O dia 25 de julho, Dia Internacional da Mulher Negra, Latino Americana e Caribenha, não é uma data de celebração, mas um momento de reflexão e fortalecimento das organizações voltadas às mulheres negras no Brasil. A data foi instituída pela lei 12.987, como o Dia Nacional de Tereza de Benguela e da Mulher Negra, homenageando uma das principais mulheres, símbolo de resistência e importantíssima liderança na luta contra a escravização.
Apesar dos avanços na implementação de políticas públicas e novas leis para combater o preconceito racial, dados do Dieese - Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos apontam que a taxa de desocupação por raça e sexo no segundo trimestre de 2023 foi de 11,7% para mulheres negras contra apenas 7% para mulheres não negras. A pesquisa demonstra como a discriminação pode afetar o processo de contratação e o menor acesso das mulheres negras a redes de contatos profissionais.
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Outra pesquisa do Dieese ainda apresenta que mesmo quando empregadas, as mulheres negras frequentemente ganham menos que os homens brancos e mulheres brancas em posições equivalentes. Em 2022, o rendimento médio de uma mulher negra chegava a R$ 1,7 mil frente a R$ 2,7 mil de uma mulher branca e R$ 3,7 mil de um homem branco.
De acordo com a advogada Isabella Magalhães, do escritório LBS Advogadas e Advogados, “essa desigualdade salarial é um reflexo das disparidades sistêmicas presentes no mercado de trabalho e reflete em um menor poder de compra e possibilidade de crescimento profissional”.
Segundo a advogada, no ambiente de trabalho a situação também é preocupante, principalmente no que diz respeito ao preconceito racial. Entretanto, não é possível ter números específicos que demonstrem a quantidade de ações movidas por mulheres negras na Justiça do Trabalho, pois isso fere o art. 5º, inciso X, da Constituição Federal, que elege como bens invioláveis, sujeitos à indenização reparatória, a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas.
No entanto, a advogada explica que existe a possibilidade de considerar os números gerais de preconceito e injúria racial, sem levar em conta o gênero da vítima. Desde 2014, somente na Justiça do Trabalho, o número de ações relacionadas a preconceito e injúria racial, incluindo as encerradas e as ainda em andamento, totalizou 22.511 casos.
Cinco ações para denunciar
Denunciar o preconceito racial contra mulheres no ambiente de trabalho é um passo crucial para promover mais igualdade e Justiça social. A advogada explica que antes de fazer a denúncia é preciso tomar algumas precauções.
“Primeiro, é essencial verificar se há um ambiente seguro para realizar a denúncia. Idealmente, todas as empresas deveriam comprometer-se a fornecer treinamento adequado aos funcionários de Recursos Humanos e às ouvidorias, capacitando-os para receber e tratar denúncias dessa natureza. Caso haja segurança para proceder, recomenda-se buscar o departamento de RH ou a ouvidoria para relatar o ocorrido de maneira formal.”
Assim, a advogada elencou cinco ações que podem ser tomadas por funcionários para realizar a denúncia. Confira:
1. Documentar incidentes de discriminação
Registre detalhadamente todos os incidentes de preconceito racial, incluindo datas, horários, locais, envolvidos e qualquer evidência disponível, como e-mails, mensagens ou testemunhas. Ter um registro claro e detalhado ajuda a construir um caso sólido.
2. Informar Recursos Humanos ou a Gerência:
Leve as denúncias ao departamento de Recursos Humanos ou diretamente à gerência. Utilize os canais internos da empresa, como políticas de denúncia de assédio e discriminação. Se possível, peça uma reunião formal para discutir as suas preocupações.
3. Procurar apoio jurídico
Consulte um advogado especializado em direitos trabalhistas ou discriminação para entender melhor seus direitos e as possíveis ações legais. O apoio jurídico pode fornecer orientação sobre como proceder com a denúncia e garantir que seus direitos sejam protegidos.
4. Utilizar organizações e redes de apoio
Entre em contato com organizações de defesa dos direitos das mulheres e das minorias raciais, como ONGs, sindicatos ou grupos comunitários. Essas organizações podem oferecer suporte, aconselhamento e, em alguns casos, representação legal.
5. Divulgar e sensibilizar
Se for seguro e apropriado, considere divulgar sua experiência em plataformas de mídia social ou blogs para sensibilizar o público sobre a discriminação racial. Participe de palestras, workshops e seminários para educar outros sobre a importância de combater o racismo e a discriminação no local de trabalho.
Preconceito racial é crime?
Ademais, a advogada Isabella Magalhães explica que o preconceito racial no ambiente de trabalho é considerado como crime. “A legislação brasileira é bastante rigorosa em relação à discriminação racial, e diversas normas estabelecem a ilegalidade e as penalidades para atos de racismo e discriminação racial”, afirma.
Saiba de algumas dessas normas:
- Constituição Federal de 1988: O art. 5º, inciso XLI, estabelece que a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais.
- Lei 7.716/89 (lei Caó): Define os crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor. Esta lei especifica diversas condutas consideradas discriminatórias e estabelece penas que incluem reclusão e multa.
- Código Penal Brasileiro: O art. 140, parágrafo 3º, trata da injúria racial, que ocorre quando alguém ofende a dignidade ou o decoro de outra pessoa utilizando elementos referentes à raça, cor, etnia, religião ou origem.
- Lei 9.029/95: Proíbe a adoção de qualquer prática discriminatória e limitativa para efeito de acesso a relação de emprego ou a sua manutenção por motivo de sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar ou idade.
Quais são as penas previstas?
- Sanções penais: As penas para crimes de discriminação racial podem incluir reclusão, variando de um a três anos, além de multas.
- Sanções administrativas: Empresas e empregadores podem ser multados e sofrer outras penalidades impostas por órgãos de fiscalização do trabalho.
- Ações civis: As vítimas de discriminação racial podem mover ações civis por danos morais e materiais.
Nesse sentido, a advogada ressaltou não haver previsão específica para o crime de racismo na CLT, mas explica que a ação trabalhista pode alegar dano moral por discriminação ou injúria em razão da cor. Segundo ela, a legislação, deve ser considerada como discriminatória qualquer atitude ou tratamento dado à pessoa ou a grupos minoritários que cause constrangimento, humilhação, vergonha, medo ou exposição indevida, e que usualmente não se dispensaria a outros grupos em razão da cor, etnia, religião ou procedência.