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OAB vai ao STF contra lei do RJ que restringe acesso a inquérito policial

O Conselho Federal da OAB ajuizou ontem, 4/2, perante o STF uma Adin, com pedido de cautelar, para impugnar a íntegra da lei estadual nº 5.061/2007, do Estado do Rio de Janeiro.

5/2/2009


Acesso Restrito

OAB vai ao STF contra lei do Rio que restringe acesso a inquérito policial

O Conselho Federal da OAB ajuizou ontem, 4/2, perante o STF, uma ADIn, com pedido de cautelar, para impugnar a íntegra da lei estadual nº 5.061/2007, do Estado do Rio de Janeiro.

A referida lei cria restrições de acesso do investigado e dos advogados a informações constantes de inquérito policial, "violando diversas regras e princípios da Constituição Federal", como salienta o texto da AdIn proposta e assinada pelo presidente nacional da OAB, Cezar Britto.

O texto também destaca que esta é a primeira ADIn, questionando a inconstitucionalidade de uma lei que restringe acesso aos autos após o Supremo ter adotado, na última segunda-feira, dia 2, a Súmula 14 - que estabelece justamente o acesso amplo de advogados aos inquéritos policiais, mesmo que corram sob sigilo. A súmula vinculante foi proposta ao STF pela entidade da advocacia.

A seguir, a íntegra da ADIn da OAB que requer declaração da inconstitucionalidade da lei nº 5.061, do Rio de Janeiro:

"EXCELENTÍSSIMO SENHOR MINISTRO PRESIDENTE DO EGRÉGIO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

CONSELHO FEDERAL DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL - OAB¸ por seu Presidente, vem, à presença de Vossa Excelência, por intermédio de seu advogado infra-assinado, com instrumento procuratório específico incluso e endereço para intimações na SAS Qd. 05, Lote 01, Bloco M, Brasília-DF, com base no art. 103, inciso VII e art. 102, inciso I, alínea "a" da Constituição Federal e no art. 2º, inciso VII da Lei nº 9.868/99, e de acordo com a decisão tomada nos autos do processo nº 2007.18.06713-01 - Conselho Pleno (certidão anexa), propor AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE COM PEDIDO CAUTELAR em face da ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO, por intermédio de seu Presidente, com endereço para comunicações no Palácio Tiradentes, na Rua Primeiro de Março, s/n, Praça XV - Rio de Janeiro/RJ e do Exmo. Sr. GOVERNADOR DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO, com endereço para comunicações no Palácio Guanabara, Rua Pinheiro Machado, s/n, Laranjeiras/RJ, órgãos/autoridades responsáveis pela elaboração da Lei Estadual nº 5.061, de 06 de julho de 2007, pelos seguintes fundamentos:

1. DOS DISPOSITIVOS LEGAIS IMPUGNADOS

A Lei nº 5.061/2007, do Estado do Rio de Janeiro, "cria, na confecção de registros de ocorrência pelas delegacias de polícia submetidas ao sistema delegacia legal, a obrigação de supressão de dados pessoais dos envolvidos que permitam sua localização por pessoas estranhas aos quadros da Polícia Civil, Ministério Público e Poder Judiciário". Eis o seu teor integral:

Art. 1° A Polícia Civil do Estado do Rio de Janeiro, nas delegacias de polícia nas quais se encontra implantado o sistema Delegacia Legal, deverá preservar em sigilo o endereço, o número telefônico, o número da identidade e o número do CPF dos envolvidos e testemunhas em ocorrências criminais, que não mais poderão ser acessíveis a estranhos aos quadros da Polícia Civil, Ministério Público e Poder Judiciário.

Art. 2° Para que não haja prejuízo ao serviço policial e judicante, tais dados serão mantidos em peça apartada, sendo encaminhados ao Poder Judiciário juntamente com o procedimento criminal, sempre que este lhe for apresentado, não podendo, sob nenhuma circunstância, serem disponibilizados aos envolvidos, testemunhas ou a terceiros.

Art. 3° O Grupo Executivo do Programa Delegacia Legal ficará incumbido da implementação das medidas necessárias, no prazo da vacância desta Lei.

