Fumo
TRF da 1ª região nega pedido do Sindfumo e mantém divulgação de frases e imagens de advertência em propagandas e embalagens de cigarros
A solicitação para suspender a resolução havia sido feita pelo Sindicato da Indústria do Fumo no Estado do Rio de Janeiro (Sindfumo/RJ). A 16ª vara do Distrito Federal não acolheu o pedido e a entidade recorreu ao TRF da 1ª região.
O Sindfumo alegou que a norma afronta os §§ 2º e 3º da lei 9.294/96. Esses dispositivos determinam que a advertência sobre os malefícios decorrentes de uso de cigarro seja feita segundo frases estabelecidas pelo Ministério da Saúde, nas embalagens e maços. Elas devem ser acompanhadas de imagens ou figuras que ilustrem o sentido da mensagem.
A AGU, por meio da PRF da 1ª região, rebateu os argumentos. Segundo a Procuradoria, é competência da Anvisa a fiscalização sanitária de toda a produção, distribuição e comercialização de produtos e serviços relacionados à saúde. Por isso, a autarquia editou Resolução nº 54/08, renovando imagens e advertências na forma da lei 9.294/96 (clique aqui).
Em relação às imagens fortes inseridas nas embalagens, sustentou que elas foram criteriosamente desenvolvidas a partir de um grupo multidisciplinar envolvendo profissionais de saúde do Instituo Nacional do Câncer e da Anvisa, com o objetivo de informar a dimensão dos riscos e estimular os cidadãos a pararem de consumir tabaco.
O TRF da 1ª região concordou com a defesa da AGU e negou o pedido do Sindicato. O Tribunal acolheu, na decisão, o argumento de que se trata de imagens metafóricas com base em estudos técnicos, de pesquisas e de um histórico de sucesso de mensagens e imagens de advertência. Assim, não há razão para afastar a competência da Administração Pública para tratar do assunto.
Quanto à competência do Ministério da Saúde para estabelecer as frases e imagens, o TRF da 1ª região considerou que "a interpretação restritiva das competências de órgãos e entidades é compatível com a concepção burocrática, que valoriza os meios, a segurança, a hierarquia e o formalismo, idéias que atualmente dividem espaço com as características de sistema, flexibilidade e eficiência".
Por fim, concluiu que as advertências das embalagens estão incluídas no conceito de vigilância sanitária, à semelhança das advertências existentes em embalagens de produtos inflamáveis ou dos que devam ser mantidos longe do alcance das crianças.
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Agravo de Instrumento : 2009.01.00.011626-9/DF
Confira abaixo o relatório na íntegra.
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RELATÓRIO
O SINDICATO DA INDÚSTRIA DO FUMO NO ESTADO DO RIO DE JANEIRO – SINDIFUMO/RJ interpôs agravo de instrumento, com pedido de antecipação de tutela recursal, com a finalidade de reformar decisão do MM. Juiz Federal titular da 16ª Vara/DF, na qual indeferiu liminar em mandado de segurança objetivando tornar sem efeito a RDC nº 54/08, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária – ANVISA, que instituiu “novas frases e imagens de advertência a serem estampadas na propaganda comercial e embalagem de fumígenos”.
Alegou, essencialmente: a) que a ANVISA “(i) usurpou competência privativa atribuída pela Lei nº 9.294/96 ao Ministério da Saúde; (ii) violou o princípio da reserva legal absoluta e qualificada exigido pela Constituição para a disciplina da propaganda de tabaco; (iii) deixou de realizar consultas ou audiências públicas, incorrendo em vício procedimental insanável; e (iv) desviou-se da finalidade expressamente definida pela Constituição para a veiculação de cláusulas de advertência informativas na propaganda comercial de cigarros (art. 220, §§ 3º e 4º), instituindo fotomontagens bizarras, fomentadoras de visões distorcidas, irreais e sem qualquer nexo médico-científico com os riscos associados ao fumo”.
O pedido de antecipação de tutela recursal ficou para ser apreciado após resposta da agravada, que se encontra às fls. 174-202.
