Ofício
OAB Nacional pede retirada imediata de PL que cria nova CLT
O presidente nacional da OAB, Cezar Britto, encaminhou ofício ao deputado federal Cândido Vaccarezza - PT/SP requerendo a imediata retirada do Projeto de Lei nº 1.987/2007, de autoria do parlamentar, conhecido como "a nova CLT". Em síntese, o PL propõe alteração dos artigos 1º a 642 da Consolidação das Leis do Trabalho (clique aqui), instituindo um novo Código com 1.687 artigos, e revogando, total ou parcialmente, 204 normas jurídicas. O presidente da OAB apresentou o pedido com base em pronunciamento feito pela Comissão Nacional de Direitos Sociais do Conselho Federal da entidade, que opinou pela imediata retirada da matéria para que haja o devido debate da matéria pela sociedade.
Na manifestação da Comissão que examinou a matéria, relato este que foi encaminhado a Vaccarezza juntamente com o ofício, a entidade da advocacia considera extremamente exíguo o prazo para a apreciação de todos os artigos propostos, uma vez que o PL tramita em regime especial – havendo apenas um período de trinta dias para a apresentação de sugestões, a partir da publicação da íntegra do projeto no Diário Oficial, o que ocorreu no dia 30 de outubro.
"A título ilustrativo, se tomássemos o tempo (absolutamente reduzido) de cinco minutos para a análise de cada artigo da Nova CLT, bem como o período de noventa minutos (também temerário, pela sua exigüidade) para a verificação de cada uma das mais de 200 normas jurídicas atingidas pela alteração, teríamos, ao final, um total de mais de 446, ou seja, quase dois meses de trabalho (considerando-se os limites previstos no art. 7º, inciso XIII, da Constituição Federal)", afirma a Comissão que examinou a matéria no âmbito da OAB.
A OAB lembra que a matéria é de altíssima relevância, devendo ser votada somente depois de ouvidas, em amplo debate, a sociedade e entidades diretamente envolvidas no tema, como a Anamatra, Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho -ANPT, a Associação Brasileira dos Advogados Trabalhistas -Abrat, além da OAB. "Ora, o debate jurídico e político de uma proposta desta envergadura não pode ser feito de afogadilho", atesta a Comissão, lembrando que para a reforma do Código Civil foram empregados mais de vinte anos nos debates entre juristas, Parlamento e a sociedade. "A idéia de alterar a CLT, com a possibilidade de manifestação de atores sociais no prazo de trinta dias, beira as raias, até, do preconceito para com o Direito do Trabalho: as questões do mundo do trabalho seriam simples; não demandariam grande elaboração/avaliação teórica..."
Diante do prazo exíguo para a apresentação de sugestões e por considerar a matéria de alta relevância, a OAB pediu que o parlamentar retire a matéria para que haja o debate esperado e necessário.
A seguir a íntegra da manifestação feita pela Comissão Nacional de Direitos Sociais, que balizou o ofício encaminhado ao deputado Vaccarezza pelo presidente nacional da OAB, Cezar Britto:
Processo nº 2007.19.05891-01 e 2007.18.06290-01
Comissão Nacional de Direitos Sociais
Origem: Assessoria Parlamentar do Conselho Federal da OAB
Assunto: Projeto de Lei nº 1.987, de 2007. Consolida os dispositivos normativos que especifica, referente ao Direito Material Trabalhista, e revoga as leis extravagantes que especifica e os artigos 1º ao 642 da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT.
Relator: Renato Kliemann Paese
Presidência: Roberto de Figueiredo Caldas
RELATÓRIO
1.- Trata o presente da análise do PL 1987/2007, conhecido como “Nova CLT”, de autoria do Deputado Federal Cândido Vaccarezza (PT/SP), no qual, em síntese, alteram-se os artigos 1º a 642 da CLT, institui-se um Código do Trabalho de mil, seiscentos e oitenta e sete artigos e revogam-se, total ou parcialmente, duzentas e quatro normas jurídicas.
