III Congresso Internacional de Arbitragem Comercial
Elisabeth V. De Gennari*
"Concilia-te com teu adversário, enquanto estás a caminho com ele, antes que ele te entregue ao juiz e este te envie para prisão". ( MAT. 5 – 25).
É cedo para avaliar se atingido foi o ambicioso desiderato.
Indiscutível que se o “mar vermelho” se abrira, para que a Arbitragem passasse, com a ”operação arbiter”1 a ratificação da Convenção de Nova York2 pelo Brasil, fechou-o sobre seus opositores renitentes. Apenas não é possível certificar se os perseguidores da Lei 9.307/96, que tantas pragas deixaram cair sobre o país, foram eliminados, qual o exército do faraó egípcio no meio do mar.
Deixou atrás de si, afogados em seu próprio ranço, juristas que, como Pontes de Miranda, pontificavam ser o juízo arbitral “... primitivo, regressivo mesmo, a que pretendem volver, por atração psíquica a momentos pré-estatais, os anarquistas de esquerda e os de alto capitalismo”3.
De nada valeria o esforço para enquadramento do Juízo Arbitral nacional na ordem internacional, sem essa ratificação. Tanto isso é verdade que o Congresso dedicou quase um dia inteiro à análise da Convenção de Nova York e congregou palestrantes/participantes da Europa, Américas do Norte e do Sul, entusiasmados com a interação do Brasil à comunidade de mais de 130 outros países.
Interessante indagar por que o Brasil, assim como a maior parte dos países latino-americanos resistiu4 , por décadas, à arbitragem internacional apesar das nefastas repercussões no âmbito das relações comerciais entre empresas estrangeiras e nacionais, e o descrédito do Brasil no consenso das nações.
São dois os fatores que assustam na arbitragem: o descarte do intervencionismo estatal nas relações privadas e a simplicidade. Os latino-americanos acostumaram-se à Ditadura do PODER e, inegavelmente, como constatado por Joãozinho Trinta, têm um gosto especial pelo complexo, rebuscado, incompreensível, inexeqüível...
Um dos grandes momentos desse Congresso foi a participação do Professor Carlos Alberto Carmona5 , como debatedor à palestra do jovem professor Jan Kleinheisterkamp, do Max-Planck-Institut da Alemanha.
O palestrante tratou do tema “Medidas Cautelares no Processo Arbitral”, focando-o no direito germânico, no comum europeu, no brasileiro e no regulamento da UNCITRAL Concluiu que a tendência dominante é pela concorrência de poderes, entre Jurisdição Estatal e Arbitral, no conhecimento e concessão de cautelares no processo arbitral. No Brasil apenas seria competente a Jurisdição Estatal.
Dissentiu o Professor Carmona, lembrando que o processo cautelar não tem fim em si mesmo. É acessório, antecedente ou incidente, ao processo de conhecimento. Da mesma forma a tutela que se quer antecipar, no curso do processo de conhecimento, é aquela, total ou parcialmente, objeto do processo de conhecimento. Ao optarem pela solução arbitral as partes delegam ao árbitro o poder de dizer o direito para solução de seu conflito concreto. O processo arbitral é processo de conhecimento que se encerra com sentença passível de execução forçada.
A necessidade de cautelares ou a possibilidade de antecipação da tutela surgirão em virtude e dependente do objeto que já foi, ou será submetido, ao processo arbitral. Como negar que o árbitro detém competência exclusiva para ambos? Se a Cautelar for preparatória ainda não se terá instalado o Tribunal Arbitral. Assim, subsidiariamente, abre-se a competência Estatal para o exame e concessão da Medida. Tal competência automaticamente deixará de existir com a instauração do Tribunal Arbitral.
Conhecer e conceder cautelares ou antecipações de tutela não se confunde com o poder de obrigar seu cumprimento! Se a ordem não for cumprida voluntariamente necessitará o árbitro da colaboração do Juiz Estatal, como resulta do aludido artigo 22 da Lei 9.307/96. Nada, além disso.
Como diria o Dr. Décio Milnitzky, citando os “avisos úteis para a direção da alma” do Pe. Manuel Bernardes, “O homem é mundo pequeno; as moléstias com que por divina permissão o demônio persegue ao homem são várias. O mais, qui legit intelligat”.
Ainda conviveremos, por algum tempo, com parcela da comunidade jurídica que acredita que sua essencialidade é ditada pela dificuldade dos tortuosos caminhos do processo jurisdicional estatal.
Tudo é uma questão de tempo e de FÉ:
“Tem fé no Direito como o melhor instrumento para a convivência humana; na Justiça, como destino normal do Direito; na Paz, como substituto bondoso da Justiça; e, sobretudo, tem fé na Liberdade, sem a qual não há Direito, nem Justiça, nem Paz”.6
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1Instalada pelo Instituto Liberal, de Pernambuco, logo que editado o último anteprojeto, em 1991.
2Sobre o reconhecimento e Execução das Decisões Arbitrais Estrangeiras, pelo Brasil. Foi o Decreto Legislativo n. 4.311, publicado no Diário Oficial da União - D.O.U. em 24 de julho de 2002, que regulamentou a adesão do país à mencionada Convenção.
3Pontes de Miranda, Comentários ao Código de Processo Civil, t. XV, p. 344, Forense, 1977, apud Carlos Alberto Carmona, Arbitragem e Processo, um comentário à Lei 9.307/ 96, p. 5, Malheiros, 1998.
4Arrimados na Cláusula Calvo de triste memória.
5Uma espécie de Moisés para a Arbitragem brasileira.
6"Os dez mandamentos do Advogado", Eduardo J. Couture
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* Advogada do escritório Bottallo e Gennari Advogados
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