A 3ª turma do STJ decidiu que o time mandante que não ofereceu segurança necessária para evitar tumultos na saída do estádio, deverá responder pelos danos causados, solidariamente, com a entidade organizadora da competição. O voto condutor foi do ministro Ricardo Villas Bôas Cueva.
No processo, torcedores corintianos relataram que, após o término de um jogo entre São Paulo e Corinthians no estádio do Morumbi, foram obrigados a aguardar a saída da torcida adversária. Enquanto estavam confinados, uma bomba caseira foi jogada de fora para dentro do estádio, provocando o tumulto que resultou em dezenas de feridos, entre eles os autores da ação. Além disso, a PM, que havia sido acionada para promover a segurança, disparou gás de efeito moral na tentativa de conter o tumulto, o que piorou a situação.
O juiz considerou improcedentes os pedidos de indenização por danos materiais e morais, mas o TJ/SP reformou a sentença e condenou o São Paulo Futebol Clube e a Federação Paulista de Futebol a indenizar os autores.
No recurso ao STJ, o São Paulo sustentou que foram cumpridas as medidas cabíveis de segurança e que a bomba caseira foi arremessada da parte externa do estádio; e que haveria culpa de terceiros, tanto de quem jogou a bomba quanto da polícia. A federação também recorreu para tentar afastar sua responsabilização, mas, nesse ponto, o apelo foi rejeitado.
Legislações disciplinam os direitos do torcedor
O relator do caso destacou que o artigo 13 do Estatuto do Torcedor (lei 10.671/03) garante aos torcedores o direito à segurança antes, durante e após os eventos esportivos.
Ao analisar o recurso do São Paulo, o ministro apontou que, conforme os artigos 14 e 19 do estatuto, o clube detentor do mando de jogo tem responsabilidade objetiva – e solidária com a entidade que organiza a competição – diante dos prejuízos causados aos torcedores por falhas de segurança.
O relator ressaltou que, em relação à responsabilidade, o Estatuto do Torcedor prevê a aplicação subsidiária do CDC, cujos artigos 12 a 14 tratam do vício grave que gera acidente de consumo, sendo a federação e o clube mandante equiparados, para esse efeito, à condição de fornecedores de serviço.
Analisar o caso concreto é indispensável
De acordo com o ministro, embora se reconheça que a responsabilidade é objetiva, "ligada ao fato e ao risco da atividade e desprendida da prova da culpa", a legislação aplicável não adota a teoria do risco integral, pela qual as entidades responderiam por todo e qualquer dano ocorrido nas imediações do estádio.
Afastada a teoria do risco integral, explicou o relator, é possível a isenção da responsabilidade se for demonstrada culpa exclusiva da vítima ou de terceiro, o que impõe o exame das particularidades do caso em julgamento para se verificar se realmente houve defeito da segurança e se a situação estava diretamente relacionada com a atividade desempenhada pelas entidades rés – conforme definiu a 3ª turma em precedente.
O ministro destacou que a falha na prestação de serviço teve início no tratamento incompatível com o exigido pela legislação, quando os torcedores do time visitante ficaram recolhidos por quase uma hora em local apertado, enquanto os torcedores da casa eram liberados.
Outro aspecto destacado foi a atuação da polícia, que, além de não ter sido capaz de conter o tumulto, agiu de forma a potencializá-lo. De acordo com seu entendimento, tal fato não exclui a responsabilidade do clube recorrente, que está ligada a fatos precedentes, como o confinamento e o arremesso da bomba por seus próprios apoiadores.
"O fato de a primeira bomba ter sido arremessada da parte externa do estádio não interfere no dever de indenizar", observou o relator, explicando que os danos ocorreram nas dependências da arena esportiva e que o fato está inserido no contexto do jogo e na rivalidade entre as torcidas. Além disso, a situação é reveladora de que "a fiscalização das redondezas também foi defeituosa, visto que havia torcedores munidos de artefatos explosivos".
- Processo: REsp 1.773.885