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Moraes pede destaque em julgamento sobre competência do TCU para determinar indisponibilidade de bens de particulares

Antes de ser retirado do plenário virtual, o ministro Marco Aurélio, relator, pontuou que não cabe ao TCU a restrição de direitos de particulares contratantes com a Administração Pública.

24/8/2020

Pedido de destaque do ministro Alexandre de Moraes retirou do plenário virtual um mandado de segurança no qual se discute a possibilidade de o TCU decretar indisponibilidade de bens de empresas envolvidas em apuração de desvios financeiros, de fraudes contratuais ou de quaisquer atos ilícitos que causem prejuízos ao erário.

O MS  35.506 foi impetrado por uma empresa de projetos de plantas industriais após o TCU decretar a indisponibilidade dos seus bens e ativos, em montante equivalente a R$ 653 milhões, e a desconsideração de sua personalidade jurídica.

No mandado de segurança impetrado no STF, a empresa sustentou que o ato do TCU feriu seu direito líquido e certo de movimentar livremente seus bens e ativos.

A decisão foi proferida pelo plenário do TCU no âmbito da tomada de contas especial que apura responsabilidades por indícios de irregularidade no contrato firmado entre a Petrobrás e o Consórcio TUC Construções, para a construção da CDPU - Central de Desenvolvimento de Plantas de Utilidade do Comperj - Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro.

A PPI – Projeto de Plantas Industriais Ltda. integrou o Consórcio TUC Construções ao lado das empreiteiras Odebrecht e UTC, investigadas pela operação Lava Jato. No STF, os advogados da PPI afirmaram que, a despeito de a empresa ter atuado em consórcio em conjunto com empresas que admitiram a prática de irregularidades, não há indícios de que a PPI tenha praticado qualquer conduta ilegal, tampouco prova de que tivesse conhecimento das irregularidades praticadas pela Odebrecht e UTC.

Salientaram que os acordos de leniência celebrados pelas demais integrantes do consórcio e as colaborações premiadas celebradas por seus diretores dão conta de que a PPI não teve envolvimento nos atos praticados por essas empresas.

Em 2018, o ministro Marco Aurélio, relator, suspendeu o bloqueio de bens de empresa integrante do consórcio.

Competência

Antes de ser retirado do plenário virtual, o ministro Marco Aurélio reafirmou seu posicionamento no sentido de que, ao Tribunal de Contas, órgão administrativo, não cabe o implemento de medida cautelar a restringir direitos de particulares, de efeitos práticos tão gravosos como a indisponibilidade de bens e a desconsideração da personalidade jurídica, em sanções patrimoniais antecipadas.

S. Exa. pontuou que a CF/88, ao tratar do dever de prestação de contas, pelo particular – pessoa natural ou jurídica -, limita a legitimação passiva àqueles que utilizem, arrecadem, guardem, gerenciem ou administrem dinheiros, bens e valores públicos ou pelos quais a União responda, ou que, em nome desta, assumam obrigações de natureza pecuniária.

Em seu voto, o ministro explicou que não se trata de afirmar a ausência do poder geral de cautela do Tribunal de Contas, mas de assinalar que essa atribuição tem limites, dentro dos quais não se encontra o bloqueio, “por ato próprio, dotado de autoexecutoriedade”, dos bens de particulares contratantes com a Administração Pública.

Para o ministro, é imprópria a justificativa da medida com base no artigo 44 da lei orgânica do TCU (lei 8.443/92), pois o dispositivo diz respeito à disciplina da atuação do responsável pelo contrato público, ou seja, do servidor público, sem abranger o particular.

Poder geral de cautela

O ministro Gilmar Mendes abriu a divergência. Para S. Exa, o ato impugnado, inclusive no que tange à ordem cautelar de indisponibilidade de bens, está inserido no campo das atribuições constitucionais de controle externo exercido pelo TCU (art. 71, CF/88), uma vez que são investigadas possíveis irregularidades quanto à dilapidação do patrimônio público e licitações e contratos administrativos.

"Nesse ponto, vale destacar que a jurisprudência desta Corte reconhece assistir ao Tribunal de Contas um poder geral de cautela, que se consubstancia em prerrogativa institucional decorrente das próprias atribuições que a Constituição expressamente outorgou a Corte de Contas para seu adequado funcionamento e alcance de suas finalidades."

Neste contexto, para o ministro, não há que se falar em violação da ampla defesa e do contraditório pelo simples fato de as medidas cautelares terem sido proferidas sem prévia oitiva da impetrante. "Até porque, conforme informado pela autoridade coatora, a própria decisão já determinou a citação imediata da impetrante para exercício do direito de defesa e não se cuida, ainda, de decisão de mérito, mas tão somente de procedimento administrativo cautelar".

Na análise do ministro, o que se constata é que, dada a gravidade e a complexidade dos elementos colhidos no processo em exame, o TCU parece ter procedido com a diligência e a cautela que este caso exige.

Para Gilmar Mendes, se é possível, portanto, ao TCU responsabilizar terceiro que seja parte interessada na prática do ato e que tenha participado na consecução do dano apurado, também se permite, pela teoria dos poderes implícitos, que aquela Corte de Contas possa realizar o bloqueio de bens, como medida cautelar de indisponibilidade, visando a proteger o erário em caso de futura condenação.

O ministro concluiu não ser razoável excluir da incidência das medidas cautelares impostas pelo TCU os particulares que possam ter causado prejuízo ao erário. “Assim, o que deve determinar a sujeição de pessoa física ou jurídica à atividade fiscalizatória da Corte de Contas é a origem dos recursos por ela utilizados”.

O ministro Dias Toffoli acompanhou a divergência.

Em voto também pela denegação da ordem, ministro Lewandowski lembrou que a jurisprudência do Supremo é no sentido de que as Cortes de contas estão autorizadas a lançar mão de medidas cautelares, embora tenha, em determinados momentos, limitado os atos de tais órgãos que extrapolaram as atribuições constitucionais. 

De acordo com o voto de S. Exa., "nada obsta que as Cortes de contas também procedam, in limine, à desconsideração liminar da personalidade jurídica dos entes que alegadamente tenham malversado dinheiro público, embora ainda sejam escassos os precedentes neste sentido".

Lewandowski anotou, no entanto, que a desconsideração da personalidade jurídica é medida extrema e de graves consequências, por isso mesmo precisa sempre amoldar-se aos parâmetros e limites indicados em lei.

"Nada obstante, reconheço que, em situações como a dos autos, quando se está ainda na fase preambular da apuração, nada obsta que o TCU decrete a indisponibilidade cautelar de bens, pelo prazo não superior a um ano, com esteio no art. 44, § 2°, da Lei 8.443/1992, procedendo, também cautelarmente, à desconsideração a desconsideração da personalidade jurídica do ente sob investigação de maneira a assegurar o resultado útil do processo. Todavia, decisão definitiva sob o destino dos bens acautelados, seja da pessoa jurídica, seja de seus sócios ou administradores, caberá sempre a um magistrado togado, considerado o princípio da reserva de jurisdição, o qual, ao fim e ao cabo, se destina a resguardar os direitos e garantias fundamentais dos cidadãos."

Veja o voto do ministro Lewandowski.

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