Em julgamento no plenário virtual, os ministros do STF, por unanimidade, concluíram julgamento sobre retenção de bens importados para pagamento de diferença fiscal. Seguindo voto do relator, ministro Marco Aurélio, foi fixada a seguinte tese:
“É constitucional vincular o despacho aduaneiro ao recolhimento de diferença tributária apurada mediante arbitramento da autoridade fiscal.”
A União interpôs o RE contra acórdão do TRF da 4ª região que entendeu incabível condicionar o desembaraço aduaneiro de bens importados ao pagamento de diferenças apuradas por arbitramento da autoridade fiscal.
No caso, a Receita Federal promoveu a retenção das mercadorias importadas sob alegação de houve subfaturamento (declaração de menor preço da mercadoria para pagamento a menor do tributo) e condicionou sua liberação ao pagamento de multa e tributos complementares ou mediante o depósito de caução (garantia) correspondente.
O TRF-4 entendeu, entre outros pontos, que a Súmula 323 do Supremo proíbe a apreensão de mercadorias como meio coercitivo para pagamento de tributos. Assinalou ainda que o não recolhimento da multa e da diferença de tributos oriundos da imposição de reclassificação fiscal não tem a capacidade de obstruir o desembaraço aduaneiro, pois a liberação das mercadorias não impede o prosseguimento do Fisco na autuação e na futura cobrança das diferenças de tributos e multas apuradas, se for o caso.
De acordo com o Tribunal, é necessário que o subfaturamento tenha sido perpetrado por outros meios de fraude (como a falsidade material), não abrangendo as hipóteses em que o subfaturamento configure apenas a falsidade ideológica, pois há norma específica tipificando essa conduta como infração administrativa apenada com multa de 100% sobre a diferença dos preços.
No RE, a União argumentou que não há semelhança entre o precedente que originou a Súmula 323 e a situação retratada no processo, pois, naquela ocasião, discutiu-se se configurava sanção política a apreensão de mercadorias como meio coercitivo para pagamento de tributos. Já nesse caso, é preciso definir se consiste em penalidade política a retenção de bem objeto de despacho aduaneiro de importação até o recolhimento da diferença decorrente de arbitramento fiscal.
Relator
O relator, ministro Marco Aurélio, observou que o pagamento de tributo e multa constitui elemento essencial ao desembaraço aduaneiro. Para S. Exa., o inadimplemento da obrigação fiscal torna inviável a conclusão do procedimento, afastando a possibilidade de internalização da mercadoria.
Marco Aurélio destacou que não se tem coação indireta objetivando a quitação tributária, mas regra segundo a qual o recolhimento das diferenças fiscais é condição a ser satisfeita na introdução do bem no território nacional, sem o qual não se aperfeiçoa a importação, destacando doutrina nesse sentido:
“Não há que se confundir a apreensão – que ocorre quando verificada irregularidade que enseje a aplicação da pena de perdimento – com a simples retenção do produto até que cumpridas condições para a conclusão do desembaraço e liberação, como a apresentação de documentação e o pagamento de tributos devidos.”
O ministro ressaltou que foi editado o verbete vinculante 48 do STF com a redação: “Na entrada de mercadoria importada do exterior, é legítima a cobrança do ICMS por ocasião do desembaraço aduaneiro”, e que a sistemática revela opção política do legislador, direcionada a elidir a sonegação fiscal e proteger a indústria nacional, em consonância com o previsto no artigo 237 da CF.
Diante disso, conheceu do recurso e o proveu para, reformando o acórdão impugnado, assentar compatível, com a Lei Maior, o condicionamento do desembaraço aduaneiro de mercadoria importada ao pagamento de diferença de tributo e multa decorrente de arbitramento implementado pela autoridade fiscal.
- Veja o voto de Marco Aurélio.
O entendimento do relator foi seguido por unanimidade. O ministro Celso de Mello está afastado por licença médica.
- Processo: RE 1.090.591