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STF rejeita denúncia por racismo contra Bolsonaro

Voto do ministro Alexandre de Moraes desempatou o julgamento pela rejeição da denúncia.

11/9/2018

Por maioria apertada de votos (3 x 2), a 1ª turma do STF rejeitou denúncia de racismo apresentada pela PGR contra o candidato à presidência da República Jair Bolsonaro. A decisão se deu nesta terça-feira, 11, com o voto-vista do ministro Alexandre de Moraes, que desempatou o julgamento pela rejeição da denúncia.

De acordo com a PGR, durante palestra no Clube Hebraica do Rio, em abril do ano passado, em pouco mais de uma hora de discurso, Jair Bolsonaro usou expressões de cunho discriminatório contra quilombolas, indígenas, refugiados, mulheres e LGBTs.

Na palestra que motivou a denúncia, o parlamentar afirmou, dentre outros: "eu fui em um quilombo em Eldorado Dourado Paulista. Olha, o afrodescendente mais leve lá pesava sete arrobas. Não fazem nada! Eu acho que nem para procriador eles servem mais". 

O julgamento, que teve início em 28 de agosto, estava empatado em 2 a 2 quando o ministro Moraes pediu vista. Relator, o ministro Marco Aurélio rejeitou a denúncia. Ele entendeu que as declarações de Bolsonaro não configuram conteúdo discriminatório, estão inseridas na liberdade de expressão e protegidas pela imunidade parlamentar. O voto foi acompanhado pelo ministro Luiz Fux e, hoje, por Alexandre de Moraes.

O ministro Moraes considerou que as declarações de Bolsonaro, embora "grosseiras" e "vulgares", não extrapolaram para um discurso de ódio. Para ele, são declarações absolutamente desconectadas da realidade, mas, no contexto da imunidade parlamentar, a não extrapolaram os limites da liberdade de expressão qualificada e abrangida pela imunidade material. “Não teria a meu ver extrapolado um verdadeiro discurso de ódio, de incitação ao racismo ou à xenofobia.”

A divergência foi aberta pelo ministro Luís Roberto Barroso, que recebeu a denúncia em relação aos quilombolas e afrodescendentes. A ministra Rosa Weber também votou no sentido de receber a denúncia, contudo, apenas em relação aos quilombolas. 

Voto do relator

O ministro Marco Aurélio deixou de receber a denúncia pois entendeu pela não configuração do conteúdo discriminatório, pontuou que as manifestações estão inseridas na liberdade de expressão prevista no art. 5º, inciso 4º,  da CF, e protegias pela imunidade parlamentar. 

Segundo ele, na referência feita aos quilombolas, a utilização do vocábulo 'arrobas' não configura ato de desumanização dos quilombolas, mas sim uma forma de expressão "infeliz", invocada a fim de enfatizar que está um cidadão específico do grupo acima do peso tido como adequado. "Não há conteúdo preconceituoso ou discriminatório na afirmação, não sendo possível afirmar que a fala decorre da condição subjetiva do quilombola."

Quanto a incitação ao crime por comportamento xenofóbico, o ministro entendeu "insubsistentes as premissas lançadas pela acusação". "O delito, o qual considerado o princípio da auto responsabilidade, já apontei como excepcional, é de perigo abstrato, cuja tipicidade há de ser materializada teleologicamente, ou seja, embora não se exija que do discurso dito incitador sobrevenha a efetiva prática de atos discriminatórios, revela-se imprescindível a aptidão material do teor das falas a desencadeá-los."

Para ele, as afirmações lançadas pelo denunciado situam-se no âmbito da crítica à política de imigração adotada pelo governo, não configurando conteúdo discriminatório ou passível de incitar pensamentos e condutas xenofóbicas pelo público ouvinte. "O próprio acusado, na fala do minuto 56 da palestra, diz não fazer distinção quanto a origem estrangeira do imigrante, a crítica também se revela inserida na liberdade de manifestação de pensamento, insuscetível de configurar crime." 

"Em Direito Penal condutas passíveis de censura no plano moral são indiferentes e insuficientes a legitimarem a incidência da norma incriminadora."

Marco Aurélio apontou ainda que o convite para a palestra no clube Hebraica deu-se em razão do exercício do cargo de deputado Federal ocupado por Bolsonaro e que, da análise dos pronunciamentos do parlamentar na Câmara dos Deputados, "depreende-se a vinculação das manifestações apresentadas na palestra com atuação no Congresso Nacional".

"Declarações, ainda que ocorridas fora das dependências do Congresso Nacional e eventualmente sujeitas a censura moral, quando retratam o exercício do cargo eletivo, a atuação do congressista, estão cobertas pela imunidade prevista no artigo 53, caput, da Constituição Federal, a implicar a exclusão da tipicidade." 

Veja a íntegra do voto.

Divergência

Abrindo a divergência, o ministro Luís Roberto Barroso destacou algumas falas de Bolsonaro durante a palestra para complementar o raciocínio de seu voto. Ele fez referência aos trechos em que Bolsonaro se referiu às mulheres, índios, estrangeiros e pobres, e afirmou que as falas ultrapassavam todos os limites do erro, “sem, todavia, transporem as fronteiras do crime”.

“Na minha visão do mudo, elas são posições pré-iluministas. Mas embora a Constituição seja um produto do iluminismo ela não obriga a que todos assim sejam. De modo que quanto a estes pontos eu penso que a conduta do denunciado esta abrigada pela liberdade de expressão e pela imunidade parlamentar.”

No entanto, ao destacar o que Bolsonaro disse sobre os quilombolas e afrodescendentes, Barroso entendeu que a utilização dos  termos “arroba e procriador”, expressões que se referem a animais irracionais, é elemento plausível para o recebimento da denúncia. “Penso que equiparar pessoas negras a bichos, para fins de recebimento da denúncia, é um elemento plausível.”

Barroso também leu trechos transcritos da palestra na qual Bolsonaro fez referência aos homossexuais: “não vou dar uma de hipócrita aqui: prefiro que um filho meu morra num acidente do que apareça com um bigodudo por aí. Para mim ele vai ter morrido mesmo. (...) Não vou combater nem discriminar, mas, seu vir dois homens se beijando na rua, vou bater.”

Para o ministro, embora ainda não haja no direito brasileiro a tipificação do crime de homofobia, ele considerou que a conduta do parlamentar se enquadra nos tipos de incitação e apologia ao crime, previstos nos artigos 286 e 287, do CP. 

“Me parece, inequivocamente claro, um tipo de discurso de ódio que o direito constitucional brasileiro não admite, que é o ódio contra grupos minoritários, historicamente violentados e vulneráveis.”

Incitação ao crime

Bolsonaro é réu no STF em outra ação penal, aberta em 2016, por entrevista na qual ele disse que a deputada Maria do Rosário (PT/RS) não merecia ser estuprada. Ao jornal "Zero Hora", ele declarou em dezembro de 2014 que ela era “muito ruim” e “muito feia”, e por isso não seria merecedora do estupro. Na primeira ação penal, o parlamentar responde por incitação ao crime, que tem pena de três a seis meses, e injúria, cuja punição varia de um a seis meses de detenção. 

Confira a íntegra do voto do ministro Marco Aurélio.

Veja a íntegra da denúncia da PGR.

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