Ministro Cristiano Zanin, do STF, votou contra a remoção de símbolos religiosos de locais de ampla visibilidade e atendimento ao público em órgãos públicos. Segundo S. Exa., relator do caso, a presença dos objetos não deslegitima a ação do administrador ou a imparcialidade do julgador.
O julgamento, com repercussão geral reconhecida, começou nesta sexta-feira, 15, no plenário virtual da Corte e deve ser concluído dia 26/11.
Até o momento, o ministro Flávio Dino acompanhou o relator.
O caso
O recurso teve origem em uma ação civil pública movida pelo MPF que pedia a retirada de crucifixos, imagens e outros símbolos religiosos de prédios públicos da União e do Estado de São Paulo. O MPF argumenta que a presença desses símbolos viola princípios constitucionais, como o caráter laico do Estado.
A ação foi julgada improcedente pelo juízo de primeiro grau e pelo TRF da 3ª região, que considerou que a presença dos símbolos religiosos é uma reafirmação da liberdade religiosa e do respeito a aspectos culturais da sociedade brasileira.
Contra esse entendimento, o MPF interpôs recurso extraordinário alegando ofensa a dispositivos da CF/88 sobre o tema (artigos 3°, inciso IV; 5°, caput e inciso VI; 19, inciso I; e 37). O recurso não foi admitido pela vice-presidência do TRF da 3ª região, razão pela qual foi interposto o ARE 1.249.095 no Supremo.
Voto do relator
Em seu voto, ministro Cristiano Zanin, relator do caso, destacou o papel histórico-cultural do cristianismo na formação da sociedade brasileira. Segundo ele, a presença de crucifixos e outros símbolos religiosos em espaços públicos reflete essa herança e não configura uma imposição de valores religiosos aos cidadãos, nem fere a laicidade do Estado.
“O Cristianismo — até então liderado pela Igreja Católica — esteve presente na formação da sociedade brasileira, registrando a presença jesuítica desde o episódio do descobrimento e, a partir daí, atuando na formação educacional e moral do povo que surgia.”
Em seguida, o ministro argumentou que a presença desses símbolos não deslegitima a atuação dos agentes públicos nem interfere na imparcialidade dos julgadores, uma vez que as decisões jurídicas não se fundamentam em elementos religiosos. Além disso, Zanin reforçou que os símbolos não constrangem os cidadãos a adotar uma crença, nem violam a liberdade de religião ou ausência dela.
“A presença de símbolos religiosos nos espaços públicos, ao contrário do que sustenta o recorrente, não deslegitima a ação do administrador ou a convicção imparcial do julgador — mesmo porque a fundamentação jurídica não se assenta em elementos divinos, ou seja, não impõe ‘[...] concepções filosóficas aos cidadãos’33; não constrange o crente a renunciar à sua fé; não retira a sua faculdade de autodeterminação e percepção mítico-simbólica; nem fere a sua liberdade de ter, não ter ou deixar de ter uma religião.”
Assim, ao não identificar violação aos dispositivos constitucionais apontados pelo MPF, o ministro Zanin negou provimento ao recurso extraordinário.
Por fim, o relator propôs a fixação da seguinte tese de repercussão geral:
“A presença de símbolos religiosos em prédios públicos, pertencentes a qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, desde que tenha o objetivo de manifestar a tradição cultural da sociedade brasileira, não viola os princípios da não discriminação, da laicidade estatal e da impessoalidade."
Até o momento, o ministro Flávio Dino acompanhou o entendimento afirmando que “proibir a exposição de crucifixos em repartições públicas seria instituir um Estado que não apenas ignora, mas se opõe a suas próprias raízes culturais e à liberdade de crença, transformando o princípio de laicidade em um instrumento de repressão religiosa, em desacordo com os valores constitucionais brasileiros”.
- Processo: ARE 1.249.095
Leia o voto do relator, ministro Cristiano Zanin.
Leia o voto vogal do ministro Flávio Dino.