A Fenadv - Federação Nacional dos Advogados emitiu nota de análise sobre a “graça” concedida pelo presidente Jair Bolsonaro ao deputado Daniel Silveira, recém-condenado pelo STF.
Segundo a nota, assinada pelo presidente da Federação, Oscar Alves de Azevedo, e pelo criminalista Antonio Ruiz Filho, presidente da Comissão de Defesa da Democracia e das Prerrogativas, a atitude do presidente atenta contra a separação dos Poderes da República, macula o Estado Democrático de Direito e é inconstitucional.
A nota alerta para o "perigo que pode representar a prevalência da conduta adotada pelo Presidente da República, por tudo inconstitucional, além de inconveniente e com potencial de provocar grave dissenso entre os poderes, dos quais se espera bom senso e equilíbrio nessa conflituosa quadra da vida nacional".
O caso
Na última quarta, 20, Daniel Silveira foi condenado pela Suprema Corte por tentar impedir o livre exercício dos Poderes e ameaçar integrantes da Corte. Ato contínuo, o presidente Bolsonaro editou decreto concedendo perdão ao palamentar. Relembre aqui.
Leia a íntegra da nota da Fenadv:
NOTA PÚBLICA
Embora se reconheça sejam passíveis de críticas tanto aspectos da condenação, quanto a dosimetria da pena aplicada ao Deputado Daniel Silveira, objeto de legítimo questionamento por seu advogado junto ao Supremo Tribunal Federal, não se pode validar a graça concedida ao Parlamentar pelo senhor Presidente da República, que, assim agindo, atenta contra a separação dos poderes da República e, em consequência, macula o Estado Democrático de Direito.
A alegada discricionariedade para a concessão do ato de clemência constitucional pelo chefe do Poder Executivo não é absoluta e nem pode ser imotivada ou erroneamente motivada. Não se trata, a possibilidade de concessão do benefício, de ato revisional sobre decisões judiciais e tudo indica, no caso específico, estar vazada em exercício de proselitismo político, o que a torna inconstitucional. O artigo 37 da Constituição Federal, entre outros princípios, impõe a obediência à impessoalidade quanto a condutas de qualquer dos Poderes da União. Assim, a concessão de tal benefício se descaracteriza se estiver apoiada em ato de mera vontade ou estratégia política para agradar correligionários, o que não atende ao interesse público sobre a manutenção da separação de poderes. Contrario sensu do que alegado para a concessão do benefício, o respeito à competência de cada um dos poderes da República é que faz prevalecer o sistema de freios e contrapesos.
A suposta comoção social, também utilizada para fundamentar o decreto presidencial, não existiu, mas aparece agora contra essa indevida interferência sobre o Poder Judiciário, como se o Executivo tivesse, entre as suas altas atribuições, a atividade correcional sobre decisões judiciais. Evidentemente não a tem.
Ademais, o instituto da graça tem índole humanitária, o que não se encontra no caso concreto, cujo ato está impropriamente relacionado ao mérito da causa, que ainda nem atingiu o trânsito em julgado para o início do efetivo cumprimento da pena, momento mais adequado à concessão do benefício, se cabível e bem avaliados os seus pressupostos legais e constitucionais.
Assim, a Federação Nacional dos Advogados, orientada pela lei e segundo os princípios emanados da Constituição Federal, dos quais não se permite afastar, ao tempo em que apoia a defesa exercida pelo colega que atua pelo Parlamentar acusado de haver praticado crimes graves a merecer reprimenda adequada, aponta para o perigo que pode representar a prevalência da conduta adotada pelo Presidente da República, por tudo inconstitucional, além de inconveniente e com potencial de provocar grave dissenso entre os poderes, dos quais se espera bom senso e equilíbrio nessa conflituosa quadra da vida nacional.
Oscar Alves de Azevedo – Presidente da FeNadv
Antonio Ruiz Filho – Presidente da Comissão de Defesa da Democracia e das Prerrogativas