Em 20.04.2009, foi indeferido o pedido de antecipação de tutela recursal, com os seguintes fundamentos:
1 - O agravante busca situar constitucionalmente a matéria no art. 220, § 3º, II - que estabelece competir à lei federal criar meios de defesa contra a “propaganda de produtos, práticas e serviços que possam ser nocivos à saúde e ao meio ambiente” -, e no § 4º, mesmo artigo – segundo o qual a propaganda comercial de tabaco estará sujeita a restrições legais e conterá, sempre que necessário, advertência sobre os malefícios decorrentes de seu uso. A exigência de lei federal é apenas para o primeiro caso, defesa da propaganda por meio de uma espécie de censura (“lato sensu”). A situação é diferente de “advertência sobre os malefícios decorrentes de seu uso”, que a Lei n. 9.294/96, art. 3º, §§ 2º e 3º, determina: a) seja feita segundo frases estabelecidas pelo Ministério da Saúde; b) nas embalagens e nos maços de produtos fumígenos, seja acompanhada de imagens ou figuras que ilustrem o sentido da mensagem.
2 - Não há razão para interpretação meramente literal da lei quando se reporta a Ministério da Saúde. Sobre a interpretação literal deve predominar, no caso, o critério teleológico, por meio do qual se conclui que a finalidade da norma é melhor atingida com o exercício da referida competência por entidade especializada, com personalidade jurídica própria, é verdade, mas, de qualquer modo, longa manus da União (Ministério da Saúde).
3 - A advertência contida nas embalagens de cigarros destinam-se aos usuários, efetivos e potenciais, logo, é no interesse destes que se recomenda a realização de consultas e audiências públicas. As indústrias fumígenas não têm, a rigor, legitimidade para argüir nulidade de ato baixado sem tal formalidade.
4 - Resta examinar o conteúdo das imagens criadas pela ANVISA, que o agravante tem como “bizarras, fomentadoras de visões distorcidas, irreais e sem qualquer nexo médico-científico com os riscos associados ao fumo”. À primeira vista, parece que as imagens são realmente exageradas e, por isso, tendentes ao descrédito. Mas a esse juízo leigo responde a ANVISA que se trata de imagens metafóricas, criadas por um grupo de estudo multidisciplinar instituído pelo Instituto Nacional do Câncer, “atento ao resultado de diversas pesquisas de opinião realizadas”. Seriam “fruto de estudos técnicos, de pesquisas e de um histórico de sucesso de mensagens e imagens de advertência”. Imagens desse teor necessitam ser periodicamente renovadas para não perderem o impacto. Não parece que se pretenda comunicar, fotograficamente, que o coração do fumante acaba sitiado por tocos de cigarro ou que no derrame cerebral há hemorragia externa. A mensagem tem, mesmo, sentido figurado. Quanto aos efeitos, não é possível, por meio de um juízo leigo, liminar, avaliar o impacto psicológico de sua veiculação. Assim, não há razão suficiente para, neste estágio, afastar a discricionariedade técnica da Administração.
O agravante ingressou com pedido de reconsideração, alegando que a decisão em que indeferida antecipação de tutela recursal incorre nas seguintes impropriedades: a) contrariou o “princípio da legalidade estrita ao qual a administração pública se sujeita”; b) “mesmo adotando-se uma interpretação teleológica da disposição legal distribuidora de competências (Lei n. 9.294/1996, art. 3º, §§ 2º e 3º), é de ver-se que a finalidade da ANVISA definida em lei (art. 6º, caput, Lei n. 9.782/99) não se adequa à fixação da competência atribuída ao Ministério da Saúde”; “da leitura do artigo transcrito extrai-se que a autarquia tem por finalidade a proteção da saúde quando envolvido o controle sanitário da produção e comercialização de produtos e serviços submetidos à vigilância sanitária”; “a normatização da publicidade de produtos fumígenos não se insere no conceito de controle sanitário e não tem a ANVISA, no particular, qualquer especialidade”; c) “é a própria ANVISA quem afirma ater utilizado estudo patrocinado pelo INCA, entidade vinculada ao Ministério da Saúde, revelando, a mais não poder, sua falta de especialização para tratar da matéria”; d) “é incontestável que o Ministério da Saúde possui quadros qualificados e especializados para o exercício de todas as competências que lhe foram destinadas pelo legislador, especialmente o controle da publicidade de produtos fumígenos”; e) a