O PL em questão tramita em regime especial, nos termos dos artigos 212 e 213 do Regimento Interno da Câmara dos Deputados, no qual resta estabelecido um prazo de trinta dias, a partir da publicação do projeto no Diário Oficial (ocorrida em 30.10.2007), para sugestões.
Outrossim, o regime especial veda, ao Grupo de Trabalho de Consolidação das Leis e à Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania, alterações de mérito.
Por fim, determina o referido regime que o Relator deverá propor, <_st13a_personname productid="em seu Voto" w:st="on">em seu Voto, que as emendas consideradas de mérito, isolada ou conjuntamente, sejam destacadas para fins de constituírem projeto autônomo, o qual terá a tramitação dos demais projetos de lei.
É o relatório, em síntese apertada.
PROPOSTA
2.- Conforme já referido, está-se diante de uma proposição legislativa de proporções consideráveis. Sob o pretexto de compilação de normas trabalhistas esparsas e atualização da CLT, institui-se, ao fim e ao cabo, uma Nova CLT ou Código do Trabalho, composto por número de dispositivos quase igual ao dobro da CLT em vigor, sem abordar, ainda, o Direito Processual Trabalhista.
As dimensões são grandiosas e as pretensões idem. Nas palavras do nobre Deputado Relator, ao justificar o Projeto:
“A importância desta Nova Consolidação das Leis Trabalhistas não reside apenas em tornar mais acessível à população o ordenamento jurídico ou ter sistematizado o regramento em pauta, mas significa, principalmente, a conquista de uma segurança jurídica libertadora e respeito ao Estado de Direito Democrático.
A Carta Magna que fundamentou a concepção original da CLT foi outorgada por Getulio Vargas, nossa Carta atual foi promulgada, redigida por representantes políticos eleitos por voto direto e gerada em uma atmosfera de redemocratização.
(...)
Com a promulgação da Nova CLT milhares de processos judiciais que se arrastam a anos baseados na incerteza sobre a eficácia ou validade de determinadas normas, poderão ser extintos por perda do objeto.
Várias determinações de caráter burocrático que impedem a efetiva liberdade sindical e de associação profissional, por exemplo, poderão ser extintas.
Com este projeto o Poder Legislativo retoma sua função e responsabilidade social de produtor de normas tendo a razão como guia e não a vontade legiferante sem causa.”
3.- Posto este quadro jurídico e político, entende-se que, neste momento, não caberia à Ordem dos Advogados do Brasil a discussão do conteúdo da proposta, mas sim, de método e procedimento.
Com efeito, seria uma temeridade querer, em prazo tão exíguo (trinta dias), tomar posição com relação às questões de fundo de um projeto que - repita-se - propõe uma Nova CLT com quase mil e setecentos artigos e revoga, no todo ou em parte, mais de duzentas normas jurídicas.
4.- A título ilustrativo, se tomássemos o tempo (absolutamente reduzido) de cinco minutos para a análise de cada artigo da Nova CLT, bem como o período de noventa minutos (também temerário, pela sua exigüidade) para a verificação de cada uma das mais de duzentas normas jurídicas atingidas pela alteração, teríamos, ao final, um total de mais de quatrocentas e quarenta e seis horas, ou seja, quase dois meses de trabalho (considerando-se os limites previstos no art. 7º, inciso XIII, da Constituição Federal).
Conclui-se, assim, ser inexeqüível proceder à análise do Projeto, com a profundidade que a matéria demanda, no exíguo prazo imposto pelo Legislativo.
5.- Ora, o debate jurídico e político de uma proposta desta envergadura não pode ser feito de afogadilho. Fazendo-se um paralelo, se para a reforma (parcial) do Código Civil foram empregados mais de vinte anos nos debates entre os juristas, parlamento e sociedade, a idéia de alterar a CLT, com a possibilidade de manifestação da atores sociais no prazo de trinta dias, beira as raias, até, do preconceito para com o Direito do Trabalho: as questões do mundo do trabalho seriam simples; não demandariam grande elaboração/avaliação teórica...
