É constitucional lei estadual que obriga empresas prestadoras de telefonia fixa e móvel a constituírem cadastro especial de assinantes que não querem receber ligações de telemarketing com ofertas de produtos ou serviços. Assim decidiu o plenário do STF na tarde desta quinta-feira, 25, por maioria.
Ligações incômodas
A ação foi ajuizada pela ABRAFIX - Associação Brasileira de Concessionárias de Serviços Telefônico Fixo Comutado contesta a lei 4.896/06, do RJ, que obriga as empresas prestadoras de telefonia fixa e móvel com atuação no Estado a constituírem cadastro especial de assinantes que manifestem oposição ao recebimento, por telefone, de ofertas de comercialização de produtos ou serviços, e prevê outras medidas para o chamado telemarketing.
Na tarde de hoje, pela ABRAFIX - Associação Brasileira de Concessionárias de Serviços Telefônico Fixo Comutado, o advogado Saul Tourinho salientou que a Constituição Federal conferiu à Anatel capacidade institucional, pela expertise de seus engenheiros, de poder de disciplinar regras entre concessionários e usuários. O advogado destacou ainda que a Anatel já elaborou a lista “Não me perturbe”, para impedir as ligações indesejadas de telemarketing, sem a necessidade de leis estaduais disporem sobre o tema. Por fim, pediu pela procedência da ação, ou seja, pela inconstitucionalidade da norma.
Por outro lado, Augusto Aras pediu pela constitucionalidade da lei do RJ. O PGR enfatizou que a lei ajuda no combate de abusos das empresas de telemarketing: ligações em horários impróprios e em quantidades de vezes irrazoáveis. Aras afirmou que esta lei não integra o tema típico das telecomunicações (de competência privativa da União), mas versa sobre matéria de consumidor, no sentido garantir que o cidadão não será importunado.
Defesa do consumidor - Competência concorrente:
O ministro Marco Aurélio, relator, votou pela validade da lei ao reconhecer que a norma é salutar. No início de seu voto, S. Exa. relatou que, inclusive, é “bombardeado” com estas ligações indesejadas de telemarketing oferecendo serviços.
Para o decano, a Assembleia Legislativa do RJ atuou de forma suplementar na proteção do consumidor, “pobre consumidor, que não pode sequer dizer desaforos ao telefone, porque do outro lado está um robô”.
O ministro indagou: "o legislador local interveio no núcleo de atuação das empresas voltadas à prestação de serviço de telecomunicações, usurpando a competência privativa da União? "A resposta é negativa", disse.
Marco Aurélio explicou que a norma do RJ buscou ampliar mecanismo de tutela da dignidade dos usuários e finalizou seu voto registrandi que a norma é um exercício de competência concorrente dos Estados para dispor sobre proteção ao consumidor.
- Veja a íntegra do voto de Marco Aurélio.
No mesmo sentido, votou o ministro Nunes Marques, para quem a lei versa sobre matéria típica de consumo. Nunes Marques registrou que, atualmente, as empresas lançam mão de tecnologias para oferecer serviços que invadem a esfera íntima das pessoas. “A disciplina, em si, de uma lista de privacidade para não receber chamadas telefônicas inoportunas está dentro do escopo da competência estadual para regular o direito do consumidor”. Nunes Marques apresentou, no entanto, uma pequena divergência quanto ao voto do relator, no sentido de que cabe ao consumidor escolher se quer, ou não, receber ligações nos fins de semana, feriados ou em dias de semana após às 18h.
“Duvido que alguém já não tenha se irritado com estas ligações de telemarketing”, disse Alexandre de Moraes em breve voto ao validar a lei do RJ. O ministro Edson Fachin também acompanhou o relator.
Para a ministra Rosa Weber, a ação trata de tema consumerista, por isso, “não há falar em usurpação da competência legislativa privativa da União”. Ato contínuo, votaram os ministros Dias Toffoli, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski, Luiz Fux ao enfatizarem que a matéria não trata de serviços de telecomunicações, mas, sim, de proteção ao consumidor.
Telefonia - Competência privativa
O ministro Luís Roberto Barroso abriu divergência ao relembrar julgamento da ADIn 3.959, quando o plenário declarou a inconstitucionalidade de lei paulista que criava cadastro especial de assinantes do serviço de telecomunicações interessados no sistema de venda por meio de telemarketing. Para Barroso, o tema versa sobre telecomunicação, ou seja, assunto de competência privativa da União para legislar. O ministro, então, resumiu seu voto no seguinte entendimento:
“É inconstitucional lei estadual que obriga concessionárias de telefonia a constituir e manter cadastro de usuários que se opõem ao recebimento de ligações para oferta de produtos e serviços.”
O ministro Gilmar Mendes afirmou que, por mais nobre que seja a intenção da lei impugnada, os ônus impostos pela norma local podem comprometer a execução contratual da concessão de serviços de telecomunicações. O ministro relembrou que naquele julgamento da lei paulista, também votou pela inconstitucionalidade da norma.
- Processo: ADIn 5.962