Lei n. 9.782/99 define e diferencia, no âmbito da União, o exercício das competências do Ministério da Saúde, da ANVISA e dos demais órgãos e entidades integrantes do Sistema Nacional de Vigilância Sanitária” f) “embora a autarquia seja vinculada ao Ministério da Saúde, não há entre eles sequer hierarquia”; g) “permitir essa ilegal invasão de competência ameaça gravemente a ordem pública e a segurança jurídica, pois significa conferir à ANVISA um poder não previsto em lei, na medida em que, considerada longa manus da União, terá a possibilidade de regulamentar toda e qualquer matéria afeta ao âmbito do Ministério da Saúde, mesmo que não prevista essa competência em lei, o que contraria o princípio constitucional de repartição de competências”; h) “a Lei n. 9.782/99 expressamente confere ao Ministério da Saúde poderes para, em casos excepcionais, exercer as competências da ANVISA, mas não prevê que a autarquia, nem mesmo em situações extremas, exerça as competências da União”; i) “a matéria jamais poderia ser tratada em Resolução da ANVISA, mas, na pior das hipóteses, em Decreto do Poder Executivo, tal como ocorreu no Decreto n. 2.018/96, que regulamentou a Lei n. 9.294/96 e tratou da questão da publicidade”; j) “em relação à imprescindibilidade da audiência pública, ainda que a advertência das embalagens seja destinada aos consumidores, como as indústrias são diretamente atingidas pela norma editada, até porque suportarão os ônus financeiros dela, sua legitimidade para argüir nulidade pela não obediência dessa formalidade é decorrência lógica e garantida pela Constituição Federal”.
Deu-se vista ao Ministério Público Federal, que argumentou: a) “conquanto possa, de fato, parecer imprópria à idéia do controle sanitário a normatização da propaganda comercial dos produtos fumígenos, ao menos quando se trata de publicidade veiculada nos meios de comunicação, está longe de conformar a esse entendimento a inserção nas embalagens e maços dos mesmos produtos de advertências sobre os malefícios que podem causar à saúde, como é o caso”; “aqui, o que se exerce é o controle, no processo de produção e comercialização, dos riscos a que se encontrarão expostos aqueles que venham adquiri-los, a exemplo das advertências que se inserem nas embalagens de produtos inflamáveis ou dos que devam ser mantidos longe do alcance de crianças”; “não se trata, em rigor, de propaganda”; b) “as imagens, como se sabe, perdem a sua força com o passar do tempo e é, precisamente, por isso, que devem ser periodicamente substituídas”; c) há contradição “de se admitir o uso das imagens existentes, imposto, tal como aqui, por outra Resolução da ANVISA (RDC 335, de 21 de novembro de 2003), esta isenta, ao contrário, da argüição de nulidade pelo mesmo vício”.
É relatório.
VOTO
Estabelece a Constituição, especialmente, que “a propaganda comercial de tabaco, bebidas alcoólicas, agrotóxicos, medicamentos e terapias estará sujeita a restrições legais, nos termos do inciso II do parágrafo anterior, e conterá, sempre que necessário, advertência sobre os malefícios decorrentes de seu uso”.
Conforme bem colocou o Ministério Público Federal, as advertências em questão são semelhantes às que se fazem nas embalagens de produtos inflamáveis ou dos que devam ser mantidos longe do alcance das crianças, portanto, incluídas no conceito de vigilância sanitária, lato sensu.
Hoje já não se fala na vinculação da Administração somente ao princípio da legalidade e jamais se falou em vinculação ao princípio da legalidade estrita, este mais apropriado para as áreas tributária e penal. Houve evolução para se poder afirmar que a Administração está vinculada, mais que ao princípio da legalidade, ao princípio da legitimidade, da juridicidade e da constitucionalidade. Sobre a legalidade estrita deve prevalecer os fins constitucionais, como no caso. Na ausência de lei, a Administração está autorizada, salvo reserva específica, a tomar providências para cumprir diretamente a Constituição.
Outra idéia que deve ser enfatizada é a visão sistêmica que atualmente prevalece nos órgãos e entidades estatais. A interpretação restritiva das competências de órgãos e entidades é compatível com a concepção burocrática, que valoriza os meios, a segurança, a hierarquia e o formalismo, idéias que atualmente dividem espaço com as de sistema, flexibilidade e eficiência.