Afinal, a CLT é um patrimônio do Brasil !
6.- Portanto, afigura-se inaceitável que um projeto de um Código do Trabalho seja encaminhado sem a realização de um amplo debate com a sociedade civil, com as entidades sindicais representativas das categorias econômicas e profissionais, com a OAB, a Anamatra, a ANPT, a ABRAT e demais entidades ligadas ao Direito do Trabalho, requisito este irrealizável no prazo de trinta dias.
Aduza-se, ainda, o fato de que o Fórum Nacional do Trabalho, realizado no primeiro mandato do governo Lula, com participação de diversos segmentos do Mundo do Trabalho, concluiu, por consenso dos seus participantes, que primeiro deveria ser debatida e aprovada a Reforma Sindical para só depois se ingressar na análise da Reforma Trabalhista.
Neste sentido, eventuais alterações na legislação trabalhista, mesmo para adaptá-la nos tópicos já superados, só poderiam ser feitas depois de estabelecidas as novas prerrogativas negociais dos Sindicatos, bem como seu alcance.
7.- Além das questões de método e de procedimento, a proposta lançada tem recebido críticas de diversos segmentos da sociedade.
Efetivamente, o XXIX Congresso Nacional dos Advogados Trabalhistas, realizado em Recife/PE, de 31.10 a 03.11.07, decidiu, à unanimidade do plenário (composto de mais de setecentos operadores jurídicos trabalhistas), pela proposta de rejeição e arquivamento do projeto de lei.
Como aponta a manchete do jornal O Valor, de 20.11.2007, “Trabalhadores e empresários vêem riscos na proposta de reforma da CLT”.
A proposta, como se vê, não é, no mínimo, oportuna.
8.- Como se não bastasse, a Câmara dos Deputados sequer pôs à disposição da sociedade o material essencial para análise deste tipo de projeto, que seria uma tabela indicativa da origem de cada artigo da nova lei, também comparativa quanto aos textos normativos, contendo em uma coluna o (s) dispositivo (s) anterior (es) e na outra a nova redação.
Até a presente data, as informações obtidas pela assessoria parlamentar da OAB na Câmara são no sentido de que o parlamento ainda estaria elaborando tal material.
Entendemos fundamental a divulgação, previamente ao debate social de conteúdo, destas ferramentas de análise, sem o que se estará transferindo para a sociedade um ônus que não é seu, de dar transparência máxima aos atos legislativos, especialmente quando de tamanha envergadura, em todos os sentidos.
9.- Mesmo sendo temerário incidir na análise superficial deste projeto, inevitável destacar, desde já, claros equívocos em que incorre.
A título ilustrativo, refira-se o fato de o projeto contemplar regras que disciplinam muitas profissões, trazendo em seu bojo dispositivos que tratam dos seus conselhos, composições, eleições, enfim, matérias que - embora de importante regulamentação - fogem à concepção e ao conteúdo que se pretende de um Código do Trabalho.
Por todo o exposto, entendemos que a posição da Ordem dos Advogados do Brasil deva ser no sentido de defender a imediata retirada do PL 1987/2007 (Nova CLT), por inoportuno e inadequado, a fim de permitir à sociedade e aos operadores jurídicos do Mundo do Trabalho a possibilidade de um amplo debate nacional acerca da conveniência ou não de uma nova CLT, sempre tendo em consideração a perspectiva de defesa intransigente do Direito do Trabalho (especialmente das suas raízes e dos seus princípios informadores), do Estado Democrático de Direito, das garantias de Trabalho Digno e Justo e no combate das desigualdades sociais.
É o nosso entendimento, s.m.j.
Brasília, 22 de novembro de 2007.
RENATO KLIEMANN PAESE
Membro da Comissão Nacional de Direitos SociaisROBERTO DE FIGUEIREDO CALDAS
Presidente da Comissão Nacional de Direitos Sociais
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