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TJ/RS - Mantida a absolvição de acusada que apresentou carta psicografada ao Júri

A 1ª câmara Criminal do TJ/RS decidiu em sessão realizada ontem, 11/11, não haver motivos para que fosse determinado novo julgamento no caso em que o Ministério Público e a assistência da acusação recorreram da absolvição de Iara Marques Barcelos pelo Tribunal do Júri de Viamão. Durante o julgamento, ocorrido em maio de 2006, foi apresentada como prova a favor da ré uma carta psicografada.

12/11/2009


Prova dos autos

TJ/RS - Mantida a absolvição de acusada que apresentou carta psicografada ao Júri

A 1ª câmara Criminal do TJ/RS decidiu em sessão realizada ontem, 11/11, não haver motivos para que fosse determinado novo julgamento no caso em que o MP e a assistência da acusação recorreram da absolvição de Iara Marques Barcelos pelo Tribunal do Júri de Viamão. Durante o julgamento, ocorrido em maio de 2006, foi apresentada como prova a favor da ré uma carta psicografada.

Para os julgadores, não há elementos no processo para concluir que o julgamento do Tribunal do Júri foi absolutamente contrário às provas dos autos, devendo ser mantida a decisão que absolveu Iara.

Em julho de 2003, em Itapuã, Ercy da Silva Cardoso morreu vitimado por disparos de arma de fogo. Iara Marques Barcelos e Leandro da Rocha Almeida foram acusados como autores do fato. Leandro foi condenado pelo fato em processo que correu separado na Justiça.

Votos

Para o desembargador-Relator, Manuel José Martinez Lucas, havia no processo apenas resquícios de autoria do fato pela ré Iara, suficientes para a denúncia, mas não para anular a decisão soberana do Júri. Em relação à utilização da carta psicografada como prova, afirmou o magistrado que o exercício da religião é protegido constitucionalmente e cada um dos jurados pode avaliar os fatos levantados no processo conforme suas convicções.

Já para o desembargador Marco Antonio Ribeiro de Oliveira, que presidiu a sessão, havia provas em ambos os sentidos, para a absolvição e a condenação, cabendo aos jurados decidirem – "a decisão não é contrária à prova dos autos", concluiu.

O voto do desembargador José Antonio Hirt Preiss foi no mesmo sentido – o Júri optou por entender não haver prova (para a condenação) e é quem dá a última palavra. Disse que se vive em um Estado laico e republicano, devendo ser seguidas as leis escritas, votadas no Congresso. "A religião fica fora desta sala de julgamento que é realizado segundo as leis brasileiras", considerou.

Confira abaixo o acórdão na íntegra.

______________

APELAÇÃO CRIME. JÚRI. NULIDADE. JURADO QUE FOI CLIENTE DO ADVOGADO DE DEFESA. FATO QUE NÃO ERA DE CONHECIMENTO DA A-CUSAÇÃO POR OCASIÃO DO JULGAMENTO. O-CORRÊNCIA DE NULIDADE, ART. 564, II, DO CPP. OS IMPEDIMENTOS E SUSPEIÇÕES DOS JURA-DOS SÃO OS MESMOS DOS JUÍZES TOGADOS POIS EXERCEM FUNÇÃO JURISDICIONAL. A NULIDADE ATINGE A FORMAÇÃO DO CONSE-LHO DE SENTENÇA E VICIA O JULGAMENTO AB INITIO. POR MAIORIA, DERAM PROVIMENTO AO APELO DO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA DECLARAR A NULIDADE DO JULGAMENTO. VOTO VENCIDO.

APELAÇÃO CRIME

PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL

Nº 70016184012

COMARCA DE VIAMÃO

FABIO ARAUJO CARDOSO APELANTE/ASSISTENTE DE ACU-SAÇÃO

MINISTERIO PUBLICO APELANTE

IARA MARQUES BARCELOS APELADO

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Desembargadores integrantes da Primeira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado, por maioria, em dar provimento ao apelo do Ministério Público para declarar a nulidade do julgamento, pela ocorrência de nulidade absoluta, com fundamento no art. 564, inc. II, do CPP, vencido o Relator originário, que negava provimento ao mesmo. Prejudicada a análise do apelo da assistência da acusação. Redator para o acórdão o Des. Marcel Esquivel Hoppe.

