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Gilmar adia debate de repasse de dados para investigar tráfico humano

O julgamento virtual discutia a constitucionalidade do repasse de dados cadastrais, por operadoras de celular, a delegados de Polícia e membros do Ministério Público, independentemente de autorização judicial, em investigações sobre tráfico de pessoas.

6/10/2023

O ministro Gilmar Mendes, do STF, pediu vista e interrompeu o julgamento virtual da ADIn 5.642, em que se discutia a constitucionalidade do repasse de dados cadastrais, por operadoras de celular, a delegados de Polícia e membros do Ministério Público, independentemente de autorização judicial, em investigações sobre tráfico de pessoas.

Antes disso, três ministros (Fachin, Moraes e Nunes Marques) votaram pela constitucionalidade da norma e dois ministros (Marco Aurélio e Rosa Weber – aposentados) contra.

Na ação, a Acel - Associação Nacional das Operadoras Celulares sustentou que os artigos 13-A e 13-B do CPP, inseridos pela lei 13.344/16, esvaziam a proteção constitucional à privacidade e ao sigilo das comunicações. Segundo a entidade, da forma em que foi redigida, a norma confere “verdadeira carta em branco” para que as autoridades possam acessar todos os dados de cidadãos tidos como suspeitos.

Gilmar Mendes pediu vista dos autos.(Imagem: Fellipe Sampaio/SCO/STF)

Voto do relator

Edson Fachin, relator, julgou improcedente a ação; ou seja, o ministro votou pela validade da previsão contida na lei 13.344/16.

Inicialmente, o ministro tratou de duas questões: comunicações e dados cadastrais. Fachin explicou que apenas a lei pode determinar as hipóteses de investigação criminal que autorizam, mediante ordem judicial, o afastamento do sigilo que se espera das comunicações.

"O sigilo é necessário porque ampara uma legítima expectativa de privacidade (...) As comunicações, em si mesmas, não podem ser interceptadas sem autorização judicial. Nada disso, porém, indica inconstitucionalidade no texto impugnado."

Do outro lado, estão os dados cadastrais. Segundo o relator, há precedentes no STF que assentam que os dados cadastrais de posse das empresas de telefonia também poderiam ser requisitados sem que se falasse de ofensa à privacidade.

Fachin citou o significado de "dados cadastrais" previsto na legislação brasileira, que são definidos como informações referentes a nome, endereço de assinante ou usuário registrado/autenticado.

Considerando essa definição, o relator entendeu que a lei impugnada não confere um amplo poder de requisição, mas um poder que é instrumentalmente necessário para reprimir as violações graves que atentam contra a liberdade pessoal e que se destinam a permitir o resgate das pessoas. Edson Fachin destacou que, na expressão "dados cadastrais" prevista na lei, não estão incluídas intercepção de comunicação ou de dados telemáticos.

Edson Fachin esclareceu o alcance da expressão "dados cadastrais" dizendo que não estão abrangidas nela a interceptação de voz, interceptação telemática, os dados cadastrais de usuário de IP, os serviços de agenda virtual ofertado por empresa de telefonia, o dado cadastral de e-mail. "Para esses dados, remanesce a saudável e necessária autorização judicial".

Nesse sentido, o relator salientou que a doutrina brasileira tem sustentado que sem a restrição de quais aparelhos podem ser usados, sem a indicação dos dados a serem mapeados, sem a determinação da intensidade, profundidade, continuidade e da duração da requisição, o mero recurso à expressão "dados cadastrais" é insuficiente para promoção da privacidade da era digital.

Por fim, o ministro concluiu pela constitucionalidade da lei.

Fachin foi acompanhado por Alexandre de Moraes e Nunes Marques.

Divergência

Para o ministro aposentado Marco Aurélio, a norma é inconstitucional porque dá ao MP e ao delegado de Polícia possibilidade vedada pela CF/88. Segundo o ministro explicou, a Constituição é categórica ao exigir a autorização judicial para o afastamento da privacidade.

Com relação ao art. 13-B, o ministro votou por conferir interpretação conforme a Constituição, para revelar harmônico com a CF o texto, desde que a autorização seja tomada como específica, ligada ao caso concreto. A cláusula atualmente assim dispõe:

"Art. 13-B. Se necessário à prevenção e à repressão dos crimes relacionados ao tráfico de pessoas, o membro do Ministério Público ou o delegado de Polícia poderão requisitar, mediante autorização judicial, às empresas prestadoras de serviço de telecomunicações e/ou telemática que disponibilizem imediatamente os meios técnicos adequados - como sinais, informações e outros - que permitam a localização da vítima ou dos suspeitos do delito em curso."

Ministra Rosa Weber, recém-aposentada, também divergiu do relator sob o fundamento de que o acesso a dados relativos à localização de indivíduos, sem autorização judicial, viola o direito à privacidade e à proteção de dados, pois tais elementos contêm informações consubstanciadoras das mais variadas escolhas políticas, ideológicas, culturais, profissionais, esportivas, e evidenciam, ainda, traços característicos da personalidade.

“Em suma, trazem elementos ínsitos ao âmbito estritamente pessoal, escondido de todos, inclusive daqueles mais próximos.”

Leia íntegra do voto do relator, de Rosa Weber e Nunes Marques.

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