O advogado Celso Machado Vendramini foi condenado a três anos de prestação de serviços à comunidade por comentários homofóbicos durante sessão do Tribunal do Júri. O causídico teria dito que é fã de Putin, que na Rússia não tem passeata gay e que é deste tipo de democracia que ele gosta. "Vai ser gay lá na Rússia para ver o que acontece", completou o advogado.
Na decisão, a juíza de Direito Cynthia Torres Cristofaro, da 23ª vara Criminal de São Paulo, ressaltou que não é possível que se considere normal submeter profissionais que estão no desempenho de suas funções e que jurados que são compelidos ao serviço pela força estatal, a ofensas como as praticadas pelo réu.
De acordo com a denúncia do MP/SP, Vendramini, em sessão do Tribunal do Júri, quando o parquet era representado pela promotora Claudia Mac Dowell, praticou discriminação e preconceito de raça, ao tecer uma série de comentários "imbuído de especial ânimo de segregação à orientação sexual e à identidade de gênero do grupo LGBTQIA+".
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O advogado defendia dois policiais militares pela execução de dois rapazes e, sem que houvesse qualquer relação com os fatos, começou a fazer colocações a respeito da população LGBTQIA+. Ele teria dito que foi uma estratégia de defesa por considerar os jurados conservadores.
Ele teria dito ofensas como: "O pessoal fala muito da Rússia, eu sô fã do Putin. Sou fã do Putin. Lá não tem boi, não. Lá não tem passeata gay, Rússia não. Vai ser gay lá na Rússia para ver o que acontece. Eu acho que a democracia da Rússia... é a democracia que eu gosto".
Segundo a promotora, a única ligação com o tema era ela própria, que é lésbica e desde que se casou começou a aparecer em eventos oficiais do Ministério Público apresentando-se como membro LGBT do parquet. O advogado teria comentado sobre a aliança da promotora durante sua fala.
Conduta criminosa
Ao analisar o caso, a magistrada ressaltou que o sentido das falas do advogado é claramente homofóbico. "Associou (e associa ainda, mesmo em suas manifestações no curso do processo, mesmo em seu interrogatório judicial) a homossexualidade ao perverso e ao pernicioso, ao desvirtuamento da família, à corrupção de crianças, ao desrespeito a símbolos religiosos", ressaltou.
A magistrada ainda disse que o advogado faz isso ao mesmo tempo em que faz afirmações de respeito do tipo "não tenho nada contra", as quais, no entanto, sua fala como todo desmente.
"Confunde performances artísticas com pornografia, estabelece generalizações indevidas, silogismos defeituosos. Essa conduta do réu não é permitida. Mais: é criminosa. Trata-se de discurso de ódio. A tipicidade do crime de homofobia é constitucional. É dada pela previsão constitucional dos direitos fundamentais da pessoa humana como bem jurídico protegido. E não cabe exceção pela imunidade profissional."
Para a juíza, "pouco importa" se a conduta do acusado foi animada por estratégia de defesa que concebeu ou por simples verborragia ou por qualquer outra motivação.
"O réu desfiou falas preconceituosas e ofensivas a pessoas integrantes do grupo LGBTQIA+ e principalmente a pessoas homossexuais, usando de generalizações e associações francamente negativas."
No entanto, a magistrada disse ter dúvida se as falas foram direcionadas para a promotora, pois não se dispondo da imagem do julgamento, apenas do aúdio, não há como se contar com percepção maior quanto à postura corporal do réu em relação à vítima.
"Se não há dúvida de que as falas do réu foram racistas homofóbicas, há quanto a terem sido dirigidas, para além da ofensa genérica ao grupo de pessoas LGBT+ , a ofender mais direta e especificamente a vítima, promotora do caso que estava em julgamento. Nem uma coisa nem outra eram permitidas ao advogado, não tendo a imunidade processual o sentido pretendido de estabelecer essa espécie estranha de autorização para o cometimento de crimes."
Tribunal do Júri
Sobre o Júri, a magistrada salientou que a amplitude da defesa não estabelece liberdade para o cometimento de crimes, nem exime o profissional de atuar com lealdade e boa-fé na discussão da causa.
"O plenário do Júri não é terra de ninguém, onde tudo é permitido. É preciso manter um mínimo de compostura, é preciso respeitar limites que se colocam pelo confronto entre direitos, não sendo nenhum deles absoluto."
Assim, condenou o advogado às penas de três anos de reclusão, em regime inicial aberto, substituída por prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas pelo mesmo período de três anos.
- Processo: 1505389-38.2020.8.26.0050
Veja a decisão.