Custas na forma da lei.

Participou do julgamento, além dos signatários, o eminente Se-nhor DES. MARCO ANTÔNIO RIBEIRO DE OLIVEIRA (PRESIDENTE).

Porto Alegre, 27 de junho de 2007.

DES. MANUEL JOSÉ MARTINEZ LUCAS,
Relator.

DES. MARCEL ESQUIVEL HOPPE,
Revisor e Redator.

 

RELATÓRIO

DES. MANUEL JOSÉ MARTINEZ LUCAS (RELATOR)

Na Comarca de Viamão, IARA MARQUES BARCELOS e LE-ANDRO DA ROCHA ALMEIDA foram denunciados como incursos nas san-ções do art. 121, §2º, incisos I e IV do CP.

A peça acusatória, recebida em 12/08/2003 (fl. 03), é do se-guinte teor:

“No dia 1° de julho de 2003, por volta das 21 horas, na Rua Nossa Senhora dos Navegantes, n° 940, na localidade de Itapuã, em Viamão, os denunciados Leandro da Rocha Almeida e a Marques Barcelos, em acordo de vontades e conjunção de esforços entre si e com pelo menos um Indivíduo identificado apenas como “Pitoco”, mediante disparos com arma de fogo (não apreendida), mataram a vitima Ercy da Silva Cardoso, causando-lhe as lesões somáticas descritas no auto de necropsia das fls. 144/145, que descreve como causa mortis hemorragia interna consecutiva à ruptura de vasos cervicais e contusão e lesão bulbo-pontina.

“A denunciada lara Marques Barcelos, embora casada, mantinha relacionamento amoroso com a vítima. Esta, por sua vez, reIacionava-se sexualmente com outras mulheres. Inconformada e movida por desarrazoado sentimento de ciúmes, a denunciada lara contratou a morte da vítima com o co-denunciado Leandro da Rocha Akneida, prometendo, como recompensa, a importância de R$ 20.000 (vinte mil reais). O denunciado Leandro, então, dando continuidade ao plano delituoso, manteve contato com um indivíduo conhecido como “Pitoco”, passando para ele os horários e costumes da vítima e combinando a consumação do delito, mediante a promessa de pagamento da impo de R$ 1.000,00 (mil reais).

“Por ocasião do fato, o denunciado Leandro, previamente acer-tado com a comparsa facilitou o ingresso de “Pitoco” na propriedade da vítima, impedindo, com isso, qualquer reação dos cachorros que guarneciam o local. No interior da residência, com o denunciado Leandro previamente acertado, direta e indiretamente, para a prática delituosa, prestando auxílio moral e material ao comparsa “Pitoco”, propiciou que este se aproximasse do local em que a vítima estava sentada, e, de inopino, desferisse disparos ela, provocando-lhe a morte.

“O delito foi praticado mediante promessa de recompensa, tendo os executores da ação delituosa utilizado recurso que impossibilitou a defesa da vitima, uma vez os disparos foram efetuados quando ela, sem qualquer possibilidade reação ou fuga, se encontrava distraída, sentada no interior da propriedade em que residia”.

Encerrada a instrução, sobreveio sentença, publicada em 28/06/2004, pronunciando IARA MARQUES BARCELOS e LEANDRO DA ROCHA ALMEIDA como incursos nas sanções do art. 121, §2º, incisos I e IV do CP.

 Houve cisão do feito em relação da ré IARA MARQUES BAR-CELOS (fl. 702), em razão do recurso em sentido estrito interposto contra a sentença de pronúncia, enquanto esta transitou em julgado em relação ao co-réu.

Posteriormente, a defesa desistiu desse recurso.

Ofertado o libelo-crime acusatório (fls. 728/730), bem como a contrariedade (fls. 740/741), foi designada a sessão de julgamento.

Nessa, o Juiz-Presidente do Tribunal do Júri, em conformidade com a decisão do Conselho de Sentença, que acatou a tese da negativa de autoria, declarou absolvida IARA MARQUES BARCELOS.

O Ministério Público apelou (fls. 1029/1036), sustentando nuli-dade posterior à pronúncia, vez que um dos sete jurados era suspeito, com-prometendo a imparcialidade do julgamento. Postulou, por isso, a submissão da ré a novo julgamento.

