Em 1966, o então presidente do Brasil Castelo Branco sancionou a lei 5.010, com o objetivo de organizar a Justiça Federal de 1ª instância.
Em oito capítulos, o legislador dispôs acerca de inúmeros tópicos organizacionais da JF - como deveres e sanções - no entanto, foi no art. 62 que a Justiça Federal ganhou um “bônus” em relação à Justiça Estadual: o feriado do dia 11 de agosto.
Justiça Federal: extinta e restabelecida
No início da reportagem, dissemos que em 1966 Castelo Branco publicou a lei sobre a organização da Justiça Federal de 1ª instância. Isso só foi possível em razão do que aconteceu no ano anterior, em 1965. Por meio do AI-2, Castelo Branco restabeleceu a Justiça Federal de 1º grau.
Por um tempo na história do Brasil, a JF deixou de existir. Com o advento do Estado Novo de Getúlio Vargas, a Constituição Federal de 1937 extinguiu a Justiça Federal, suprimindo a 1ª instância. As Justiças estaduais passaram, assim, a julgar todos os processos de interesse da União, funcionando como órgãos de 1ª instância da Justiça Federal, sendo assegurado o recurso ordinário ao STF.
Pode isso?
Assim que restabelecida a Justiça Federal e publicada a lei, ficou decidido que:
Art. 62. Além dos fixados em lei, serão feriados na Justiça Federal, inclusive nos Tribunais Superiores:
IV - os dias 11 de agosto, 1º e 2 de novembro e 8 de dezembro.
A norma rememora o dia 11 de agosto de 1827, data em que foi aprovada a lei que criou os dois primeiros cursos jurídicos no Brasil. Popularmente, o dia 11 de agosto é conhecido como o dia do advogado.
Quem aproveita a data, na verdade, são os Tribunais Superiores, TRFs, Justiça Federal de 1ª instância e Justiça do Trabalho de todo o país, já que não há expediente neste dia e, por consequência, os prazos processuais são suspensos. Quem fica de fora é a Justiça Estadual.
???
Qual o motivo para se considerar feriado forense nos Tribunais Superiores, TRFs, Justiça Federal de 1ª instância e não o aplicar à Justiça Estadual? Essa é uma boa pergunta, que tem rendido debates entre os operadores do Direito.
Vale lembrar que a mesma lei que impõe o feriado no dia 11 de agosto é a mesma norma que institui o feriado - exceto para a Justiça Estadual - nos dias de segunda e terça-feira de Carnaval. Você, advogado migalheiro, já deve estar por dentro do imbróglio que isso causou no que tange aos prazos processuais.
A Corte Especial do STF decidiu que o feriado local deve ser comprovado no ato de interposição do recurso. Na prática, fica assim: enquanto na Justiça Federal, o advogado não precisará juntar nada à petição do recurso especial (já que é feriado previsto em lei Federal); na Justiça Estadual, o advogado deve não só fazer menção ao feriado tido por local, “mas também deverá anexar à petição de recurso especial o ato ou portaria do TJ onde conste a falta de expediente forense nos dias que antecedem à Sexta-Feira Santa, sob pena de não ser conhecido o recurso”.*
Para o advogado Rafael Alessandro Viggiano de Brito Torres, em artigo migalheiro sobre o tema, é necessário acabar com essa disparidade e, com isso, acabar com a angústia de quem tem um processo em trâmite perante a Justiça Estadual ver o recurso especial ser considerado intempestivo em razão de um feriado dito por "local", mas que é considerado nacional "apenas" para a Justiça Federal de 1ª e 2ª instâncias e para os Tribunais Superiores.
Princípio da igualdade
É realmente “inusitada” esta distinção entre a Justiça Federal e Estadual, que acaba desaguando em prejuízo para o próprio jurisdicionado.
De acordo com o professor Celso Antônio Bandeira de Mello, na obra Conteúdo Jurídico do Princípio da Igualdade, deve haver uma correlação lógica entre o fator descriminante e a desequiparação pretendida, para justificar o tratamento distinto ao jurisdicionado na esfera Estadual e Federal.
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Fontes
- Feriado forense previsto no art. 62, inciso II, da lei 5.010/66 e a desnecessidade de comprovação quando da interposição do recurso especial em processo tramitando na Justiça Estadual. Autor: Rafael Alessandro Viggiano de Brito Torres. Para acessar o artigo, clique aqui.
- MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Conteúdo jurídico do princípio da igualdade. São Paulo: Malheiros, 1993. ISBN 8574200476.