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TJ/RJ - Mercado Livre ganha ação movida por consumidor que pagou por produto que não foi entregue

O Mercado Livre ganhou uma ação movida por um consumidor que comprou um produto anunciado no site, mas o mesmo não foi entregue em sua casa. A decisão é dos desembargadores da 8ª câmara Cível do TJ/RJ, que entenderam que o fato aconteceu por negligência do próprio consumidor.

2/10/2009


Comprou e não recebeu

TJ/RJ - Mercado Livre ganha ação movida por consumidor que pagou por produto que não foi entregue

O Mercado Livre ganhou uma ação movida por um consumidor que comprou um produto anunciado no site, mas o mesmo não foi entregue em sua casa. A decisão é dos desembargadores da 8ª câmara Cível do TJ/RJ, que entenderam que o fato aconteceu por negligência do próprio consumidor.

Paulo Moura de Amorim Junior foi vítima de uma fraude cometida por um terceiro credenciado junto ao site, já que depositou na conta-corrente do vendedor R$ 718,54 referentes a um DVD, mas não recebeu o aparelho. Em sua defesa, o Mercado Livre argumentou que apenas faz o trabalho de aproximação entre consumidores e fornecedores de produtos e serviços.

O juízo de 1º grau entendeu que houve falha no serviço e julgou procedente o pedido do autor da ação e condenou a empresa a pagar R$ 5 mil de indenização por danos morais. Inconformado, o sítio virtual recorreu e os desembargadores decidiram reformar a sentença.

Segundo o relator da apelação cível, desembargador Orlando Secco, ao fazer o negócio diretamente com o fornecedor do produto, o consumidor desconsiderou as ferramentas disponibilizadas pelo site que proporcionam uma negociação mais segura e monitorada.

"Se o consumidor, ao utilizar serviço de compra via internet, inobserva regra de segurança constante da política do sítio de vendas, não pode responsabilizá-lo por sua própria negligência", ressaltou o desembargador, acrescentando que o CDC (clique aqui) não pode ser invocado "como anteparo paternalista a respaldar condutas negligentes e de manifesto despreparo do consumidor no trato de seu patrimônio".

Confira abaixo o acórdão na íntegra.

____________

OITAVA CÂMARA CÍVEL

APELAÇÃO CÍVEL N° 36090/2009

APELANTE: MERCADO LIVRE COMÉRCIO E ATIVIDADES DE INTERNET LTDA.

APELADO: PAULO MOURA DE AMORIM JUNIOR.

Juízo de Origem: 1ª Vara Cível de Madureira.

RELATOR: DES. ORLANDO SECCO - 363

APELAÇÃO CÍVEL. Sumário.

Consumidor. Compra. Internet. Fraude. Não entrega do bem. Alegação de fato do serviço por ausência de segurança do sítio de venda.// Serviço de aproximação comercial (compradores e vendedores). Negociação direta do consumidor com o fornecedor do produto (depósito em conta). Não utilização de ferramentas de controle disponibilizadas ("Mercado Pago").

Inobservância à política de segurança fornecida pelo sítio de vendas. Fato de terceiro perpetrado sob negligência exclusiva do consumidor. Inteligência do disposto no Art.14,§3°,I e II,CDC. Fortuito externo, não imputável à ré. Súmula 94,TJ/RJ.

Inaplicabilidade.// Se o consumidor, ao utilizar serviço de compra via internet, inobserva regra de segurança constante da política do sítio de vendas, não pode responsabilizá-lo por sua própria negligência, sob pena de transformar-se a responsabilidade objetiva pelo fornecimento de serviço, em responsabilidade integral.//

O CDC não pode ser invocado como anteparo paternalista a respaldar condutas negligentes e de manifesto despreparo do consumidor no trato de seu patrimônio, especialmente tratando-se de policial militar, pessoa especialista na adoção de medidas de segurança e prevenção de condutas criminosas.

Precedentes da Relatoria. Reforma da sentença.

Improcedência dos pedidos. Provimento ao Apelo.

VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n° 36090/2009, em que é Apelante MERCADO LIVRE COMÉRCIO E ATIVIDADES DE INTERNET LTDA., e Apelado PAULO MOURA DE AMORIM JUNIOR.

ACORDAM, os Desembargadores que integram a Oitava Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro POR UNANIMIDADE em PROVER O APELO, nos termos do voto do Des. Relator.