Em contra-razões (fls. 1154/1169), a defesa manifestou-se pela manutenção da decisão.

Tendo também a assistência da acusação interposto apelação, no prazo do art. 600, §4º, do CPP, apresentou razões recursais (fls. 1187/1232), sustentando, em síntese, a nulidade do feito, pela falta de  im-parcialidade do sétimo jurado,  e a falsidade da carta psicografada, utilizada em plenário.  Requereu provimento, com a realização de novo júri.

Em contra-razões (fls. 1276/1292),  manifestou-se igualmente pelo improvimento desse apelo.

Vieram os autos a este Tribunal.

Nesta instância, o parecer da Dra. Procuradora de Justiça Irene Soares Quadros é pelo provimento dos apelos interpostos pelo Ministério Público e pela assistência de acusação.

É o relatório.

VOTOS

DES. MANUEL JOSÉ MARTINEZ LUCAS (RELATOR)

Tendo sido interpostos apelos pelo Ministério Público e pela assistência da acusação contra a decisão absolutória da ré, proclamada pelo Tribunal do Júri da Comarca de Viamão, impõe-se, de início, uma brevíssima palavra sobre o conhecimento de ambas as inconformidades.

Como é consabido, ao assistente da acusação não é dado in-terpor recurso, salvo quando não o fizer o Ministério Público, podendo apenas arrazoar a irresignação manifestada pelo Parquet, conforme se extrai do disposto no art. 271, caput, do estatuto processual penal.

Não obstante, doutrina e jurisprudência admitem o recurso in-terposto pelo assistente, quando o recurso oficial não abranger todos os pontos passíveis de hostilização na sentença proferida.  Assim, na parte que não se iguala ao recurso do Parquet, é possível conhecer da inconformidade do assistente.

Nesse sentido é a singela lição de Júlio Fabbrini Mirabete, em sua conhecida obra:  “Pela mesma razão, é possível a apelação do assistente, ainda que o Ministério Público tenha recorrido, em caráter supletivo, isto é, da parte não abrangida pelo recurso ministerial, mas não quando o apelo da absolvição é amplo.”   (Código de Processo Penal Interpretado, 5ª ed.).

No caso vertente, como se verifica expressamente nos termos de interposição (fls. 1.026 e 1.027), o apelo ministerial está fulcrado apenas na alínea ‘a’ do art. 593, III, do Código de Processo Penal, ou seja, em alegada nulidade do julgamento, ao passo que a inconformidade da assistência se funda nas alíneas ‘a’,  ‘b’ e ‘d’ daquele dispositivo, reiterando a argüição de nulidade e alegando ser a decisão dos jurados manifestamente contrária à prova dos autos.

Assim sendo, não merece consideração o recurso do assistente pela letra ‘a’ da citada norma legal, em razão da apelação interposta pelo Ministério Público, mas pode e deve ser conhecido em relação às outras duas hipóteses, ainda que, no que tange à alínea ‘b’, mencionada no termo de interposição, nada seja dito nas razões recursais.

Feita essas rápidas considerações, passo ao exame de cada um dos apelos interpostos.

Pretende a ilustrada Promotora de Justiça que atuou no feito a desconstituição do julgamento, em razão de nulidade deste, evidentemente posterior à pronúncia, consistente no fato de que um dos integrantes do Conselho de Sentença, o Sr. João Brasil Gonçalves de Souza, mantém, desde a data de 14 de agosto de 2003, estreita relação profissional com um dos defensores que atuaram em plenário, o Dr. Luiz Fernando Martins.  Esclarece a agente do Parquet que este foi constituído por aquele, para defender seus interesses em ação de cobrança ajuizada perante o Juizado Especial Cível da Comarca de Tramandaí, instruindo a inconformidade com cópia integral dos autos daquele processo cível.

Tece longas considerações em torno da questão, salientando especialmente o fato de que, nem o causídico, nem o jurado, mencionaram tal vínculo profissional, não obstante a advertência feita pela MMª Juíza.  Invoca os arts. 252, 254, 462 e 458 do Código de Processo Penal, sustentando a nulidade da sessão de julgamento.

