Nesta quinta-feira, 30, o Supremo invalidou lei que prevê o cancelamento de recursos destinados ao pagamento de precatórios e de RPV - Requisições de Pequeno Valor Federais. Por maioria, a Corte declarou a inconstitucionalidade material do dispositivo por concluir que a lei, ao deslocar a prévia ciência e o exercício do contraditório para momento posterior ao cancelamento automático, consagra procedimento que viola a Constituição.
A norma questionada determinava que valores depositados há mais de dois anos, e ainda não levantados pelo credor, poderiam ser diretamente transferidos pelas instituições financeiras para a conta única do Tesouro Nacional.
O caso
O PDT - Partido Democrático Trabalhista questionou, no STF, lei que determina o cancelamento dos precatórios cujos valores não tenham sido levantados pelos credores no prazo de dois anos e prever que essa providência seja tomada diretamente pelas instituições financeiras oficiais. No entendimento da legenda, a norma viola os princípios constitucionais da separação de Poderes, segurança jurídica, igualdade, inafastabilidade da jurisdição e o respeito à coisa julgada.
Narrou, ainda, que a lei vulnerava ainda a reserva constitucional para estabelecimento de condições de pagamento dos precatórios e a competência constitucionalmente confiada ao Poder Judiciário para a gestão do pagamento dos requisitórios.
De acordo com o PDT, ao delegar às instituições financeiras controladas pela União a atribuição de, independentemente de ordem judicial, cancelar qualquer precatório emitido há mais de dois anos e ainda não levantado pelo credor, a lei "passa por cima de clara norma" de competência estabelecida na CF/88.
Voto relator
Ao analisar o caso, a ministra Rosa Weber, relatora, asseverou que a lei questionada violou a CF/88, uma vez que fixou limite temporal para o exercício de direito de levantamento do crédito depositado.
"A lei, ao deslocar a prévia ciência e o exercício do contraditório para momento posterior ao cancelamento automático consagra procedimento que viola a Constituição."
Na visão de S. Exa.,a norma questionada transfere do Judiciário para a instituição financeira a averiguação unilateral do pagamento, bem como autoriza indevidamente o cancelamento automático do depósito com a remessa dos valores à conta única do Tesouro Nacional.
Nesse sentido, a relatora destou que a mera possibilidade de novo requerimento do credor não retira a inconstitucionalidade material. Concluiu, assim, que o dispositivo não observa os princípios do contraditório e da ampla defesa. "A norma configura verdadeira burla aos freios e contrapesos indispensáveis ao funcionamento dos Poderes", concluiu.
Por fim, a ministra votou pela inconstitucionalidade dos dispositivos impugnados. Os ministros Dias Toffoli, Alexandre de Moraes, Edson Fachin e Ricardo Lewandowski e a ministra Cármen Lúcia acompanharam a relatora.
Voto divergente
O ministro Gilmar Mendes divergiu da relatora ao entender que, no caso, o credor não será onerado ou prejudicado financeiramente. Ademais, asseverou não haver desproporcionalidade na imposição legislativa, pois a medida legal apresenta-se necessária para se evitar a perpetuação da desídia do beneficiário do crédito.
“Apesar de ocorrer atraso na quitação pelo Estado, o credor não ostenta qualquer violação ao seu patrimônio jurídico do direito adquirido, da coisa julgada ou do ato jurídico perfeito, muito menos do direito à propriedade.”
No entendimento do ministro, se a União ou seus órgãos descentralizados depositam em conta bancária os valores que lhe são cobrados e o credor se mantêm inerte, sem efetuar o saque no prazo de 2 anos, presume-se sua desídia. “A situação Constitucional atual acerca do ritmo de quitação dos precatórios Federais não deixa de ser uma espécie de alongamento do pagamento no que se denomina ‘postergação de adimplemento’", concluiu.
Nesse sentido, o ministro votou para determinar que o cancelamento da ordem de pagamentos, precatório ou RPV, somente ocorra após a obrigatória intimação do credor, pelo juízo da execução. Os ministros Luís Roberto Barroso, André Mendonça, Nunes Marques e Luix Fux seguiram a divergência.
- Processo: ADI 5.755