A 3ª seção do STJ começou a analisar pedido de salvo-conduto para o cultivo doméstico de cannabis sativa com finalidade medicinal. Relator, ministro Messod Azulay Neto levou o caso à 3ª seção para que fosse pacificado o tema no âmbito das turmas de Direito Penal.
Apesar de a 5ª e 6ª turmas entenderem pela concessão de salvo-conduto, o relator propôs que isso não seja uma possibilidade. Isso porque, para ele, é "inadequado o Poder Judiciário, em sede de habeas corpus, possibilitar o manejo da planta em ambiente doméstico" e "não parece lógico que ante o alto custo de uma droga para tratamento, a resposta seja pedir ao Judiciário que conceda uma ordem para prática de ato ilícito".
Após o voto, o desembargador convocado Jesuíno Rissato pediu vista, suspendendo a análise.
No caso concreto, o paciente aponta constrangimento ilegal na negativa de autorização para cultivo de plantas cannabis sativa em sua residência para fins exclusivamente medicinais para crises de ansiedade e pânico.
Assim, requereu que seja expedido salvo conduto o autorizando a cultivar 23 plantas de cannabis em floração mensalmente em sua residência, não sendo incriminado pelos delitos previstos na lei de drogas, cabendo ao paciente atender os requisitos sanitários para a fabricação do seu medicamento.
Normativas
Na sessão desta quarta-feira, 9, o relator, ministro Messod Azulay Neto destacou que a definição do termo "drogas", contido no art. 33 da lei de drogas, é estabelecido pela portaria 344 da secretaria de vigilância sanitária do ministério de Saúde, e a cannabis sativa compõe a lista de plantas que, a partir do critério técnico, podem originar substâncias entorpecentes ou psicotrópicas.
Ainda salientou que a lei 11.343 disciplina o cultivo, transporte e extração do substrato da planta das quais possam ser extraídas ou produzidas drogas e prevê expressamente a possibilidade de a União autorizar o plantio e colheita exclusivamente para fins medicinais ou científicos, em local e prazo pré-determinado, mediante fiscalização e respeitadas as ressalvas legais.
"Não há direito subjetivo à autorização de cultivo da droga para fins medicinais, pelo contrário, a norma reservou atribuição à União, que a partir de regulação própria e análise de critérios técnicos, pode permitir o manejo dos vegetais com objetivos medicinais ou científicos."
O ministro ressaltou que a Anvisa autoriza, desde 2015, a importação de produtos cujo princípio ativo é o canabidiol, elemento excluído da lista de substâncias proibidas da portaria 344, e incluído no rol de substâncias controladas. E a partir de 2019 passou a permitir a venda de produtos à base de substâncias derivadas de cannabis em farmácia.
Ainda citou a RDC 327/19, que ao definir produto de cannabis, não inclui a permissão do uso da planta, ou parte da planta, mesmo após processo de estabilização e secagem ou na forma triturada.
"Além disso, a RDC 660/22, da Anvisa, norma que define os critérios e os procedimentos para a importação de produto derivado de cannabis, por pessoa física, para uso próprio, mediante prescrição de profissional legalmente habilitado, para tratamento de saúde estabelece que a importação pode-se se dar apenas mediante prescrição de profissional legalmente habilitado, para tratamento de saúde, bem como deve ser produzido e distribuído por estabelecimentos devidamente regularizados pelas autoridades competentes em seus países de origem para as atividades de produção, distribuição ou comercialização."
O ministro ainda citou a nota técnica 35/23, que proíbe a importação da cannabis in natura, bem como de flores e partes da planta. "De onde é que se compraria essa semente para plantio? De traficantes? Ou o Poder Judiciário forneceria?", indagou.
Ressaltou ainda que a constatação técnica de que inexistem evidências científicas que comprovem a segurança do uso da cannabis in natura, indica elemento central na discussão acerca da concessão de salvo conduto para cultivo da planta.
"A ausência de evidências, associadas ao fato de que a combustão e inalação de uma planta não são formas farmacêuticas de administração de produto destinado ao tratamento de saúde, permitem concluir que é, no mínimo, inadequado o Poder Judiciário, em sede de habeas corpus, possibilitar o manejo da planta em ambiente doméstico."
Por fim, disse que a maior parte dos pedidos que cegam ao Judiciário alegam o alto custo do medicamento, e concluiu: "não me parece lógico que ante o alto custo de uma droga para tratamento, a resposta seja pedir ao Judiciário que conceda uma ordem para prática de ato ilícito". Para o ministro, razoável seria o ingresso em juízo para que o Estado custeasse a medicação.
Assim, denegou a ordem em habeas corpus.
O desembargador convocado João Batista Moreira antecipou o voto acompanhando o relator. O ministro Jesuíno Rissato pediu vista.
- Processo: HC 802.866