Já a douta defesa, em suas bem lançadas contra-razões, apre-senta inúmeros argumentos no sentido da inocorrência da nulidade apontada, dentre os quais a ausência de prejuízo e a ausência de demonstração da parcialidade do jurado em questão.

Tenho que todos esses fundamentos defensivos são relevantes, mas um deles avulta como razão suficiente para o desacolhimento da argüição de nulidade.

É que a situação criada nestes autos e invocada pela agente ministerial não constitui causa de impedimento nem de suspeição do jurado, eis que não prevista em qualquer dos dispositivos legais que tratam do as-sunto, aliás referidos nas razões apelatórias, como acima já foi dito.

Sabe-se que, no caso do Tribunal do Júri, além das incompati-bilidades previstas no art. 462 do Código, relativas a dois ou mais jurados que venham a servir no mesmo Conselho de Sentença, hipótese que por óbvio não é a presente, aos juízes leigos aplicam-se as mesmas causas de impedimento e suspeição impostas aos juízes togados.

Estas, por sua vez, estão previstas nos já citados arts. 252 e 254 daquele diploma processual, sendo que, em nenhum de seus incisos, se encontra o impedimento ou a suspeição do julgador por ser cliente do advo-gado de qualquer das partes.  Aliás, tais preceitos estão integralmente trans-critos nas contra-razões oferecidas pela defesa, motivo pelo qual abstenho-me de transcrevê-los neste voto.

De outra banda, não se diga que é possível na espécie decidir  por analogia, pelo senso comum ou por qualquer outro meio de interpretação, extraindo a suspeição do jurado da simples relação de confiança que tem ele com seu advogado.

Pelo contrário, a esse respeito já decidiu o Pretório Excelso:  “As causas geradoras de impedimento (CPP, art. 252) e de suspeição (CPP, art. 254) do magistrado são de direito estrito.  As hipóteses que caracterizam acham-se enumeradas, de modo exaustivo, na legislação processual penal.  Trata-se de numerus clausus, que decorre da própria taxatividade do rol consubstanciado nas normas legais referidas.”  (RT, 693/415).

Portanto, ainda que, do ponto de vista do homem comum, se possa questionar a parcialidade de um jurado que é ou foi constituinte do advogado que faz a defesa em plenário de julgamento, a verdade é que, no plano jurídico, não há como reconhecer a suspeição ou o impedimento desse jurado, uma vez que a situação não se encontra expressamente prevista nos preceitos legais que regem a matéria.

Em conseqüência, ao contrário do que sustenta a apelante, não cabia mesmo ao jurado ou ao advogado levantar a questão, ao início da sessão de julgamento, mesmo porque nenhum efeito teria.

Da mesma forma, não se vislumbra a apontada nulidade do julgamento, razão pela qual desmerece provimento o apelo ministerial. 

Concedo destaque para a questão.

DES. MARCEL ESQUIVEL HOPPE (REVISOR E REDATOR)

Ouso divergir do eminente Relator no que tange ao reconheci-mento de nulidade suscitada pelo Ministério Público.

Primeiramente, é preciso esclarecer que os impedimentos e suspeições dos jurados são os mesmos dos juízes togados pois exercem função jurisdicional e como tal devem ser apreciados.

Desta forma, equivale dizer que, se o juiz togado não pode julgar processo em que atue como advogado seu próprio advogado o mesmo se aplica ao Conselho de Sentença que julga o processo, de competência do Júri.

Assim, se o objetivo maior é garantir a imparcialidade do ma-gistrado, conforme preceito constitucional, é de ser aceita a possibilidade de argüição de exceção de suspeição, em caso de vínculo entre juiz e advogado.