Aduzindo estas considerações às que já foram feitas por ocasião do indeferimento do pedido de antecipação de tutela recursal, nego provimento ao agravo de instrumento.
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_____________RESOLUÇÃO DA DIRETORIA COLEGIADA - RDC Nº 54, DE 6 DE AGOSTO DE 2008
Altera a RDC nº 335, de 21 de novembro de 2003, que dispõe sobre as embalagens de produtos fumígenos derivados do tabaco.
A Diretoria Colegiada da Agência Nacional de Vigilância Sanitária, no uso da atribuição que lhe confere o inciso IV do art. 11 do Regulamento aprovado pelo Decreto nº 3.029, de 16 de abril de 1999, e tendo em vista o disposto no inciso II e nos §§ 1º e 3º do art. 54 do Regimento Interno aprovado nos termos do Anexo I da Portaria nº 354 da ANVISA, de 11 de agosto de 2006, republicada no DOU de 21 de agosto de 2006, em reunião realizada em 5 de agosto de 2008, e
considerando o disposto na Lei n.º 9.782, de 26 de janeiro de 1999, que determina a regulamentação, o controle e a fiscalização dos produtos e serviços que envolvam risco à saúde pública;
considerando as disposições da Lei n.º 9.294, de 15 de julho de 1996 e suas alterações posteriores;
considerando a necessidade de renovação imagens e advertências nas embalagens dos produtos derivados do tabaco,
adota a seguinte Resolução da Diretoria Colegiada e eu, Diretor-Presidente, determino a sua publicação:Art. 1º O caput do art. 2º da RDC 335, de 21 de novembro de 2003 passa a vigorar com a seguinte redação:
"Art. 2º Para os produtos fumígenos derivados do tabaco, as advertências abaixo transcritas serão usadas de forma simultânea ou seqüencialmente rotativa, nesta última hipótese devendo variar no máximo a cada cinco meses, de forma legível e ostensivamente destacada, e serão acompanhadas por imagens, disponíbilizadas no sítio: https://www.anvisa.gov.br/tabaco/embalagem.htm, todas precedidas da afirmação "O Ministério da Saúde adverte":
1. VÍTIMA DESTE PRODUTO - Este produto intoxica a mãe e o bebê, causando parto prematuro e morte.
2. GANGRENA - O uso deste produto obstrui artérias e dificulta a circulação do sangue.
3. MORTE - O uso deste produto leva à morte por câncer de pulmão e enfisema.
4. INFARTO - O uso deste produto causa morte por doenças do coração.
5. FUMAÇA TÓXICA - Respirar a fumaça deste produto causa pneumonia e bronquite.
6. HORROR - Este produto causa envelhecimento precoce da pele.
7. SOFRIMENTO - A dependência da nicotina causa tristeza, dor e morte.
8. PRODUTO TÓXICO - Este produto contém substâncias tóxicas que levam ao adoecimento e morte
9. PERIGO - O risco de derrame cerebral é maior com o uso deste produto.
10. IMPOTÊNCIA - O uso deste produto diminui, dificulta ou impede a ereção.) (NR)
Art. 2º Fica estabelecido o prazo de 9 meses, a contar da data da publicação desta resolução, para que as empresas fabricantes e importadoras disponibilizem ao comércio varejista, embalagens de produtos derivados de tabaco e materiais de propaganda que estejam cumprindo devidamente as alterações mencionadas no artigo anterior
§ 1º Findo o prazo referido no caput, somente poderão ser disponibilizadas ao comércio varejista embalagens e materiais publicitários que estejam de acordo com a presente resolução.
§ 2º Os produtos fabricados ou importados anteriormente ao prazo estabelecido no caput e que não atendam às determinações desta resolução, poderão ser comercializados até 12 meses após a publicação da presente.
§ 3º Os prazos acima dispostos aplicam-se a todos os produtos fumígenos derivados do tabaco, sem exceção, incluindo charutos, cigarrilhas, cigarros de bali, cigarros tipo kretek e outros.
Art. 3º Esta Resolução de Diretoria Colegiada entra em vigor na data de sua publicação.
DIRCEU RAPOSO DE MELLO