Os agentes financeiros, considerados "bancos de varejo", que financiam a compra e venda de automóvel não respondem pelos vícios do produto, subsistindo o contrato de financiamento mesmo após a resolução do contrato de compra e venda, exceto no caso dos bancos integrantes do grupo econômico da montadora. Assim decidiu a 3ª turma do STJ, ao dar provimento a recurso de um banco.
Relatam os autos que o comprador adquiriu, em setembro de 2014, um veículo zero quilômetro por meio de financiamento bancário fornecido pela instituição financeira. O veículo, contudo, apresentou vício na coluna da porta do motorista, vício que não foi sanado a contento pela concessionária, levando o consumidor a pleitear judicialmente, em fevereiro de 2015, a restituição das quantias pagas.
O pedido foi julgado procedente em primeiro grau, tendo-se condenado a concessionária e a montadora a restituírem os valores pagos diretamente pelo consumidor a título de entrada, além de condenar o agente financeiro à obrigação de restituir as parcelas do financiamento até então quitadas.
No que tange à restituição das parcelas pagas, o Tribunal de origem entendeu que o contrato de financiamento era coligado ao de compra e venda, de modo que o vício do produto conduziria à resolução de ambos os contratos.
Nas razões do apelo, a instituição financeira argumentou que não houve vício no contrato de financiamento, razão pela qual não seria cabível a condenação à restituição das parcelas pagas.
Contrato resolvido
Ao analisar o caso, o relator, ministro Paulo de Tarso Sanseverino, ressaltou que a jurisprudência da Corte se encontra pacificada no sentido da ausência de responsabilidade da instituição financeira que atua como mero “banco de varejo” por vício do veículo financiado.
No caso dos autos, para o ministro, embora não se tratasse de "banco da montadora", mas "banco de varejo", o Tribunal de origem resolveu o contrato de financiamento, determinando a restituição das parcelas pagas, estando, portanto, o acórdão em dissonância com o entendimento da Corte.
Assim, votou no sentido de dar provimento ao recurso especial para julgar improcedente o pedido deduzido contra o banco.
Em voto-vista, ministra Nancy Andrighi divergiu do relator. Para Nancy, há uma evidente dependência recíproca entre os contratos de compra e venda do veículo e de financiamento. “Sem o contrato de compra e venda, o contrato de financiamento perde sua própria razão de ser, desequilibrando os interesses inicialmente desenhados no conjunto da operação econômica”, disse.
Diante disso, não se justifica, para a ministra, a manutenção do contrato de financiamento uma vez resolvido o contrato de compra e venda.
Os ministros Ricardo Villas Bôas Cueva e Marco Aurélio Belizze seguiram o relator. Nancy Andrighi e Moura Ribeiro ficaram vencidos.
O advogado do escritório Reis Advogados, Rodrigo Pereira Cuano, ao comentar o caso, explica que instituições financeiras que atuam como “bancos de varejo” não respondem por esse tipo de vício.
“Trata-se de importante decisão, que traz segurança ao mercado financeiro e de crédito, por reconhecer que a responsabilidade solidária entre a instituição financeira e a concessionária de automóveis somente se perfaz quando existe vinculação entre ambas, isto é, na hipótese na qual a instituição financeira atua como ‘banco da montadora’, integrando a cadeia de consumo e, portanto, sendo responsável pelo defeito no produto.”
- Processo: REsp 1.946.388
_________