Oportuno salientar os ensinamentos de Guilherme Souza Nucci (In. Código de Processo Penal Comentado, p. 254, 5ª ed):

“Costuma-se sustentar que esses especiais vínculos de-vem ser mantidos com a parte e não com seu representante. Não abrangeria, pois, o representante do Ministério Público, nem o advogado, mas unicamente o réu e a vítima. Discordamos, com a devida vênia. Em primeiro lugar, porque no processo penal, a parte que ocupa o pólo ativo é, via de regra, o Ministério Público, agindo em nome da sociedade. Contra esta é que o juiz não nutrirá particular vínculo de afeição ou ódio – e se o fizer, é caso patológico. Voltar-se-á, se for o caso, contra o seu representante. Por outro lado, o ofendido, quando não integra a relação processual, através do assistente de acusação, não pode ser considerado parte. Restaria apenas o réu, sabendo-se, ainda, que inúmeros casos de perda da parcialidade decorrem da aversão existente, ou extrema afeição, entre juiz e defensor. Por isso, se o objetivo maior é garantir a imparcialidade do magistrado, conforme preceito constitucional, é de ser aceita a possibilidade de argüição de exceção de suspeição, em caso de amizade íntima ou inimizade capital, entre juiz e promotor, bem como entre juiz e advogado. É o que resta sobejamente concretizado nas relações processuais existentes, não sendo possível ignorar o fato do magistrado ser falível como todos, não conseguindo manter sua neutralidade de estima por demasia o promotor ou o odeia com todas as forças. O mesmo se diga do defensor. Dessa forma, se o juiz iniciou sua atuação em primeiro lugar, não cabe alegação de que o réu contratou para sua defesa um inimigo capital do magistrado para que este seja afastado. Se o fez, sendo alertado para o fato, assume o risco da perda da parcialidade do julgador, até porque a exceção de suspeição não é obrigatória. Entretanto, se o advogado já atuava no feito, trocando-se o juiz, é preciso que este se afaste ou poderá ser interposta a devida exceção. Sobre o assunto, mencionou Espínola Filho a lição de Herotildes da Silva Lima, na linha que assumimos: É preciso atentar para a realidade da vida. O magistrado pode ter motivos para ser agradável ao advogado e, favorecendo-o, favorecer diretamente a parte; e é sabido mesmo que certos indivíduos por esperteza ou por má-fé contratam determinados advogados por saberem de sua ligações com os julgadores. Tem havido, infelizmente, casos que ferem a sensibilidade da opinião pública; advogados que deixam certos cargos públicos são logo constituídos procuradores em questões de vulto e retumbantes, porque exerceram influências sobre juízes, nomeando-os despertando-lhes sentimentos de gratidão. Às vezes, subitamente certos escritórios se movimentam com a notícia de novos rumos na vida política. E depois é preciso assinalar que o advogado tem interesse direto no êxito da questão submetida ao seu patrocínio, e pela vitória faz todo o esforço. Pode não recorrer aos fatores desonestos, mas não os repele quando se apresentam em favor de sua pretensão. Para cortar toda a dúvida, é preferível a suspeição porque, perdida a causa, o adversário da parte favorecida com o advogado influente terá sempre argumentos para atacar a isenção dos juízes. O advogado põe em certas causas todo o seu desvelo, arrisca seu crédito profissional, o seu nome, o seu futuro e de sua família, o seu bem-estar, o êxito financeiro de sua vida, a tranqüilidade nos dias futuros. Há causas que significam a fama, a glória para o advogado. Como afirmar-se que ele não tem interesse em que a decisão seja neste ou naquele sentido, e interesse fundamental? As leis antigas foram sábias e vedavam a advocacia aos poderosos, justamente pela influência que podiam exercer no ânimo dos juízes timoratos, covardes, interesseiros, acomodatícios, com parentes para empregar e promover, dependendo da boa vontade dos poderosos. Essa suspeição é um dever moralidade” (ob. Cit., p. 261). Com essa posição, muito embora, Espínola Filho, a despeito de considerá-la psicologicamente relevante, não concorda. Prefere acreditar na elevação de caráter, que se exige de todo julgador, e, quando for o caso, certamente o próprio juiz iria invocar razões de ordem íntima para não continuar no feito (idem, p. 261-262). Tudo o que foi mencionado no tocante ao advogado, certamente vale par ao promotor. Insistimos, no entanto, em nossa posição, afirmando que não se pode deixar a credibilidade da Justiça nas mãos da ‘elevação de caráter’ do julgador, que, realmente, segundo cremos, a maioria possui, mas não todos. Não é correto permitir-se que uma das partes assista, inerte e vencida de antemão, o juiz amicíssimo do representante da parte contrária conduzir a causa ou, em caso de inimizade capital, veja-se obrigada a lançar mão de toda a sorte de recursos para combater os atos decisórios do magistrado, eivados, nos eu entender, de parcialidade. Garantir um juiz isento é dever do Estado e, nessa linha, a exceção de suspeição é o mecanismo mais abalizado a ser utilizado. A interpretação extensiva do conceito de parte, pois, é o remédio mais palatável, envolvendo a de seu representante. Isso não significa, como já dissemos, estar o juiz entregue ao inescrupuloso réu, que contrata o inimigo capital do magistrado somente para afastá-lo. Arca com sua má-fé, mantendo-se o julgador no feito. O bom-senso e o caso concreto devem ditar a melhor solução à situação”. 

