“Deixar com os tribunais a tarefa de suprir o vácuo legislativo implica em indesejável insegurança jurídica.” A afirmação foi feita pelo relator João Carlos Castellar, da Comissão de Direito Penal do IAB - Instituto dos Advogados Brasileiros, na sessão ordinária virtual da última quarta-feira, 15/9, ao fazer a sustentação oral do seu parecer divergente do elaborado pelo relator Claudio Bidino.
Membro da mesma comissão, Claudio Bidino propôs a aprovação parcial do PL 744/21, do deputado federal Celso Russomanno (Republicanos/SP), que revoga o artigo da lei dos crimes contra a economia popular, lei 1.521/51, destinado à punição de danos causados pelas chamadas pirâmides financeiras.
O advogado disse que a legislação está defasada e defendeu que prevaleça o entendimento jurisprudencial para punir o crime. O parecer de João Carlos Castellar, que opinou pela rejeição total do PL, recebeu a votação majoritária do plenário.
“Para superar essa suposta desatualização, a construção jurisprudencial tem enquadrado tal comportamento delituoso como estelionato ou gestão fraudulenta, gerando condenações não raro severíssimas”, argumentou João Carlos Castellar, para quem “não se pode admitir a imposição de sanções penais desobedientes ao princípio da proporcionalidade”.
Em sua opinião, “as penas previstas na legislação em vigor para punir tal conduta são, ainda hoje, consentâneas com a gravidade intrínseca da infração, podendo ser aumentadas dependendo do caso e havendo outros crimes relacionados à prática, como o de lavagem de dinheiro”. De acordo com Castellar, “não convém ficar a cargo dos tribunais a aplicação da norma incriminadora que reputarem a mais adequada em cada caso concreto”.
O PL 744/21 propõe a revogação do artigo 2º, IX, da lei dos crimes contra a economia popular, que estaria defasado para conter a prática do crime. Além disso, o projeto sugere ajustes nos tipos penais contidos na Lei dos Crimes contra a Ordem Tributária, Econômica e contra as Relações de Consumo, lei 8.137/90), e na lei dos crimes contra o sistema financeiro nacional, lei 7.492/86. Claudio Bidino foi favorável à revogação do artigo desatualizado e contrário aos ajustes previstos.
Rumos jurisprudenciais
“É baixa a penalidade prevista na Lei dos Crimes contra a Economia Popular, que carece de efetividade na prevenção e repressão às pirâmides financeiras”, afirmou o relator, ao defender a extinção do dispositivo e criticar a pena de seis meses a dois anos de detenção, mais multa. Para ele, “as condutas que se voltam para obter ganhos ilícitos em detrimento de um número indeterminado de pessoas mediante processos fraudulentos poderão vir a ser eventualmente reprimidas, a depender do contexto em que foram praticadas e dos rumos jurisprudenciais, por intermédio de outros tipos penais mais adequados à sua gravidade”.
Claudio Bidino justificou a sua posição contrária às mudanças na lei dos crimes contra a Ordem Tributária, Econômica e contra as Relações de Consumo e na lei dos crimes contra o sistema financeiro nacional: "não está demonstrado por ora que a solução para esse possível problema passa invariavelmente pela introdução no ordenamento jurídico brasileiro de novos tipos penais autônomos, e não, por exemplo, pela realização de ajustes em tipos penais já existentes".
O relator fez também um histórico da prática criminosa: “No Brasil, destaca-se que os embustes piramidais sugiram na década de 1930, quando algumas cidades teriam sido surpreendidas pelas chamadas correntes da prosperidade, que operavam de uma forma muito rudimentar, por meio do envio de cartas a cinco pessoas com solicitação de dinheiro”. Ele disse ainda que, “com a expansão da internet e mais notadamente das redes sociais, a exploração das pirâmides financeiras tornou-se muito mais dinâmica, ágil e atraente, possibilitando a arrecadação de dezenas de milhões de reais em um curto espaço de tempo”.
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