Em parecer enviado ao STJ, MPF defende que seja restabelecida a decisão do Tribunal do Júri que condenou quatro réus pela prática de 242 homicídios e de 636 crimes de tentativas de homicídios que ocorreram na Boate Kiss, em Santa Maria/RS.
Para Raquel Dodge, subprocuradora-geral da República que assinou o parecer, a decisão do TJ/RS violou dispositivos do CPP. Isso porque, segundo ela, invalidou o julgamento com base em provas apontadas pela defesa fora do prazo definido em lei e sem especificar os prejuízos causados aos réus.
Na avaliação de Dogde, a falta de contestação no momento adequado levou à chamada preclusão temporal, que consiste na perda do direito da defesa de se manifestar no processo. Por esse motivo, em seu entendimento, o Tribunal sequer deveria ter analisado os pedidos dos réus, que contrariaram as normas processuais.
No acórdão contestado, o TJ/RS acolheu recursos dos réus, que questionaram procedimento adotado para o sorteio dos jurados, assim como a realização de uma reunião reservada entre o juiz-presidente do Tribunal do Júri e o conselho de sentença do TJ/RS, sem a presença do MP, tampouco da defesa.
Segundo consta nos autos, houve três sorteios para a escolha dos jurados titulares e suplentes, sendo que as contestações foram apresentadas na véspera do último sorteio e após a realização do procedimento, sem demonstrar os prejuízos aos réus. Além disso, de acordo com o parecer, o procedimento adotado no sorteio não violou o devido processo legal, nem foi determinante para a condenação aplicada.
Em relação à reunião reservada, o MPF sustenta que a defesa deveria ter contestado a prática no momento em que os jurados foram convocados, quando o juiz poderia ter suspendido o convite ou chamado o MP e a defesa para participarem do ato. “No entanto, a defesa preferiu silenciar, dando causa à preclusão, e somente suscitar referida nulidade após o desfecho condenatório desfavorável”, sustenta a subprocuradora.
No parecer, Dodge contesta ainda outros dois pontos utilizados pelo TJ/RS para anular o júri: o questionamento quanto à validade de quesitos usados para a condenação e a alegada inovação acusatória, em razão de argumentos apresentados pelo promotor durante réplica no julgamento de um dos acusados.
Em relação ao primeiro ponto, o MPF lembra que a legislação processual possibilita à defesa participação ativa na elaboração dos quesitos (perguntas) que serão respondidos pelos jurados e servirão de base para a condenação ou absolvição. Por esse motivo, o próprio CPP afasta a possibilidade de as partes questionarem posteriormente os quesitos estabelecidos, visto que elas deram o aval no momento da redação.
A subprocuradora-geral também afastou o argumento de “inovação acusatória”, por considerar que não houve prejuízo aos réus, visto que a defesa teve oportunidade de rebater os argumentos apresentados pelo promotor no momento da tréplica concedida durante o julgamento.
Para Dodge, nenhuma das falhas técnicas apresentadas pela defesa e acolhidas pelo TJ/RS comprometeu o contraditório, a ampla defesa ou o duplo grau de jurisdição e, por isso, não se justifica a anulação do júri.
Confira íntegra do parecer.
Informações: MPF.