No contexto, garantir um juiz isento é dever do Estado e, nesta linha, a exceção de suspeição é o mecanismo mais adequado à hipótese.

No caso dos autos, um dos jurados era suspeito uma vez que cliente do advogado de defesa, Dr. Luiz Fernando Martins, fato que não era de conhecimento da acusação por ocasião do julgamento.

Por certo que a situação constitui nulidade absoluta nos termos do art. 564, inc. I, do CPP.

E mais, a nulidade atinge a formação do Conselho de Sentença pois se um dos jurados estava absolutamente impedido de julgar o feito, a formação do Conselho foi de apenas 06 julgadores.

O art. 5º, LIII da Constituição Federal exige para validade do processo que exista autoridade competente para julgamento. Na organização do Tribunal do Júri exige-se a presença de 07 cidadãos isentos, o que não ocorreu no caso. Esse vício inicial macula todo o julgamento não cabendo aqui dizer que pouco importa o voto de 01 jurado pois não modificaria a decisão, repita-se, o vício é na origem. Nesse sentido, é o voto da Desembargadora Elba Aparecida Nicolli Bastos em recente decisão, no julgamento da apelação-crime nº 70008245425, Terceira Câmara Criminal, julgada em 16 de março de 2006:

“ ...

O argumento de que em razão do quorum absolutório de 05 votos afirmativos contra 02 negativos não haveria modificação do resultado, mesmo com a suspeição de um dos jurados, não é hábil a convalidar o julgamento se, oportunamente, invocada a nulidade pela acusação, o juiz manteve o sorteio.

O julgamento coletivo, e toma-se por analogia como exemplo, as Câmaras separadas do Tribunal de Justiça, não se convalidam se um Magistrado for parente por afinidade do Advogado, Promotor etc. Desimporta que pudesse inexistir prejuízo con-creto, ou seja, que mesmo com o impedido a decisão não se alteraria. O vício é de formação do órgão Julgador.

O inciso I do art. 564 não se insere no art. 572, I, não tendo o vício sido sanado impõe-se a declaração, na forma do art. 573 do CPP.

Arranha a Constituição Federal, artigo 5º, inciso LIII, de que “Ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente“, configurando circunstância viciada, nulidade absoluta elencada no artigo 564, I, do Código de Pro-cesso Penal, absoluta ,mormente suscitada. ”

Assim voto pela nulidade do julgamento pela ocorrência de nu-lidade absoluta, com fundamento no art. 564 inciso I, do Código de Processo Penal.

DES. MARCO ANTÔNIO RIBEIRO DE OLIVEIRA (PRESIDENTE) - De a-cordo como Des. Marcel Esquivel Hoppe.

DES. MARCO ANTÔNIO RIBEIRO DE OLIVEIRA - Presidente - Apelação Crime nº 70016184012, Comarca de Viamão: "POR MAIORIA, DERAM PROVIMENTO AO APELO DO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA DECLARAR A NULIDADE DO JULGAMENTO, PELA OCORRÊNCIA DE NULIDADE ABSOLUTA, COM FUNDAMENTO NO ART. 564, INC. II, DO CPP, VENCIDO O RELATOR ORIGINÁRIO, QUE NEGAVA PROVIMENTO AO MESMO. PREJUDICADA A ANÁLISE DO APELO DA ASSISTÊNCIA DA ACUSAÇÃO. REDATOR PARA O ACÓRDÃO O DES. MARCEL ESQUIVEL HOPPE"

Julgador(a) de 1º Grau: JAQUELINE HOFLER

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