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Há 100 anos, eleição teve fake news e resultado questionado

Nos meses que antecederam a eleição de 1922, os adversários de Arthur Bernardes espalharam fake news e insuflaram o Exército contra ele. No fim, questionaram a vitória e tentaram impedir a posse.

8/7/2022

Há 100 anos, o mineiro Arthur Bernardes vencia uma das disputas presidenciais mais conturbadas da história. Nos meses que antecederam a eleição de 1922, os adversários do político espalharam fake news e insuflaram o Exército contra ele. No fim, questionaram a vitória e tentaram impedir a posse.

Os ataques começaram cinco meses antes da votação. Em outubro de 1921, o jornal carioca Correio da Manhã, opositor da candidatura de Bernardes, publicou duas cartas bombásticas atribuídas ao presidenciável.

Na primeira, o candidato chamou os militares de “essa canalha” e o marechal Hermes da Fonseca, ex-presidente da República, de “sargentão em compostura”. Um banquete oferecido a Hermes pelo Exército, que desejava a volta do marechal ao poder, foi classificado de “essa orgia”. Para Bernardes, os “generais anarquizadores” precisavam “de uma reprimenda para entrar na disciplina”.

Hermes acabou não concorrendo. Em seu lugar na disputa, entrou o senador Nilo Peçanha (RJ), também ex-presidente do Brasil, imediatamente transformado no candidato dos militares.

Na segunda carta, Bernardes se referiu a Nilo como “moleque capaz de tudo” e escreveu que não tinha medo das classes armadas.

Arthur Bernardes logo denunciou que as cartas haviam sido escritas por um falsário, o que de fato seria confirmado por exames grafotécnicos. Mesmo assim, conforme mostram documentos de 1921 e 1922 guardados hoje no Arquivo do Senado, em Brasília, as cartas falsas repercutiram no meio político e chacoalharam a campanha presidencial.

Correio da Manhã noticia suposta carta do presidenciável Arthur Bernardes ofensiva aos militares.(Imagem: Biblioteca Nacional Digital)

Depois do episódio das cartas falsas, os militares, que haviam ficado órfãos após a saída do marechal Hermes da corrida eleitoral, se jogaram de corpo e alma na campanha de Nilo e se puseram em definitivo contra Bernardes.

Os brasileiros foram às urnas em março de 1922. Bernardes foi eleito o 12º presidente do Brasil com 467 mil votos (60% do total). Nilo recebeu 318 mil (40%). Foi uma das eleições mais apertadas da Primeira República.

O grupo de Nilo não aceitou o resultado. Alegou que houve fraudes na votação. Isso não deixava de ser verdade, já que na época eram os próprios políticos que cuidavam das eleições. No entanto, as trapaças certamente ocorreram em ambos os lados. Ainda faltavam dez anos para a criação da Justiça Eleitoral.

O candidato derrotado e seus apoiadores civis e militares pediram a criação de um "tribunal de honra", formado por políticos e ministros do Supremo Tribunal Federal, para recontar os votos. A proposta não foi aceita.

Militares mais jovens, majoritariamente de baixa e média patente, se rebelaram em diferentes lugares do Brasil, mas foram reprimidos pelos oficiais fiéis ao governo. O marechal Hermes da Fonseca, que presidia o Clube Militar, foi preso por acobertar as insurreições. Deflagrava-se, assim, o movimento tenentista, que se estenderia por toda a década de 1920. O levante tenentista mais famoso foi a malograda Revolta dos 18 do Forte, no Rio de Janeiro, em julho de 1922, contra a posse de Bernardes.

Para que Arthur Bernardes conseguisse assumir o Palácio do Catete em novembro de 1922, o presidente Epitácio Pessoa decretou estado de sítio, período em que diversas garantias ficam suspensas, como o direito de reunião e a liberdade de imprensa.

Por causa da perseguição aos adversários políticos e da repressão ao movimento tenentista, a oposição dos jovens militares a Bernardes só recrudesceu. Por isso, o novo presidente governou praticamente todos os quatro anos de seu mandato sob estado de sítio.

Arthur Bernardes, presidente odiado por parte dos militares.(Imagem: Arquivo Público Mineiro)

100 anos depois e as fake news continuam em pauta

Um século se passou desde a história contada acima, entretanto, as fake news em torno das eleições continuam.

O tema já foi abordado por Migalhas em entrevistas. Relembre, a seguir, algumas delas:

No final do mês passado, o ministro Ricardo Lewandowski, do STF, em entrevista à TV Migalhas durante o X Fórum Jurídico de Lisboa, falou sobre as eleições de 2022 e fake news. S. Exa., que compõe a vaga de ministro efetivo do TSE, classificou o sistema judiciário eleitoral brasileiro como "uma máquina extremamente azeitada, funcional e eficiente".  

Lewandowski pontuou, ainda, que se pode temer uma certa turbulência política, todavia, isso não afetará a eleição, a apuração e a proclamação do resultado. Segundo o ministro, este ano não haverá novidade maior do que a já enfrentada anteriormente.

"As fake news foram um elemento nocivo no sentido de que impediu a livre manifestação de vontade dos eleitores. Estamos combatendo as fakes news dentro do possível e dentro da lei. (...) Creio que o eleitorado está maduro, o brasileiro vem votando, sobretudo através dos meios eletrônicos há muito tempo, não há problema nenhum."

Em evento anterior, no final de 2021, o ministro Alexandre de Moraes disse que o TSE deixou bem claro que não vai admitir que tenha a propagação em massa de fake news durante as eleições. O ministro estará na presidência do Tribunal Eleitoral neste ano.

"A Justiça eleitoral já está preparada, já sabemos como investigar e obter provas. Isso vai acarretar não só a cassação como também sanções penais."

Em 2020, enquanto exercia a presidência do TSE, ministro Luís Roberto Barroso também falou sobre as fake news. O ministro destacou que o Judiciário "não quer ser censor do debate público". Mas, se for preciso, a Justiça irá atrás, com os instrumentos legais possíveis, "dos profissionais da difusão da mentira".

Com informações do Arquivo S, do Senado Federal.

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