RELATÓRIO

Tratam os presentes autos de recurso de Apelação (fls.119/129) interposto por fornecedor de serviço de aproximação comercial via internet –réu da Ação de Indenização por Danos Materiais e Morais ajuizada por consumidor usuário, através da qual alega a ocorrência de fato do serviço consubstanciado na perpetração de fraude cometida por terceiro credenciado junto ao sítio de vendas que, tendo recebido valor (R$718,54) referente a produto adquirido (Kit DVD, tela retrátil de 7" MP3 amplificado - Cód. 0924/00026179), deixou de entregá-lo–, contra sentença proferida pelo Juízo a quo (fls.113/117) que, considerando a natureza da responsabilidade em que inserida a atividade da ré (Art.14,CDC), bem como pelo contexto probatório a indicar falta de segurança no controle das negociações realizadas em seu sítio, pelas quais aufere vantagem, entendeu caracterizada a falha do serviço, julgando procedentes em parte os pedidos para condenar a demandada à devolução do valor despendido (R$718,54) e em danos morais no valor de R$5.000,00, com juros e correção.

Sustenta o fornecedor do serviço recorrente, o provimento do Apelo e reforma do julgado, em síntese, sob o argumento de que realiza apenas o trabalho de aproximação entre consumidores e fornecedores de serviços e produtos; que o demandante, ao escolher depositar o valor diretamente para o fornecedor do produto não entregue, desconsiderou todos os avisos e política de segurança do sítio; que consta da tela de compra juntada à própria inicial o aviso sobre os riscos da negociação direta; que o site não pode se responsabilizar pela idoneidade dos fornecedores credenciados, sob pena de inviabilizar o negócio; que disponibiliza ferramentas de segurança como o "Mercado Pago", sistema de monitoramento da venda, pelo qual o valor depositado só é liberado ao fornecedor do produto após o efetivo recebimento pelo consumidor; que restou caracterizada a negligência do próprio consumidor.

Recurso recebido (fls.146) e contra-razoado (fls.148/154).

É o Relatório.

V O T O

Cremos seja procedente a pretensão recursal deduzida pelo fornecedor do serviço, o que conduzirá a reforma da sentença e rejeição dos pedidos autorais.

Com efeito, toda a controvérsia sub examen gira em tomo dos limites e efeitos da responsabilidade que recai sobre sítio virtual prestador de serviço de aproximação entre compradores e fornecedores de produtos, na hipótese de ter havido fraude na compra e venda realizada pelo consumidor usuário que, tendo depositado o valor do produto adquirido diretamente na conta do vendedor, não o recebera.

Simples seria o raciocínio fundado na responsabilidade objetiva do fornecedor do serviço associado aos termos da súmula 94,TJRJ diante de fortuito interno à atividade, concluindo-se pela imputação do resultado pelo fato do serviço.

Contudo, elementos de convicção constantes dos autos em cotejo com as próprias características do consumidor demandante, nos levam a uma maior reflexão da matéria em seus contornos fáticos e jurídicos.

Assim é que, segundo consta de doc. juntado à inicial pelo próprio autor (fls.22), bem como em sede de contestação pela mantenedora do sítio de vendas (fls.63/64 e 73), todo o dano ocorrera em virtude de fraude perpetrada sobre a própria negligência do consumidor que, pretendendo fazer o negócio diretamente com o fornecedor do produto (depósito em conta-corrente), desconsiderara o rol de avisos e ferramentas disponibilizados pela apelante em ordem a realizar uma negociação segura e monitorada.

A título de exemplo, menciona-se o mecanismo denominado "MercadoPago", que constava da tela de computador do consumidor no momento da negociação (fls.22), consubstanciado em contrato de gestão de pagamento, através do qual o usuário deposita o valor em conta do sítio de vendas e este somente paga ao fornecedor após o efetivo recebimento do produto; o demandante, no entanto, preferiu depósito direto, por sua conta e risco, como alertado pelo sítio de vendas, atraindo, a uma, as figuras da inexistência de defeito no serviço e fato exclusivo do consumidor (Art.14,§3°,I e II,CDC).

Não se há, pois, de conferir eficácia à pretensão autoral que se funda em atuar negligente do consumidor como se o CDC pudesse ser validamente invocado como anteparo paternalista ou salvo conduto contra a falta de preparo e cuidados comezinhos pelo titular do direito.

É o que se vê, mutatis mutandis, dos seguintes precedentes desta Relatoria, confirmados pelo Colegiado, em que se considerara a inexistência de dever de indenizar em virtude do atuar negligente e determinante do consumidor para a ocorrência do dano, em interpretação sistemática das súmulas 75, e 94,a contrario sensu,TJRJ:

DES. ORLANDO SECCO - Julgamento:22/11/2007 – OITAVA CAMARA CIVEL APELAÇÃO CÍVEL. Consumidor. Danos Material e Moral. Serviço bancário.

