Presente de grego
O presidente do STJ, Nilson Naves, classificou como estranha a inclusão dos artigos sem aprovação. Mas procurou minimizar o efeito de um deles, o que estabelece a independência entre os três poderes da República.
— Esse é um daqueles princípios eternos e universais para nós. Ainda que não constasse do texto da Constituição, é um princípio que haveria de ser obedecido. O fato não tira a legitimidade da Carta.
Responsável pela instalação da Assembléia Nacional Constituinte em 1 de fevereiro de 1987 como presidente do STF, o ex-ministro José Carlos Moreira Alves se disse surpreso com a revelação, apesar de não considerar a falha como algo que possa desabonar a Constituição.
— Não sabia de coisa semelhante em matéria de Constituição. Mas é deve ser um caso excepcionalíssimo — disse Moreira Alves.
Para o ministro do STF Carlos Velloso, a inclusão do artigo 2° no texto da Constituição de 1988 em nada alterou o conjunto da obra. Segundo ele, mesmo que não existisse o artigo, o princípio da independência entre os poderes já estaria garantido nas demais passagens da Carta.
— Não é só ali que se declara que os poderes são independentes. Está em diversas passagens da Constituição. Esse artigo seria até desnecessário. Ele só explicita algo que já está na Constituição — observou Velloso.
O presidente da AJUFE, Paulo Sérgio Domingues, ironizou a revelação:
— Será que tudo o que a gente sabe que foi aprovado foi realmente aprovado? E será que em todas as votações os parlamentares sabem o que estão votando?
O que aconteceu?
Um dos trechos incluídos na Constituição sem votação é o artigo 2º, que estabelece o princípio da separação dos poderes: “São poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário”. Jobim conta que, concluídas as votações da Carta, criou-se uma comissão que cuidou de checar a correção gramatical do texto e organizá-lo para a votação da redação final, que seria apenas simbólica. Um dos constituintes acompanhava o trabalho e notou a falha. Procurou Jobim: “E agora, o que fazemos?”. “Vamos incluir, não tem outro jeito”, respondeu Jobim, então deputado pelo PMDB gaúcho.
Anos depois, Jobim e esse deputado travavam um debate sobre a validade da revisão constitucional. O parlamentar defendia a tese de que a revisão não poderia ser realizada porque o plebiscito de 1993 mantivera o sistema presidencialista e o modelo republicano no país. E usou exatamente o artigo 2º para sustentar sua teoria, a de que a revisão seria uma interferência do Legislativo sobre o Executivo, proibida pelo dispositivo que trata da independência dos poderes.
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