O STF analisará, no próximo dia 8, três ADIns que contestam a terceira fase de distribuição das vagas de sobras eleitorais. Migalhas conversou com especialista em Direito Eleitoral que explicou como funciona a repartição das sobras no sistema brasileiro e quais os possíveis efeitos da futura decisão do STF nos mandatos de deputados Federais.
Atualmente, o Código Eleitoral estabelece que, para participarem da distribuição de sobras eleitorais, os partidos devem alcançar pelo menos 80% do quociente eleitoral e apresentar um candidato com, no mínimo, 20% da votação nominal.
As legendas Rede Sustentabilidade, PSB, Podemos e PP apresentaram ações no STF buscando incluir todos os partidos que participaram das eleições nessas vagas, independentemente do cumprimento do quociente.
Até o momento, votaram, no plenário virtual, o relator, Ricardo Lewandowski (atualmente aposentado), e os ministros Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes, favoravelmente à tese de que todos os candidatos tenham direito a participar da distribuição das sobras, independentemente de atingirem as exigências dos 80% e 20% do quociente eleitoral.
No dia 8 de fevereiro o julgamento retornará, no plenário físico, com o voto do ministro André Mendonça, que havia pedido vista.
O que são sobras eleitorais?
O advogado especialista em Direito Eleitoral, Francisco Almeida Prado, do escritório Almeida Prado Advogados, explica que são três as fases para se chegar às sobras eleitorais.
Na primeira, encontra-se o quociente eleitoral. É feita a divisão do total de votos válidos pelo número total de vagas em disputa. Por exemplo, se existirem 100 mil votos válidos para 10 vagas, o quociente será de 10 mil votos. Assim, todos os partidos que obtiveram 10 mil votos terão direito a uma vaga, no mínimo.
Mas quais serão os deputados que preencherão essas vagas? Francisco explica que, ainda na primeira fase, utiliza-se outro requisito que é o chamamento dos candidatos por ordem de votação dentro do partido. Para que ele possa assumir a vaga, é necessário que tenha obtido, pessoalmente, ao menos 10% do quociente eleitoral.
Por exemplo, se o quociente eleitoral for de 10 mil votos, não é possível chamar um candidato que tenha, individualmente, obtido menos de mil votos.
Após essa primeira fase, a sobra de vagas inaugura, uma segunda fase, na qual há a convocação de partidos que fizeram ao menos 80% do quociente eleitoral.
Ou seja, se na primeira fase foram chamados os partidos que fizeram, por exemplo, 10 mil votos, na segunda serão chamados aqueles que obtiveram 8 mil votos e, dentro deles, os candidatos que tenham feito pelo menos 20% do quociente eleitoral, ou seja, ao menos 2 mil votos.
Ultrapassada a segunda fase e havendo vagas remanescente, passa-se à terceira fase - a questionada pelos partidos.
Nela, são chamados os partidos que apresentam as maiores médias. Entretanto, resolução do TSE determinou que a maior média só deve ser calculada entre partidos que tenham obtido ao menos 80% do quociente eleitoral, ou seja, no exemplo dado, os 8 mil votos.
Efeitos da interpretação do TSE
Francisco Almeida Prado avalia que, na prática, há uma restrição aos partidos menores que não alcançam o mínimo de 80% do quociente eleitoral.
O advogado aponta que até 2017 o cenário era ainda mais restrito, pois apenas os partidos que tivessem atingido o quociente eleitoral podiam participar das sobras.
Agora, ele aponta que é preciso definir, nas ações que estão no Supremo, se a cláusula de desempenho, feita via lei ordinária, é constitucional.
"Isso perpassa por todos os votos, isso é uma lógica que está muito presente no voto do ministro Lewandowski. E o voto do ministro Alexandre de Moraes enfrenta especificamente a questão da cláusula de desempenho. O ministro se mostra favorável à existência de uma cláusula de desempenho, mas diz que esta restrição específica, dentro do cenário em que ela foi aprovada - então ele analisa o cenário, analisa as consequências práticas - seria inconstitucional por ser uma interferência indevida no processo eleitoral."
Desde 2022, ou a partir de 2024?
Apesar da concordância dos ministros quanto à participação de todos os partidos, independente do quocioente, S. Exas. divergem quanto ao momento da produção de efeitos dessa decisão.
Lewandowski ponderou que, caso a Corte siga seu entendimento, a decisão não deve ter efeito imediato.
S. Exa. ressaltou que a CF estabelece que uma lei que altere o processo eleitoral deve entrar em vigor na data de sua publicação, mas não se aplica à eleição que ocorra em até um ano da data de sua vigência, conforme o princípio da anualidade eleitoral.
Diante disso, o relator votou para atribuir o efeito ex nunc à decisão, para que surtisse efeitos a partir do pleito de 2024.
Ministro Alexandre de Moraes acompanhou o relator, mas divergiu quanto à modulação dos efeitos da decisão. Para S. Exa., o entendimento deveria ser aplicado às eleições de 2022. No mesmo sentido, votou ministro Gilmar Mendes.
O advogado Francisco Almeida Prado avalia que, caso os efeitos valham para a eleição de 2022, poderá haver mudança de composição nas assembleias legislativas dos diversos Estados e na Câmara.
Na hipótese de efeitos ex tunc, disse o advogado, haverá uma redistribuição dos votos conforme o novo critério, e alguns deputados Federais perderão o mandato em proveito de outros.
Veja a entrevista completa: