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União indenizará viúva de Jango por perseguição política na ditadura

Para magistrado, consequências do regime de exceção da ditadura militar refletiram na vida de todos os familiares de João Goulart, impedindo o exercício da plena cidadania.

10/1/2024

A União deverá pagar indenização por danos morais à Maria Thereza Fontella Goulart, viúva do ex-presidente da República João Goulart, por perseguição política e exílio sofridos por ela e seus filhos durante o regime militar.

Segundo o juiz Federal substituto Bruno Risch Fagundes de Oliveira, da  4ª vara Federal de Porto Alegre/RS, a viúva foi injustamente privada do exercício de sua cidadania, pois a vigilância ostensiva mantida sobre Jango refletiu diretamente em sua família.

A ex-primeira-dama ingressou com a ação narrando que o esposo tinha uma carreira bem-sucedida no ramo agropecuário e também na política, tendo sido deputado Federal, ministro do Trabalho de Getúlio Vargas, vice-presidente eleito nos governos de Juscelino Kubitschek e de Jânio Quadros.

Contou que, em 1961, com a renúncia deste último, Jango assumiu a Presidência e foi deposto, em 1964, com o golpe de Estado promovido pelas Forças Armadas. Pontuou que, nesta época, seus filhos tinham seis e oito anos e que, em 1º/4/64, foram retirados às pressas da Granja do Torto e embarcados em avião da Força Aérea para Porto Alegre/RS, com bagagem mínima, deixando a maioria de seus pertences para trás. 

Maria Thereza Goulart disse que precisou fugir com os filhos após a instauração da ditadura militar no Brasil.(Imagem: Folhapress/Folhapress)

Segundo ela, seu patrimônio, que incluía joias e roupas de marca, não foi mais rastreado, tendo sido saqueado logo após sua saída de Brasília/DF. O rebanho de gado de suas fazendas também foi roubado, além de seus ativos pessoais.

A viúva ainda relatou que foram obrigados a sair do Brasil, indo buscar exílio no Uruguai, onde viveram até 1973, quando um golpe de Estado também foi realizado no país. 

A família foi, então, para a Argentina, mas, em 1975, iniciaram as atividades da Operação Condor e, no ano seguinte, um novo golpe de Estado instaurou-se naquele país. 

Ela afirmou que as tensões aumentaram com a descoberta de um plano para sequestrar seus filhos, assim eles foram enviados para Londres, onde seu neto nasceu. Ela destacou o período de dificuldades, incertezas e saudades, que se agravou com o falecimento de Jango.

Em sua defesa, a União ressaltou que a autora não sofreu prisões, torturas ou agressões pelo Estado e que ela já afirmou, em outras ocasiões, que a vida no exterior era confortável até a instalação dos regimes ditatoriais. Alegou ainda que a viúva, em entrevista para um telejornal, teria admitido que, mesmo no exílio, não sofrera grandes privações econômicas.

Direito de personalidade

Ao analisar o caso, o juiz Federal substituto Bruno Risch Fagundes de Oliveira pontuou que o dano moral decorrente do exílio por motivação exclusivamente política envolve injusta privação dos direitos da cidadania. 

Ele entendeu que a suspensão dos direitos políticos do então presidente destituído “transcendeu os limites de sua própria esfera de direitos, impactando diretamente sua esposa e mãe de seus dois filhos. O grupo familiar do ex-presidente, como um todo, teve de suportar os danos decorrentes de tal ato de exceção, que se iniciaram com a fuga do território nacional e tiveram desdobramentos ao longo de mais de uma década e meia de perseguição política, assim reconhecida no processo administrativo que tramitou na Comissão de Anistia do Ministério da Justiça”.

O magistrado destacou que a “documentação pública que integra o Arquivo Nacional demonstra que, mesmo fora dos limites do território nacional, o Estado brasileiro manteve, por meio de cooperação com outros países, controle e vigilância ostensiva sobre o ex-presidente João Goulart. No contexto fático ocorrido e historicamente reconhecido, tenho que o ilegítimo monitoramento do ex-Presidente durante todo o exílio, por motivação exclusivamente política, inexoravelmente se estendeu à sua esposa, pois indissociável a vigilância da vida privada de um e de outro”. 

Ele entendeu estar caracterizado o dano aos direitos da personalidade da autora e condenou a União ao pagamento de indenização de R$ 79.200,00. 

Informações: TRF da 4ª região.

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