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STJ tranca ação contra homem revistado por “vaga atitude suspeita”

Em voto combativo, o ministro Rogério Schietti falou em racismo estrutural e assinalou que alegação genérica é insuficiente para medida invasiva.

25/4/2022

“Era só mais uma dura/ Resquício de ditadura/ Mostrando a mentalidade de quem se sente/ Autoridade neste Tribunal de Rua”

Com esse trecho de música d'O Rappa o ministro Rogério Schietti abriu seu voto em ação na qual era relator, na última terça-feira, 19. Os ministros da 6ª turma do STJ, seguindo por unanimidade o voto do ministro, decidiram trancar ação por tráfico de drogas contra homem que foi abordado e revistado pela polícia sem justificativa concreta, por “vaga menção” a suposta “atitude suspeita”.

O magistrado registrou que, a pretexto de transmitir sensação de segurança à população, as polícias “em verdadeiros tribunais de rua”, como diz a música, constrangem elementos “suspeitos” com base em preconceitos estruturais, restringindo seus direitos fundamentais e deixando-lhes graves traumas.

No caso em julgamento, um recurso em HC, os ministros concluíram que a alegação genérica é insuficiente para medida invasiva que é a realização de busca pessoal, conhecida popularmente como ‘baculejo’, ‘enquadro’ ou ‘geral’.

Ministro Schietti, do STJ, profere combativo voto contra medidas invasivas por mera "atitude suspeita".(Imagem: Reprodução/Youtube)

Em seu voto, o ministro chamou a atenção para o problema do racismo estrutural no Brasil, e outros preconceitos. “Infelizmente, ter pele preta ou parda, no Brasil, é estar permanentemente sob suspeita.”

“Em um país marcado por alta desigualdade social e racial, o policiamento ostensivo tende a se concentrar em grupos marginalizados e considerados potenciais criminosos ou usuais suspeitos, assim definidos por fatores subjetivos, como idade, cor da pele, gênero, classe social, local da residência, vestimentas etc”

Schietti destacou que há três razões principais para que sejam exigidos "elementos objetivos e concretos" para a realização de revistas: i) evitar o uso excessivo da medida invasiva e constrangedora, que implica a detenção do indivíduo, ainda que por instantes; necessidade de garantir a sindicabilidade da abordagem, ou seja, permitir que a medida possa ser questionada e ter sua validade controlada pelo Judiciário; e iii) evitar a repetição de práticas que reproduzem preconceitos estruturais arraigados na sociedade, como é o caso do perfilamento racial, reflexo direto do racismo estrutural.

Segundo o ministro, a ausência de justificativa e de elementos a legitimar a ação dos agentes públicos pode fragilizar direitos à intimidade, privacidade e liberdade.

 Decisão foi proferida no julgamento da última terça-feira, 19, ocasião em que os ministros fixaram entendimento no sentido de que, para a realização de revista, é necessário que haja “fundada suspeita (justa causa)”, baseada em um juízo de probabilidade, descrita com a maior precisão possível, aferida de modo objetivo e devidamente justificada, de que a pessoa esteja na posse de drogas, armas ou de outros objetos ilícitos.

Entretanto, destaca a decisão, o art. 244 do CPP não se limita a exigir que a suspeita seja fundada. É preciso, também, que esteja relacionada à posse de arma proibida ou de objetos ou papéis que constituam corpo de delito”.

“Há uma necessária referibilidade da medida, vinculada à sua finalidade legal probatória, a fim de que não se converta em salvo-conduto para abordagens e revistas exploratórias (fishing expeditions) baseadas em suspeição genérica existente sobre indivíduos, atitudes ou situações, sem relação específica com a posse de arma proibida ou objeto que constitua corpo de delito de uma infração penal. que constitua corpo de delito de uma infração penal."

Diante dos fatos, o ministro Schietti destacou a importância do uso de câmeras por agentes de segurança, a fim de que se possa aprimorar o controle sobre a atividade policial, “tanto para coibir práticas ilegais, quanto para preservar os bons policiais de injustas e levianas acusações de abuso”.

Ele ainda apresentou dados das Secretarias de Segurança Pública que mostram que o índice de eficiência no encontro de objetos ilícitos em abordagens policiais é de apenas 1% – “isto é, de cada 100 pessoas revistadas pelas polícias brasileiras, apenas uma é autuada por alguma ilegalidade”.

Leia a decisão.

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