A 2ª Câmara de Direito Privado do TJ/SP, ao conceder tratamento a criança autista, afirmou ser irrelevante que as terapêuticas previstas não integrem o rol de procedimentos obrigatórios da ANS, pois tal listagem não é taxativa. “Ela apenas exemplifica o mínimo obrigatório a ser assegurado aos beneficiários de planos de saúde”, considerou o colegiado.
Segundo relatório médico, o autor é pessoa com transtorno do espectro autista, necessitando das seguintes terapias pelo método ABA, em caráter de urgência: (i) fonoterapia 2 horas semanais; (ii) psicoterapia no mínimo 3 horas semanais; e (iii) terapia ocupacional 1 vez por semana.
O plano de saúde, contudo, alegou que não negou as terapias, apenas as disponibilizou em clínica distante da residência do autor.
Para o juízo de primeiro grau, a cobertura distante da casa do paciente pode inviabilizar o sucesso do tratamento, “diante da notória dificuldade de locomoção em transportes públicos de crianças autistas, podendo tal situação, inclusive, ser equiparada à negativa de cobertura”.
Assim, determinou ao plano de saúde que disponibilize ao autor as terapias pleiteadas, conforme relatório médico, em clínica próxima de sua residência, no prazo de cinco dias, sob pena de multa diária de R$ 500.
Em agravo, a empresa alegou que há vedação contratual para a disponibilização do tratamento postulado, além da ausência do procedimento no rol da ANS.
O relator, João Baptista Galhardo Júnior, considerou que não há como se afastar a obrigação da empresa, ao menos por ora, em dar cobertura às terapias listadas pelo médico que acompanha o menor, pois, conforme entendimento sumulado do TJ/SP, “havendo expressa indicação médica, é abusiva a negativa de cobertura de custeio de tratamento sob o argumento da sua natureza experimental ou por não estar previsto no rol de procedimentos da ANS”.
“Existente prescrição médica indicando a necessidade dos tratamentos terapêuticos, deve a agravante disponibilizar tais serviços ao assistido, não havendo que limitar seu tratamento, necessário para a melhoria do paciente.”
Para o magistrado, é irrelevante que as terapêuticas previstas não integrem o rol de procedimentos obrigatórios da ANS, pois tal listagem não é taxativa. “Ela apenas exemplifica o mínimo obrigatório a ser assegurado aos beneficiários de planos de saúde”, ressaltou.
“Não se olvida, por fim, a possibilidade de reversão da medida deferida, sendo que, eventuais prejuízos suportados pela agravante serão de ordem exclusivamente patrimonial, motivo pelo qual, antecipar a tutela recursal, suspendendo, liminarmente a eficácia da decisão agravada seria atitude extremamente açodada deste relator.”
Assim, indeferiu a concessão de efeito suspensivo ao agravo.
O advogado Gustavo de Melo Sinzinger, do escritório Sinzinger Advocacia, atua na causa em favor do consumidor.
- Processo: 2087887-22.2022.8.26.0000
Veja a decisão.
Em debate no STJ
No dia 23/2, os ministros do STJ retomaram julgamento que analisa se o rol da ANS é taxativo ou exemplificativo para planos de saúde.
Relator, ministro Luís Felipe Salomão votou pela taxatividade da lista. No entanto, ressalvou hipóteses excepcionais em que seria possível obrigar uma operadora a cobrir procedimentos não previstos no rol.
Ministra Nancy Andrighi proferiu seu voto-vista no sentido de que o rol da ANS tem natureza meramente exemplificativa, "pois só dessa forma se concretiza a politica de saúde idealizada pela Constituição".
Após o voto, o ministro Villas Bôas Cueva sinalizou pedido de vista, tornando-se vista coletiva, e suspendendo o julgamento.
Em entrevista à TV Migalhas concedida em março, a advogada Raissa Moreira Soares, que atua em um dos casos em análise, disse que decidir pela taxatividade do rol da ANS seria fechar as portas da Justiça para casos graves de várias doenças.
O presidente da ANS, Paulo Rebello, afirmou que caso o rol não seja considerado taxativo, pode causar prejuízo para a parte econômica e segurança do beneficiário: “retrocesso”.
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