O Órgão Especial do TJ/RJ é o juízo competente para processar e julgar o caso das “rachadinhas”, que envolve o senador Flávio Bolsonaro. A decisão é da 2ª turma do STF, por maioria, sob o entendimento de que os fatos vinculados ao caso têm relação com o cargo de deputado estadual, exercido por Flávio, à época das acusações feitas pelo MP do Rio.
Rachadinhas
O MP/RJ propôs reclamação no Supremo contra decisão da 3ª câmara Criminal do TJ/RJ que concedeu foro privilegiado a Flávio Bolsonaro no caso das rachadinhas. Naquela decisão, o juízo da 3ª câmara Criminal do TJ/RJ reconheceu a incompetência da 27ª vara Criminal para processar e julgar Flávio Bolsonaro e determinou a remessa do referido procedimento ao Órgão Especial do Tribunal fluminense.
Para aquele colegiado, o Órgão Especial é quem deve julgar o caso, porque trata-se de delitos supostamente praticados na época em que Flávio exercia o mandato de deputado estadual na Alerj.
Vale lembrar que o procedimento investigatório criminal foi instaurado em 2018 pelo MP/RJ quando o Flávio Bolsonaro ainda era deputado estadual e, ao término deste mandato, iniciou-se outro mandato eletivo de senador, sem interregno temporal entre os cargos eletivos.
"Havendo inequívoca continuidade no exercício de função pública, ambos os cargos eletivos exercidos no Poder Legislativo sem interregno temporal entre eles, persiste a necessidade do resguardo da função pública por meio de aplicação de regra diferenciada de competência", diz a decisão Judicial.
O caso representaria uma espécie de "mandato cruzado" - quando o parlamentar deixa de ocupar o cargo eletivo, por causa do término da legislatura, para assumir um outro, mas em uma casa legislativa diferente. De acordo com a PGR, há posições conflitantes do STF sobre se o foro por prerrogativa de função alcançaria ou não os casos denominados de "mandatos cruzados".
De acordo com a PGR, a reclamação proposta pelo MP/RJ "busca um entendimento jurisprudencial ainda não firmado". Para a Procuradoria, "a hipótese do processo (parlamentar estadual que virou senador e está respondendo por atos que teriam sido praticados no exercício da função de deputado estadual) não foi ainda tratada pelo Supremo Tribunal Federal".
Dois dias antes de a Corte fluminense julgar o caso, o ministro Gilmar Mendes suspendeu a tramitação do processo no RJ. Leia a decisão de Gilmar Mendes.
2ª turma do STF
Preliminarmente, Gilmar Mendes (relator) concluiu que é inviável a presente reclamação uma vez que a decisão do TJ/RJ já transitou em julgado para o MP do Rio. O relator asseverou que houve a perda do prazo, por parte do parquet fluminense, para recorrer daquela decisão, tendo transitada em julgado o objeto da decisão reclamada. “É um caminho processual ilegítimo para reformar a decisão”, afirmou.
Ultrapassada essa questão processual, o ministro julgou a ação improcedente; ou seja, votou no sentido de manter decisão que mandou o caso para o Órgão Especial do TJ/RJ. Para o ministro, a decisão do TJ/RJ não afronta entendimento atual do Supremo sobre foro por prerrogativa de função, ao contrário do que alegado pelo MP do Rio.
“Independente de concordarmos com a posição do TJ do Rio, o que está em debate é se a autoridade do STF foi violada. Desde a proferida decisão não ficou claro o alcance da a modificação da jurisprudencial.”
O ministro Gilmar fez questão de registrar que o julgamento em questão não versa sobre o mérito (autoria e materialidade) do caso, mas apenas o foro competente para julgamento. Em conclusão, o ministro não acolheu o pedido do MP do Rio e manteve a decisão da 3ª câmara Criminal do TJ/RJ.
“A prerrogativa de função não equivale a privilégio pessoal, mas condiz unicamente com a proteção funcional”, assim afirmou o ministro Edson Fachin ao divergir no ministro Gilmar Mendes.
Edson Fachin votou no sentido de julgar procedente a reclamação do MP/RJ e cassar a decisão da 3ª câmara Criminal do TJ/RJ. Dessa forma, o ministro votou por restabelecer o juízo da 27ª vara Criminal da Capital como competente para acompanhar as investigações contra Flávio Bolsonaro.
Por outro lado, o ministro Lewandowski seguiu o entendimento do relator do caso, votando pelo foro por prerrogativa de função:
“Impõe-se a manutenção da competência criminal do Órgão especial do TJ/RJ, uma vez que, para além da preclusão decorrente da omissão do parquet na interposição do recurso, os fatos estão vinculados ao exercício do mandato parlamentar, do agora senador da República, na casa legislativa daquele Estado.”
Finalizando a discussão, o ministro Nunes Marques votou no sentido de julgar improcedente a reclamação, assim como Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski.
Foro privilegiado e STF
Em maio de 2018, o STF tomou decisões importantes no que se refere ao foro por prerrogativa de função.
Em 3 de maio, os ministros decidiram que o foro por prerrogativa de função no STF fica restrito a parlamentares federais nos casos de crimes comuns cometidos após diplomação e relacionados ao cargo. O entendimento foi aplicado aos processos em curso, ficando resguardados os atos e as decisões do STF - e dos juízes de outras instâncias - tomados com base na jurisprudência anterior (AP 937).
Uma semana depois, em 10 de maio, os ministros decidiram que a Corte não tem competência para processar e julgar ação de improbidade administrativa contra agente político. O foro por prerrogativa de função previsto na Constituição Federal em relação às infrações penais comuns, segundo os ministros, não é extensível às ações de improbidade administrativa, que têm natureza civil (Pet 3.240)
- Processo: Rcl 41.910