Técnico de enfermagem deverá ser reintegrado ao trabalho e receberá indenização de R$ 20 mil após ter sido dispensado de forma discriminatória. A decisão foi tomada pela 7ª turma do TRT da 3ª região, que, por maioria de votos, deu provimento ao recurso do trabalhador e modificou a sentença, que havia rejeitado os pedidos.
O técnico foi diagnosticado com transtornos psiquiátricos e ficou afastado por quatro dias após uma tentativa de suicídio por ingestão de medicamentos. Ele retornou ao trabalho, mas foi dispensado sem justa causa quatro dias depois. O prontuário médico anexado ao processo revelou que a tentativa de suicídio havia sido precedida por outra, ocorrida no mês anterior.
A instituição hospitalar, situada em Belo Horizonte, alegou motivos econômicos para a rescisão contratual. No entanto, ao examinar o recurso interposto pelo trabalhador, o juiz convocado Marcelo Oliveira da Silva, como relator, destacou que o hospital deveria ter apresentado prova de sua versão, o que não fez. Para o magistrado, a rescisão contratual, efetuada dias após a tentativa de suicídio e os diagnósticos psiquiátricos do trabalhador, caracteriza-se como discriminatória.
O entendimento se baseou na Súmula 443 do TST, que estabelece que "presume-se discriminatória a despedida de empregado portador do vírus HIV ou de outra doença grave que suscite estigma ou preconceito. Inválido o ato, o empregado tem direito à reintegração no emprego". Aplicando essa súmula, o relator registrou que os transtornos psiquiátricos do autor são doenças que geralmente causam estigma ou preconceito.
“A prova documental confirmou os fatos constitutivos do direito, e a dispensa realizada apenas quatro dias após o retorno do reclamante ao trabalho, aliada à presunção de veracidade preconizada na Súmula 443 do TST, evidencia a reação imediata da ré frente ao quadro clínico do empregado, sem comprovação da alegada motivação econômica”, registrou.
O relator considerou evidente a incapacidade do autor para o trabalho à época da rescisão contratual, mesmo que ele tenha sido considerado apto para trabalhar e não tenha sido recomendada uma licença superior a quatro dias. A sentença também registrou que a "tentativa de autoextermínio, pelo autor, por sobredose intencional de medicamentos, demonstra a gravidade de seu quadro psíquico".
Quanto à alegada incompatibilidade da função de técnico de enfermagem com a condição pessoal do autor e a necessidade de afastamento do local de trabalho, o julgador ressaltou que isso não autoriza a dispensa efetuada. “A proteção do reclamante, referida pela sentença, constitui dever da empregadora, mas não se resolve com a rescisão contratual após quatro dias de uma tentativa de autoextermínio”, pontuou.
A decisão estabeleceu que o correto seria o empregador encaminhar o empregado para a devida assistência e oferecer a readaptação de função. O juiz relator condenou a conduta do hospital, afirmando que "o tratamento discriminatório deflagrado com a dispensa, quando o autor mais necessitava de emprego, não o protege. Ao contrário, extrapola os limites de atuação do poder diretivo, em claro abuso de direito (artigo 187 do Código Civil), afronta a dignidade pessoal do trabalhador e viola os princípios fundamentais da valorização do trabalho e da função social da empresa, insculpidos na Carta Magna”.
A decisão também mencionou a lei 9.029/95, que proíbe práticas discriminatórias para efeitos admissionais ou de permanência na relação de trabalho. O julgador afirmou que o rol constante do artigo 1º não é taxativo e busca impedir a discriminação em todos os níveis.
A conclusão foi de que o autor foi dispensado devido às suas doenças, tornando o ato nulo de pleno direito.
Dessa forma, o voto condutor deu provimento ao recurso para determinar a reintegração ao emprego, em setor diverso daquele onde o trabalhador prestava serviços e em função compatível com seu quadro clínico. A instituição hospitalar foi condenada a pagar uma indenização por danos morais no valor de R$ 20 mil. O juiz convocado destacou que a ruptura contratual, na forma e no momento em que foi realizada, causou danos à esfera íntima do autor, gerando falta de remuneração e expectativa profissional futura, resultando em angústia e insegurança. A prova do prejuízo foi considerada desnecessária, pois o dano é in re ipsa, ou seja, identificado o prejuízo, torna-se dispensável a demonstração do abalo moral e/ou psíquico, que é presumido.
A maioria da turma acompanhou o entendimento. Um integrante da Turma considerou que o valor da indenização deveria ser menor, mas ficou vencido.
O número do processo foi omitido pelo tribunal.
Informações: TRT da 3ª região.