Art. 4° Esta Lei entra em vigor trinta dias após sua publicação.

Ao instituir, nesses termos, a restrição do acesso do investigado e dos advogados a informações constantes de inquérito policial, a Lei nº 5.061/2007, do Estado do Rio de Janeiro, violou diversas regras e princípios da Constituição Federal.

O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, como legitimado universal para a propositura de ação direta de inconstitucionalidade e, portanto, defensor da cidadania e da Constituição, no exercício de sua competência legal (Art. 44, inciso I da Lei nº 8.906/94), comparece ao guardião da Carta Magna, para impugnar a íntegra da Lei nº 5.061/2007, do Estado do Rio de Janeiro.

Feitas essas considerações, passa-se a demonstrar a inconstitucionalidade dos dispositivos legais combatidos.

2. FUNDAMENTOS JURÍDICOS

2.1 INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL - USURPAÇÃO, PELO ESTADO DO RIO DE JANEIRO, DE COMPETÊNCIA LEGISLATIVA PRIVATIVA DA UNIÃO

Ao disciplinar sobre acessibilidade a informações em inquéritos policiais, a Lei n° 5.061/2007, do Estado do Rio de Janeiro, invade a competência privativa da União para legislar sobre matéria processual e direito penal (Art. 22, inciso I da CF/88). Isso porque, como bem já frisou essa Corte Suprema, dispor normativamente sobre inquérito policial é legislar sobre direito processual penal:

"AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ART. 32, INC. IV, DA LEI SERGIPANA N. 4.122/1999, QUE CONFERE A DELEGADO DE POLÍCIA A PRERROGATIVA DE AJUSTAR COM O JUIZ OU A AUTORIDADE COMPETENTE A DATA, A HORA E O LOCAL EM QUE SERÁ OUVIDO COMO TESTEMUNHA OU OFENDIDO EM PROCESSOS E INQUÉRITOS. PROCESSO PENAL. COMPETÊNCIA PRIVATIVA DA UNIÃO. AÇÃO JULGADA PROCEDENTE. 1. É competência privativa da União legislar sobre direito processual (art. 22, inc. I, da Constituição da República). 2. A persecução criminal, da qual fazem parte o inquérito policial e a ação penal, rege-se pelo direito processual penal. Apesar de caracterizar o inquérito policial uma fase preparatória e até dispensável da ação penal, por estar diretamente ligado à instrução processual que haverá de se seguir, é dotado de natureza processual, a ser cuidada, privativamente, por esse ramo do direito de competência da União. 3. Ação direta de inconstitucionalidade julgada procedente" (grifou-se) (ADI 3896/SE, Relª. Min. Carmem Lúcia, decisão unânime, DJ 07/08/2008).

De tudo isso resulta a inconstitucionalidade integral da lei impugnada, por nítida usurpação, pelo Estado Federado, da competência legislativa privativa da União.

2.2 INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL - USURPAÇÃO, PELO ESTADO DO RIO DE JANEIRO, DA COMPETÊNCIA LEGISLATIVA PRIVATIVA DA UNIÃO PARA LEGISLAR SOBRE EXERCÍCIO PROFISSIONAL

Ao impedir o acesso a informações constantes de inquéritos policiais a "estranhos aos quadros da Polícia Civil, Ministério Público e Poder Judiciário" (Art. 1°), a Lei n° 5.061/2007, do Estado do Rio de Janeiro, restringe a atuação e o exercício profissional dos advogados, que possuem a prerrogativa legal de "examinar em qualquer repartição policial, mesmo sem procuração, autos de flagrante e de inquérito, findos ou em andamento, ainda que conclusos à autoridade, podendo copiar peças e tomar apontamentos" (Art. 7°, inciso XIV da Lei Federal n° 8.906/94 - Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil).

Essa restrição ao exercício profissional efetuada pela lei estadual combatida é inconstitucional, eis que a competência para legislar sobre "condições para o exercício de profissões" é privativa da União (Art. 22, XVI).

