Na tarde desta quarta-feira, 26, o plenário do STF finalizou complexo julgamento sobre a possibilidade de ação civil pública desconstituir coisa julgada para fins de honorários de sucumbência em sede de ação desapropiatória. Por maioria, os ministros fixaram a seguinte tese:
1 - O trânsito em julgado de sentença condenatória proferida em sede de ação desapropriatória não obsta a propositura de ação civil pública e defesa do patrimônio público para discutir a dominialidade do bem expropriado, ainda que já se tenha expirado o prazo para a ação rescisória.
2 - Em sede de ação de desapropriação, os honorários sucumbenciais só serão devidos caso haja devido pagamento de indenização aos expropriados.
Imbróglio
A discussão começa em ação desapropriatória de imóvel proposta pelo Incra contra duas partes. Esta ação transitou em julgado com a condenação da autarquia a pagar indenização e honorários sucumbenciais em favor dos patronos dos expropriados. Vale lembrar que ações de desapropriação só discutem o valor de indenização e não questões de domínio.
Passaram-se dois anos (prazo para propor a ação rescisória) e, posteriormente, o MPF ajuizou ação civil pública em desfavor dos expropriados alegando que os imóveis eram de propriedade da União e que o governo daquela localidade (Paraná) outorgou, indevidamente, a centenas de pessoas, títulos de proprietários rurais, correspondentes a diversas áreas de terras. Ou seja, enquanto em uma ação discute-se a indenização, em outra discute-se o domínio da área.
Ato contínuo, o juízo de 1º grau deferiu a liminar na ação civil pública para determinar a suspensão da indenização e dos honorários até o trânsito em julgado da ACP. Contra esta decisão, os advogados da causa interpuseram recurso para receberem seus honorários. O TRF da 4ª região atendeu o pedido dos patronos e autorizou o levantamento.
O STJ, no entanto, entendeu que é perfeitamente legítimo, em nome da defesa do patrimônio público, a inviabilização, mediante ajuizamento de ação civil pública, de levantamento de honorários advocatícios sucumbenciais advindos de desapropriação de imóvel, cujo domínio é questionado por ser da União.
Agora, os ministros devem debater pela aptidão, ou não, da ação civil pública para afastar a coisa julgada, em particular quando já transcorrido o biênio para o ajuizamento da rescisória.
- Pagamento de honorários
Na última semana, votaram três ministros: Marco Aurélio, Nunes Marques e Alexandre de Moraes.
Marco Aurélio, relator, deu provimento ao recurso e propôs a seguinte tese: "o ajuizamento de ação civil pública não afasta os efeitos da coisa julgada". O ministro salientou que o MPF utilizou a ACP para desconstituir a coisa julgada, que somente deveria ser contestada, de acordo com a Constituição Federal, por meio de ação rescisória.
Nunes Marques acompanhou o decano no sentido da possibilidade do levantamento dos honorários advocatícios em questão e propôs a seguinte tese:
1 - A ação civil pública é adequada, imprescritível e insuscetível de decadência para impedir o levantamento do preço da desapropriação quando houver controvérsia sobre se o bem expropriado já integrava o domínio público do ente expropriante antes mesmo do ajuizamento da ação expropriatória.
2 – Os honorários advocatícios fixados em sentença de ação de desapropriação transitada em julgada apenas podem ser desconstituídos ou ter seu pagamento suspenso por ação rescisória, observado o prazo decadencial de seu ajuizamento.
Em breve voto, o ministro Dias Toffoli afirmou que acompanha o entendimento Nunes Marques.
- Não cabimento dos honorários
Alexandre de Moraes abriu a divergência, por entender que o objetivo do MPF com a ação era trazer luz à desapropriação, visto que a decisão da 2ª instância havia condicionado o pagamento da indenização à comprovação do domínio do particular. Para S. Exa., não se trata de debate sobre violação da coisa julgada ou de segurança jurídica, mas sim sobre a titularidade das terras, que, por se localizarem em faixa de fronteira, seriam necessariamente da União. Segundo o ministro, o dever do pagamento da indenização e dos honorários advocatícios somente serão decididos quando for provada a dominialidade das terras expropriadas.
Luís Roberto Barroso votou como Moraes, ou seja, pelo desprovimento do recurso. S. Exa. frisou que não se formou a coisa julgada quanto ao domínio da área, “não vejo como autorizar o levantamento dos honorários por entender que eles estão diretamente associados ao êxito da ação de desapropriação”.
“Eu reconheço que o advogado trabalhou, mas a verdade, honorários de sucumbência traduzem honorários de êxito. Êxito do advogado? Não. Êxito do cliente que ele patrocina.”
Também pelo desprovimento do recurso, votaram a ministra Rosa Weber e Cármen Lúcia. De acordo com a ministra, uma vez inexistente o domínio, não há falar em indenização e nem de honorários de sucumbência.
No mesmo sentido, Ricardo Lewandowski explicou que a questão da propriedade sempre foi contestada no caso, “não transitou em julgado” e, dessa forma, não seria possível o levantamento dos honorários. Finalizando o julgamento, votaram os ministros Gilmar Mendes e Luiz Fux, no sentido de desprover o recurso.
- Processo: RE 1.010.819