de Direito Aeronáutico (IBAER). Mestre (LL.M.) em Direito Empresarial Internacional e Econômico pela Georgetown University.
*Lívia Herdy é sócia do Fenelon Advogados. Advogada especialista em Direto Aeronáutico, Direito Civil, Direito Processual Civil e Direito Regulatório. Ex-Senior Legal Advisor da South African Airways no Brasil, atua há mais de 15 anos em processos envolvendo contencioso estratégico e de volume. Membro-fundadora do Instituto Brasileiro de Direito Aeronáutico (IBAER). Especialista em Direito Civil e Direito Administrativo pela Escola Paulista de Direito.