2.3 INCONSTITUCIONALIDADE MATERIAL - VIOLAÇÃO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL, DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA

A restrição do acesso de advogados a informações constantes de inquérito policial constitui flagrante ofensa às garantias constitucionais do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa.

Como bem ressaltou o Dr. Jorge Rubem Folena de Oliveira, membro da Comissão de Constituição, Legislação e Justiça da Seccional do Rio de Janeiro da Ordem dos Advogados do Brasil, "apesar de o inquérito ter caráter inquisitorial, seus patronos devem ter acesso, sem exceção, às informações existentes no mesmo, inclusive quanto aos envolvidos e testemunhas, a fim de assegurar a assistência aos seus clientes".

Nesse sentido, aliás, essa Suprema Corte julgou procedente a Proposta de Súmula Vinculante n° 1, encaminhada por este Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, em decisão que restou por aprovar a Súmula Vinculante n° 14: "É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária, digam respeito ao exercício do direito de defesa". Ao fazê-lo, a Corte sintetizou em súmula vinculante, nos termos da Constituição, os diversos precedentes que já possuía sobre a matéria.

Dúvida não resta, portanto, que a Lei Estadual ora questionada, ao restringir o acesso de advogados a informações constantes de inquéritos policiais, viola as garantias constitucionais do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, tal como explicitado na Súmula Vinculante n° 14.

3. DA MEDIDA CAUTELAR

Todos os graves danos à ordem jurídica constitucional indicados no item 2 estão ocorrendo desde 05/08/2007 (data de entrada em vigor da lei questionada, segundo o seu Art. 4º).

Desde então, com base em lei inconstitucional, autoridades policiais do Estado do Rio de Janeiro sentem-se normativamente autorizadas a impedir o acesso de advogados às peças de inquérito policial, vulnerando o direito constitucional à ampla assistência jurídica por parte dos investigados em procedimentos persecutórios penais.

Não existe tempo processualmente hábil para a espera do julgamento definitivo da presente ação direta de inconstitucionalidade. Qualquer fator de espera somente fará perpetuar o presente estado de grave inconstitucionalidade e de situações de burla a garantias constitucionais fundamentais.

Todo esse quadro está a justificar a concessão da medida cautelar, suspendendo a eficácia da lei ora combatida, até o julgamento definitivo da presente ação.

4. DOS PEDIDOS

Pelo exposto, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil requer:

a) a notificação da ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO, por intermédio de seu Presidente, e do Exmo. Sr. GOVERNADOR DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO para que, como órgãos/autoridades responsáveis pela elaboração da lei impugnada, manifestem-se, querendo, no prazo de cinco dias, sobre o pedido de concessão de medida cautelar, com base no art. 10 da Lei nº 9.868/99;

b) a concessão de medida cautelar, com base no art. 10 da Lei nº 9.868/99, para suspender a eficácia da Lei nº 5.061/2007, do Estado do Rio de Janeiro, em sua íntegra, até o julgamento definitivo da presente ação;

c) a notificação da ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO, por intermédio de seu Presidente, e do Exmo. Sr. GOVERNADOR DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO, para que, como órgãos/autoridades responsáveis pela elaboração da lei impugnada, manifestem-se, querendo, sobre o mérito da presente ação, no prazo de trinta dias, nos termos do art. 6º, parágrafo único da Lei nº 9.868/99;

d) a notificação do Exmo. Sr. Advogado-Geral da União, para se manifestar sobre o mérito da presente ação, no prazo de quinze dias, nos termos do Art. 8º da Lei nº 9.868/99 e da exigência constitucional do Art. 103, § 3º;

e) a notificação do Exmo. Sr. Procurador Geral da República, para que emita o seu parecer, nos termos do art. 103, § 1º da Carta Política;

f) a procedência do pedido de mérito, para que seja declarada a inconstitucionalidade integral da Lei nº 5.061/2007, do Estado do Rio de Janeiro.

Deixa-se de atribuir valor à causa, em face da impossibilidade de aferi-lo.

Nesses termos, pede deferimento".

Brasília/DF, 04 de fevereiro de 2009.

Maurício Gentil Monteiro
OAB/SE nº 2.435

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