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Juíza cita fábula e nega suspeição por despacho célere e “cedo demais”

Magistrada contou a história do velho, o menino e o burro, que eram criticados independentemente de sua conduta.

28/7/2023

Uma curiosa fábula de Esopo conta a história de um velho que foi com seu neto à cidade para vender um burro, e, a cada pessoa que encontravam pelo caminho, eram criticados por um motivo diferente: quando o velho montava no burro e o menino caminhava, eram acusados de explorar o garoto; quando o menino ia montado no burro, eram censurados por falta de respeito ao idoso; e quando ambos decidiram caminhar ao lado do burro, foram ridicularizados por não aproveitar sua utilidade. A crônica mostra que é impossível agradar a todos.

Foi com esta história que a juíza de Direito Carla Carneiro Teixeira Ceará, da 15ª vara de Relações de Consumo da Comarca de Salvador/BA, iniciou decisão na qual negou exceção de suspeição impetrada pelo réu contra ela.

Juíza cita fábula em decisão e nega sua suspeição.(Imagem: Arte Migalhas)

As alegações da parte foram, em resumo, que i) houve contradição entre reconhecimento inicial de conexão entre ACPs, e a posterior declaração de inexistência de conexão entre a segunda ação e o cumprimento de sentença oriundo da primeira; ii) a primeira ação foi julgada em 9 meses, apesar de sua complexidade; e iii) o despacho foi proferido às 5:58 da manhã.

Ao decidir, a magistrada destacou que não há, nas alegações, a presença de quaisquer das hipóteses previstas no art. 145 do CPC que indiquem suspeição. “Não nutre esta Magistrada qualquer sentimento de raiva, ódio, ou mesmo amizade, em relação a qualquer das partes, ou, ainda, interesse no julgamento do processo em favor de um ou outro litigante."

Mas a juíza diz que, por amor ao debate, e para realçar sua imparcialidade, optou por tecer algumas considerações.

Negativa fundamentada

Assim, esclareceu a questão da competência: explicou que, inicialmente, foi reconhecida a conexão porque ambas as ações tratavam de contratos RMC firmados com consumidores. Mas, em momento posterior, ela percebeu que a causa de pedir envolvia relações jurídicas diversas: enquanto a primeira se baseava na abusividade dos contratos, lançando mão de institutos consumeristas, a segunda tratava de nulidade de decretos administrativos por violação à livre concorrência – devendo esta ser distribuída a uma vara da Fazenda Pública, o que só teria sido possível perceber após maior contato com os autos.

Quanto à alegação de que o julgamento foi célere, e que a decisão foi proferida “fora do expediente forense”, a magistrada destaca que a parte se contradiz, pois, ao mesmo tempo em que quer que o juízo profira julgamentos imediatos e imutáveis, também se levanta contra processos que durem menos de um ano e contra os juízes que trabalham mais do que o horário a que estão obrigados, para dar vazão à grande demanda a que são submetidos.

"Trata-se de exemplo claro do que queria demonstrar Esopo com a famosa fábula 'O velho, o menino e o burro', colacionada no início dessa peça: o juiz é criticado se os processos demoram demais, mas também se demoram de menos; o juiz é criticado se não trabalha além de seu horário, mas também se trabalha além do seu horário."

A magistrada citou vários processos nos quais despachou pela manhã, "não tendo, ao contrário do que foi sugerido pelo excipiente, agido de maneira especial para favorecer a parte contrária".

Para a juíza, "os elementos constantes da exceção configuram mera insatisfação da parte com a decisão atacada, não servindo de base a demonstrar suspeição desta magistrada".

A suspeição não foi reconhecida, e a juíza determinou o encaminhamento dos autos ao Tribunal de Justiça da Bahia para os devidos fins, pugnando pelo julgamento improcedente do pedido.

Leia a decisão.

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