Transferência eletrônica de valores (TED). Preenchimento equivocado do documento. Retomo da TED. Não creditamento. Devolução de cheque emitido no mesmo dia pelo correntista por insuficiência de fundo. Negligência manifesta do consumidor. Fato exclusivo da vítima. Inexistência de responsabilidade contratual da instituição financeira receptora. (...) A Jurisprudência pacífica desta Corte, Interpretando o núcleo fático-principiológico do dano moral, tem entendido, mesmo em tema de relação de consumo, não se configurar o ilícito nas hipóteses em que a alegada ofensa à dignidade se dá por fato exclusivo do consumidor. Contornos do caso em tela que, pela extrema negligência e imprudência do consumidor, extrapolam as premissas da súmula 94, TJRJ, Inviabilizando o reconhecimento de fato do serviço pela ré. Inteligência do Art.14,§3°,I1,CDC. O CDC não pode ser Invocado como anteparo paternalista a respaldar condutas negligentes e de manifesto despreparo do consumidor no trato de seu patrimônio (súmula 75, c/c 94, TJRJ,a contrario sensu). Precedente desta Relatoria, confirmado pelo Colegiado.

Manutenção da sentença. Pretensão recursal manifestamente improcedente e contrária ao entendimento pacífico da Corte. Negativa de seguimento.

Agravo lnominado em Apelação Cível. Consumidor.

Responsabilidade Civil. Fraude bancária perpetrada por preposta do correntista. Instituição bancária x correntista. Evasão de valores de conta corrente em virtude de fraude perpetrada por preposta de confiança do correntista a quem delegara poderes de administração e gestão de seu patrimônio. Emissão de cheques assinados em branco e nominais, uso de senha eletrônica e acesso a extratos bancários por parte de secretária de correntista, em conduta reiterada e de forma sistemática. Centenas de cheques emitidos e valores retirados da conta corrente através de uso autorizado de senha eletrônica (R$4.988,04). Fraude consumada sob a confecção de extratos falsos, mantendo o correntista em erro. Comunicados e cartas envidas pela Instituição financeira que eram sonegados ao conhecimento do autor por sua secretária. Dinâmica fática que, em cotejo com a prova colhida em sede policial -onde a preposta confessa os crimes- e constante dos autos (fls.25/29), orienta no sentido de que o consumidor fora extremamente negligente e dera causa direta e eficiente ao dano suportado. Relação de confiança do consumidor com terceiro que, ao infringir normas contratuais confiando a terceiro sua senha eletrônica e cheques assinados, retira absolutamente a possibilidade de a instituição financeira controlar e fiscalizar a legitimidade da movimentação dos valores em sua conta, extrapolando os limites da súmula 94,TJRJ. Fato exclusivo da vítima.

Inteligência sistemática da norma contida no art.14,§30, II,CDC com os termos da súmula 28,STF. Nexo de causalidade rompido pela própria conduta negligente do consumidor. Não se afigura razoável que, com base no CDC e seu princípios, pretenda o consumidor transferir ao fornecedor de serviços a responsabilidade por sua conduta negligente que, além de constituir infração contratual, foi a causa eficiente e direta de toda a fraude perpetrada por sua preposta devido à relação de confiança que mantinham, inviabilizando de forma absoluta o controle e fiscalização pela instituição financeira. O CDC não pode ser invocado para servir de anteparo paternalista e ilimitado para condutas negligentes dos consumidores. Precedentes desta Corte. Sentença mantida. Recurso manifestamente improcedente e contrário ao entendimento jurisprudencial consolidado nesta Corte e sumulado pelo STF. Negativa de seguimento. (...). Matéria jurídica inserida em julgados reiterados desta Corte (súmula 94, TJRJ) e do STF (súmula 28) a demonstrarem o acerto da decisão proferida.

Sentença do Juízo a quo que se mantém integralmente. Improvimento do Agravo Inominado.

Obter dictum, vale ressaltar que o demandante é policial militar (fls.09), portanto pessoa especializada em segurança e prevenção à condutas criminosas, pelo que ainda aqui afigura-se irrazoável o pretendido tratamento paternalista pelo Estatuto Consumerista em virtude de seu atuar negligente, sob pena de transformar-se a responsabilidade objetiva pelo fornecimento de serviço em responsabilidade integral.

Merece, assim, ser reformada a sentença impugnada para que, julgando-se improcedente o pedido, sejam afastados os danos materiais e morais impostos, impondo-se ao autor as custas e honorários em R$500,00 n/f do Art.20,§4°,CPC.

Por tais fundamentos, DÁ-SE PROVIMENTO AO APELO para, reformando-se a sentença, julgarem-se improcedentes os pedidos formulados.

Data do julgamento e da apresentação (Art.94,RITJRJ).

Rio de Janeiro, 08 de setembro de 2009.

ORLANDO SECCO

DES. RELATOR

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