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Casal que manteve empregada como “escrava” é condenado em R$ 800 mil

Juíza reconheceu o vínculo de emprego entre a idosa e o casal de janeiro de 1989 a julho de 2022 na função de empregada doméstica.

4/4/2023

O TRT da 2ª região condenou um casal que manteve, por mais de 30 anos, uma trabalhadora doméstica em condição análoga à escravidão. Eles terão que pagar um total de R$ 800 mil em salários atrasados, verbas a que a vítima tem direito pelo período que prestou serviços à família sem receber nenhum vencimento, verbas rescisórias, além de indenização por dano moral individual e coletivo. A decisão foi proferida na 30ª vara do Trabalho de SP pela juíza do Trabalho Maria Fernanda Zipinotti Duarte.

Segundo depoimento da vítima, ela foi procurada no abrigo em que morava para trabalhar como empregada doméstica na residência do casal e para cuidar do filho pequeno em troca de um salário-mínimo por mês. Mas nunca chegou a receber pagamento pelo trabalho, nem usufruiu de férias ou períodos de descanso. Entre suas obrigações estavam limpar a casa e servir as refeições para toda a família dentro de uma jornada que se iniciava às 6h e terminava além das 23h. 

"A depoente também fazia atividades de limpeza e manutenção da casa e também cozinhava quando era preciso; que quando as crianças estavam na escola, e quando havia outros empregados na casa, a reclamada pedia que a depoente fizesse algumas cobranças de clientes inadimplentes, indo na residência dos clientes; que a rotina da depoente era acordar por volta de 6h00 e, quando as crianças eram pequenas, levá-las para a escola; que também iniciava os cuidados com a casa e servia o café da manhã para as crianças e depois para os réus; que também cuidava da roupa; que a depoente servia o jantar dos patrões, que inicialmente era por volta de 19h00 e depois passou a ser por volta de 22h00/23h00; que somente descansava após servir o jantar."

A ação foi ajuizada pelo MPT com base em denúncia feita pelo Creas/Mooca - Centro de Referência Especializado de Assistência Social após pedido de ajuda feito pela idosa a outra entidade assistencial da Prefeitura de São Paulo. Uma primeira tentativa de receber auxílio ocorreu em 2014 na mesma instituição. Na ocasião, houve uma conversa com o casal e foi acordado que eles registrariam o vínculo de emprego da vítima e pagariam os créditos trabalhistas devidos, o que nunca foi cumprido. 

Casal terá que pagar R$ 800 mil por manter empregada doméstica em situação análoga à escravidão por mais de 30 anos.(Imagem: Freepik)

O casal se defendeu alegando que mantém laços familiares com a mulher e lhe proporcionaram ambiente familiar e acolhedor por anos. Sustentaram que a vítima dispunha de total liberdade de ir e vir, mas que por opção própria saía pouco de casa. Disseram que retiraram a doméstica de situação de rua, resgatando-lhe a dignidade e lhe garantindo afeto.

"A assistida sofreu inequívocos danos morais ante a exploração de seu labor por mais de 30 anos, sem a devida contraprestação, de modo a tolher sua plena liberdade - bem imprescindível e fundamental, intrinsecamente ligado a própria condição de humanidade."

Negaram o trabalho em condição análoga à escravidão, pois, de acordo com eles, a "presente ação é um exagero”. E que forneciam tudo o que ela precisava como casa, comida, roupas, calçados e dinheiro para cigarros e biscoitos.

“O labor em condição análoga à escravidão assume uma de suas faces mais cruéis quando se trata de trabalho doméstico. Por óbvio, a trabalhadora desprovida de salário por mais de 30 anos não possui plena liberdade de ir e vir. Não possui condições de romper a relação abusiva de exploração de seu trabalho, pois desprovida de condições mínimas de subsistência longe da residência dos empregadores, sem meios para determinar os rumos de sua própria vida”, ressalta a magistrada.

Na decisão, a juíza reconheceu o vínculo de emprego entre a idosa e o casal de janeiro de 1989 a julho de 2022 na função de empregada doméstica, com salário mensal de R$ 1.284 (salário-mínimo à época da rescisão). E determinou que os réus registrem a CTPS da empregada independentemente do trânsito em julgado da decisão, sob pena de multa diária de R$ 50 mil reversível à idosa. 

Veja a sentença

Informações: TRT da 2ª região.

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