Em decisões distintas, dois trabalhadores rurais conseguiram na Justiça o recebimento da hora in itinere, que foi abolida com a reforma trabalhista. Magistrados consideraram que o tempo despendido pelos empregados, em condução fornecida pelo empregador, até local de trabalho de difícil acesso ou não servido por transporte público regular, deve ser computado na jornada de trabalho.
Primeiro caso
A primeira decisão foi proferida pela 1ª câmara do TRT da 15ª região, em matéria relatada pelo desembargador José Carlos Abile.
No caso, uma trabalhadora recorreu da sentença que julgou seus pedidos trabalhistas improcedentes. Ela diz que é incontroverso que o empregador fornecia transporte até o local de trabalho, localizado em área de difícil acesso sem transporte público regular, fazendo jus à remuneração das horas de percurso.
Segundo o relator, o cerne da questão reside em saber se é aplicável aos trabalhadores rurais o art. 58, § 2º, da CLT, modificado pela lei 13.467/17, que determina que não será computado na jornada de trabalho o tempo despendido no percurso da residência até o local de trabalho.
Para o magistrado, é certo que o tempo despendido pelo empregado, em condução fornecida pelo empregador, até local de trabalho de difícil acesso ou não servido por transporte público regular, deve ser computado na jornada de trabalho, sendo devido o pagamento das horas por tempo de percurso, nos termos da Súmula 90 do TST.
Por tais, motivos, o colegiado deu provimento ao recurso para condenar o empregador ao pagamento de quatro horas de percurso durante o primeiro mês de trabalho e de 1h30 a partir do segundo mês por dia efetivo de trabalho, conforme anotações nos cartões de ponto, com adicional de 50%, e reflexos em DSRs e depósitos fundiários.
Decisão semelhante
Na mesma linha foi a decisão proferida pela 4ª câmara do mesmo TRT, em caso relatado pela desembargadora Eleonora Bordini Coca.
Na ação em questão, o juízo de origem indeferiu o pedido relativo às horas in itinere porque o período contratual coincide com a vigência da lei 13.467/17.
“Importante destacar que a CLT contém disposições específicas - recepcionadas pela Constituição de 1988 e não revogadas pela Lei nº 13.467/2017 - relativas ao tempo de trajeto até o local de trabalho para os trabalhadores ferroviários (artigo 238, § 3º) e para os que se ativam em minas (artigo 294), as quais podem ser aplicadas, por analogia (artigo 8º, "caput", da CLT), a outros empregados que desempenhem suas atividades em situações congêneres, tais como o trabalhador que se ativa em locais que não possuem transporte público regular, cuja atividade empresarial não poderia ser desenvolvida não fosse o oferecimento de condução pelo empregador, como é o caso do empregado rural”, disse a relatora.
Segundo a magistrada, a não consideração deste lapso como tempo à disposição importaria transferir os custos da atividade empresarial ao empregado, “o que subverte não apenas a lógica do Direito do Trabalho como a própria racionalidade capitalista”.
Diante disso, deu parcial provimento ao recurso para condenar a parte ré ao pagamento de 1 hora de percurso por dia de trabalho em cada um dos contratos de trabalho, conforme se apurar nos cartões de ponto, autorizada a dedução de eventuais valores quitados sob a mesma rubrica.
O advogado Rodolfo Shimozako Nates atua nos casos.
- Processos: 0011561-97.2020.5.15.0027 e 0011619-03.2020.5.15.0027