Há muito, encontra-se em pauta no cenário político e econômico a discussão acerca da necessidade de repensar o sistema tributário brasileiro a fim de conferir-lhe maior simplicidade e transparência, de modo a propiciar maior equidade e um melhor ambiente de negócios no país.
Diante desse cenário, algumas propostas de reforma tributária foram apresentadas, estas encampadas por diferentes autores, sendo que duas delas já se encontram em tramitação no Congresso Nacional, quais sejam, a PEC 45/19, de autoria do Deputado Baleia Rossi (MDB-SP), e a PEC 110/19, assinada pelo presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), e outros 66 senadores.
A primeira (PEC 45/19) fora lastreada em proposições elaboradas pelo Centro de Cidadania Fiscal (CCiF), liderado pelo economista Bernard Appy, e tem por objetivo, sobretudo, a simplificação do sistema, com a consequente redução do contencioso tributário e do custo burocrático de recolhimento dos tributos. Dentre as principais mudanças sugeridas, destaca-se a criação do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), que substituiria e unificaria três tributos federais (PIS, Cofins e IPI), o estadual ICMS e o municipal ISS, todos estes incidentes sobre o consumo.
Em breve resumo, o novo tributo (IBS) incidiria sobre base ampla de bens e serviços, sem fazer distinção entre as operações onerosas efetuadas, tal como se dá nos padrões internacionais do Imposto sobre Valor Agregado (IVA), já adotado em mais de 160 países. Isto é, a incidência do IBS independeria da denominação dada à operação – se venda, locação, licenciamento, cessão ou prestação de serviços, por exemplo.
Ademais, a arrecadação do IBS, de acordo com o projeto, seria dividida entre União, Estados e Municípios, de maneira tal a não reduzir a autonomia dos referidos entes, que manteriam o poder de gerir suas receitas através da alteração de alíquota do IBS. Melhor explicando: a alíquota do tributo – que será uniforme - será alcançada pela soma dos percentuais definidos nas esferas federal, estadual e municipal. Tal como explicado pelo autor da PEC, “para o contribuinte, será um único imposto, mas para os entes é como se cada um tivesse o seu próprio imposto, pois terão autonomia na fixação da alíquota”.1
Outra modificação trazida pela proposta é a de que, a princípio, não seriam permitidos benefícios fiscais e regimes especiais, uma vez que o IBS seria um imposto para fins exclusivos de arrecadação, não podendo ser utilizado para fins extrafiscais.
Em vista disso e das outras tantas alterações sugeridas, propôs-se um período gradativo de 10 anos de migração do
Registre-se que, além do IBS, a PEC 45/19 também propõe a criação de outro tributo, denominado Imposto Seletivo (IS), este de competência apenas federal. Complementando o sistema do IBS, o IS incidiria sobre bens e serviços específicos geradores de externalidades negativas, cujo consumo se deseja desestimular, como cigarros e bebidas alcóolicas.
O texto da referida proposta, vale dizer, tramitou rapidamente na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), recebendo parecer favorável à sua aprovação, sendo que, atualmente, já se encontra em análise na Comissão Especial, instaurada em 10/7/19 na Câmara dos Deputados.
Noutro giro, também se encontra em trâmite no Poder Legislativo, em apreciação paralela, a PEC 110/19, que foi elaborada com base em texto da PEC 293/04, que já havia sido aprovada em comissão especial da Câmara em dezembro de 2018, sob a relatoria do ex-deputado Luiz Carlos Hauly, mas encontrava-se parada desde então. Tal projeto, que também visa a redução do número de tributos, em especial os incidentes sobre o consumo, sugere a extinção do IPI, IOF, PIS, COFINS, ISS, ICMS, Salário-Educação e CIDE-Combustíveis, os quais seriam substituídos pelo Impostos de Bens e Serviços (IBS) e pelo Imposto Seletivo (IS).
O IBS, nesse cenário, seria de competência estadual, mas com uma legislação única federal. Já o IS incidiria sobre produtos específicos, como petróleo e derivados, combustíveis e lubrificantes, cigarros, energia elétrica e serviços de telecomunicações. Conforme consta na justificativa do texto inicial da PEC 110/19, “lei complementar definirá quais os produtos e serviços estarão incluídos no Imposto Seletivo. Sobre os demais produtos, incidirá o IBS estadual”.
Além disso, o projeto em questão prevê também a extinção da CSLL, a qual seria incorporada pelo IR, que, por sua vez, teria suas alíquotas ampliadas. Outra mudança sugerida refere-se também à alteração da competência do ITCMD, que de estadual, passaria a ser federal, mas com receita destinada aos municípios.
O prazo para a entrada em vigor da emenda, caso aprovada, tinha sido previsto no texto original do Dep. Luiz Carlos Hauly como sendo de um ano após sua aprovação no Congresso Nacional, enquanto que para a distribuição das receitas entre os entes federados haveria um prazo de transição de 15 anos. Tal ponto, como se era de imaginar, foi alvo de críticas, já que o prazo de apenas um ano para a implementação de todo um novo sistema tributário certamente não seria suficiente para que os contribuintes se adaptassem economicamente à nova realidade, e adequassem suas rotinas e procedimentos. Assim, a PEC 110/19 trouxe novo prazo de transição para o novo sistema, este com duração de 15 anos, dividido em três etapas. De acordo com a proposta, haverá uma fase de convivência do sistema antigo com o novo, em que o primeiro vai desaparecendo para dar lugar ao segundo.
O texto da PEC 110/19 encontra-se ainda em análise pela Comissão de Constituição e Justiça, e, quando apreciado, será encaminhado à sua respectiva Comissão Especial para apresentação de eventuais emendas e posterior votação.
Cumpre ressaltar que, como dito, além da PEC 45/19 e PEC 110/19, outras propostas estão na briga pela reforma tributária. Todas elas, vale a observação, buscam a simplificação do sistema tributário nacional sem prejuízo da carga tributária, sendo que estas, em sua maioria, centram maior atenção na tributação sobre o consumo.
Frise-se, no entanto, que embora tais propostas pretendam, na teoria, trazer melhoria ao sistema tributário, estas tem sido alvo de críticas por empresas e profissionais de diversos ramos, críticas estas que vão desde o fato de que as alterações sugeridas focam, em sua maioria, tão somente nos impostos sobre o consumo, até a alegação de suposta violação ao pacto federativo.
No que tange à PEC 45/19, por exemplo, existe a preocupação de que o texto proposto pelo projeto venha a exigir a fixação de uma alíquota de 30% ou até maior para o novo Imposto sobre Operações com Bens e Serviços (IBS). Isto porque, tendo em vista que a proposta visa evitar aumento da carga tributária ao longo de um período de transição de 10 anos, e considerando que o IBS seria calibrado para repor receitas dos tributos que forem extintos, ao fim do processo este atingiria uma alíquota muito expressiva. E nesse sentido, comenta-se também o temor quanto à adoção de uma alíquota única, vez que o percentual provavelmente restará demasiadamente alto para algumas empresas.
O fato é que, dada a alta complexidade da matéria e o teor constitucional da questão discutida, inúmeros são os debates a respeito do cabimento das alterações sugeridas pelas propostas apresentadas. Discute-se, ainda, a real eficácia das medidas propostas, sobretudo no que tange à verdadeira capacidade de estas contribuírem, de fato, para o desenvolvimento econômico, para o aumento da produtividade e do PIB potencial do Brasil.
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1 Disponível aqui.
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