A crítica que os meios de comunicação social e as redes digitais dirigem às pessoas públicas, por mais dura e veemente que possa ser, deixa de sofrer, quanto ao seu concreto exercício, as limitações externas que ordinariamente resultam dos direitos de personalidade.
O entendimento acima é do ministro do STF Celso de Mello, ao julgar procedente reclamação e invalidar decisões da Justiça do Paraná que determinavam à rádio Jovem Pan retirar do site vídeo em que o comentarista Marco Antônio Villa reclama dos pagamentos feitos a ministros do STJ – citando expressamente o ministro Joel Ilan Paciornik. Veja:
Os reclamantes alegaram desrespeito à decisão do plenário do STF na ADP 130, quando o Tribunal revogou a lei de imprensa, por considerá-la incompatível com a Carta Magna. A decisão ocorreu há dez anos.
Já o ministro Joel alegou que “o fato que ensejou esta verdadeira campanha difamatória contra o reclamado foi, tão somente, a remuneração recebida especificamente e apenas no mês de maio de 2016, logo após ele ter ascendido do Tribunal Regional Federal à função de Ministro do Superior Tribunal de Justiça. Omitiu-se, em todas as postagens realizadas pelos reclamantes, que se trata de valor devido e lastreado em lei”.
A PGR manifestou-se no processo pela procedência da reclamação, com a confirmação da liminar já deferida, ao concluir pela ocorrência de censura prévia. Para o subprocurador-Geral da República Carlos Alberto Vilhena, as decisões de 1º e 2ª graus realizaram "juízo de cognição sumária", "negligenciando a plenitude da liberdade de imprensa em face de qualquer censura prévia".
Liberdade de imprensa
Celso de Mello consignou na decisão que a questão assume “indiscutível magnitude de ordem político-jurídica”, notadamente em face do que decidido pelo Tribunal no julgamento da ADPF 130, quando a Corte “pôs em destaque, de maneira muito expressiva, uma das mais relevantes franquias constitucionais: a liberdade de manifestação do pensamento”.
“A liberdade de manifestação do pensamento, que representa um dos fundamentos em que se apoia a própria noção de Estado Democrático de Direito, não pode ser restringida, ainda que em sede jurisdicional , pela prática da censura estatal, sempre ilegítima e impregnada de caráter proteiforme, eis que se materializa, “ex parte Principis ”, por qualquer meio que importe em interdição, em inibição, em embaraço ou em frustração dessa essencial franquia constitucional, em cujo âmbito compreende-se, por efeito de sua natureza mesma, a liberdade de imprensa.”
S. Exa. destacou no voto precedentes do Supremo que desautorizam a utilização, pelo Judiciário, do poder geral de cautela como “ilegítimo instrumento de interdição censória” da imprensa.
“A liberdade de imprensa, qualificada por sua natureza essencialmente constitucional, assegura aos profissionais de comunicação social, inclusive àqueles que praticam o jornalismo digital, o direito de opinar, de criticar (ainda que de modo veemente), de buscar, de receber e de transmitir informações e ideias por quaisquer meios, ressalvada, no entanto, a possibilidade de intervenção judicial, necessariamente “a posteriori”, nos casos em que se registrar prática abusiva – inocorrente na espécie – dessa prerrogativa de ordem jurídica, resguardado, sempre, o sigilo da fonte quando, a critério do próprio jornalista, este assim o julgar necessário ao seu exercício profissional.”
Celso de Mello afirmou que é arbitrária e inconciliável com a proteção constitucional da informação a repressão, ainda que civil, à crítica jornalística. Lembrou o ministro que o Estado – inclusive seus juízes e Tribunais – “não dispõe de poder algum sobre a palavra, sobre as ideias e sobre as convicções manifestadas pelos profissionais da imprensa”.
Assim, concluiu o decano, a decisão judicial imposta para retirada da matéria e da imagem do ministro Joel do portal Jovem Pan Online é “clara transgressão ao comando emergente da decisão que esta Corte Suprema proferiu, com efeito vinculante, na ADPF 130”.
- Processo: Rcl 31.117
Veja a decisão.