As investigações da PF envolvendo o deputado Federal Alexandre Ramagem revelam que a estrutura da Abin - Agência Brasileira de Inteligência foi usada para monitorar a promotora responsável pela investigação do assassinato da vereadora do Rio de Janeiro Marielle Franco, além de outras autoridades. Os crimes teriam ocorrido no durante o governo de Jair Bolsonaro, quando Ramagem foi diretor da Abin. Marielle foi morta em março de 2018.
Ontem, a PF realizou buscas e apreensões contra Ramagem e outros investigados. Agentes estiveram no gabinete do parlamentar na Câmara dos Deputados e nas residências dele em Brasília e no Rio de Janeiro. A operação foi autorizada pelo ministro Alexandre de Moraes, do STF, relator das investigações na Corte.
De acordo com a decisão de Moraes que embasou as buscas, Ramagem, policiais e delegados da PF que estavam cedidos para a Abin, além de servidores do órgão, teriam participado de uma organização criminosa para monitorar ilegalmente autoridades públicas. O caso é conhecido como "Abin paralela".
O monitoramento ilegal ocorria, segundo as investigações, por meio do uso do programa espião First Mile. Produzido por uma empresa israelense de defesa cibernética, o equipamento permite monitorar os passos dos alvos escolhidos por meio da localização do celular. O software foi comprado no governo Michel Temer.
Segundo os investigadores, foi monitorada a promotora do Ministério Público do Rio de Janeiro Simone Sibilio, que atuou na investigação inicial do caso Marielle.
“A CGU identificou no servidor de impressão resumo do currículo da Promotora de Justiça do Rio de Janeiro coordenadora da força-tarefa sobre os homicídios qualificados perpetrados em desfavor da vereadora MARIELLE FRANCO e o motorista que lhe acompanhava ANDERSON GOMES. O documento tem a mesma ausência de identidade visual nos moldes dos Relatórios apócrifos da estrutura paralela”, diz trecho da decisão de Moraes.
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A Polícia Federal indica, também, que os investigados utilizaram a ferramenta First Mile para monitoramento do então presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, da então deputada Federal Joice Hassselman e de Roberto Bertholdo.
“A representação em exame fala também no monitoramento injustificado pelo First Mile do advogado Roberto Bertholdo, que teria proximidade com os ex-deputados federais Joice Hasselmann e Rodrigo Garcia, à época tidos como adversários políticos do governo. (...) Foi possível observar que a estrutura paralela instalada na ABIN monitorou o 'proprietário' da Pajero Full PAS 5756 tão somente em razão de determinado encontro (jantar) em que estavam presentes o Presidente da Câmara dos Deputados - Deputado Federal RODRIGO MAIA, Deputada Federal JOICE HASSELMANN e advogado ANTÔNIO RUEDA (f. 211), tendo comparecido ao evento o Del. ANDERSON TORRES, mas tendo sido propositalmente omitida a sua presença.”
Outro monitorado foi o atual ministro da Educação, Camilo Santana.
"A ausência dos artefatos motivadores, nos termos anotados no arquivo 'Defesa Prévia - PM.docx', resultou inclusive na solicitação de inclusão na condição de investigados no Processo Administrativo Disciplinar dos altos gestores da ABIN: Del. CARLOS AFONSO e Dei. ALEXANDRE RAMAGEM e Ofc. FRANK MARCIO justamente em razão da falta dos artefatos motivadores da ação de inteligência posto que a ação de monitorar o então Governador do Ceará CAMILO SANTANA com drones que, não seria uma operação de inteligência dada a ausência dos artefatos, mas uma 'simples ação de inteligência de acompanhamento'."
Ministros do STF
O grupo também teria atuado para difundir informações falsas e vincular os ministros do STF Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes a uma facção criminosa. As suspeitas estão em um arquivo eletrônico apreendido na primeira fase da operação, realizada no ano passado.
"O arquivo 'prévia Nmni.docx’ mostra a distorção, para fins políticos, da providência, indicando a pretensão última de relacionar a advogada Nicole Fabre e os ministros do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes com a organização criminosa Primeiro Comando da Capital – PCC, alimentando a difusão de fake news contra os magistrados da Suprema Corte.”
Interferência
As investigações também indicam que a Abin teria sido usada para interferir em investigações envolvendo os filhos de Bolsonaro, Jair Renan e o senador Flávio Bolsonaro. Ramagem e os outros acusados também teriam atuado para abafar as investigações internas sobre o uso ilegal do órgão.
"A alta gestão interferiu nas apurações disciplinares para que não fosse divulgada a instrumentalização da Abin", completou o relatório.