A Corte Especial do STJ começou a discutir nesta quarta-feira, 16, a restrição do foro privilegiado no Tribunal diante da recente decisão do STF, que restringiu o foro por prerrogativa de função aos crimes cometidos durante o exercício do cargo e relacionados à função desempenhada.
Na pauta do colegiado estava AP cujo réu é um conselheiro do TCE/DF, acusado por crime cometido enquanto ele ocupava mandato de deputado distrital. O ministro Mauro Campbell, relator, trouxe questão de ordem para que a Corte decida se o STJ tem competência para analisar a denúncia e se poderia aplicar a decisão do Supremo.
Em seu voto, o ministro destacou que o princípio da simetria não pode ser utilizado pelo STJ para aplicar o recente entendimento.
"O Princípio da Simetria surgiu para garantir o paralelismo que deve existir entre as Constituições Estaduais e a Constituição Federal. Não é instituto apto para orientar na interpretação de artigos previstos no próprio texto constitucional. A sua finalidade não é dirimir controvérsias entre as normas da Constituição Federal e, sim, entre estas e os dispositivos das Constituições Estaduais."
O ministro apontou que se está diante de um caso de “pura interpretação constitucional” e “jamais” seria o caso de utilizar deste vetor interpretativo para, por arrastamento, subtrair competência de natureza constitucional originalmente delegada ao Supremo.
“Se está diante de um caso de pura interpretação constitucional, o que é competência do STF, e não do STJ, assim entendo que considerando a decisão do STF, não é aplicável ao caso concreto, por expressa determinação da Corte Suprema.”
Caso o STJ aplicasse o entendimento, para o ministro, estaria restringindo o direito ao juízo natural, previsto na Constituição, o que também é discussão exclusiva da competência do STF. Além disso, o ministro destacou que Supremo e Congresso, que são os competentes para tratar do assunto, já estão fazendo.
Campbell citou a PEC em tramite na Câmara dos Deputados, que prevê a restrição do foro, mantendo o benefício somente para os presidentes da República, do Senado, da Câmara e do STF, além do vice-presidente da República; e retira foro de juízes Federais, de membros do MP, de deputados, de senadores, de governadores, de desembargadores dos TJs, de membros dos tribunais de contas, dos TRFs, dos tribunais eleitorais e do trabalho e dos conselhos dos municípios.
Em conclusão, votou no sentido de que todos os feitos penais originários de competência da Corte Especial permaneçam em curso regular, enquanto se aguarda eventual deliberação do Supremo, que deve decidir se aprova súmula vinculante sore o tema, e do Congresso, quanto a eventual alteração.
"A decisão prolatada pelo Supremo Tribunal Federal na Questão de Ordem na Ação Penal nº 937/RJ não é aplicável a este Superior Tribunal de Justiça, seja por ressalva expressa da própria Corte Constitucional, tampouco por simetria a Governadores tendo em vista que não se pode dar tratamento não isonômico a autoridades que a própria Constituição Federal equiparou quanto ao respectivo Juiz Natural."
Divergiram do relator, o ministro Noronha e a ministra Maria Thereza, que votaram no sentido de que o STJ pode sim interpretar sua própria competência e não precisa se valer do princípio da simetria para aplicar o entendimento do Supremo aos casos que estão sob sua competência. A ministra Maria Thereza também pontuou não ver diferença substancial entre as autoridades com foro no STF e as com foro no STJ ao ponto de justificar entendimentos diferentes.
O ministro Luis Felipe Salomão pediu vista para alinhar as ideias diante do voto do ministro Mauro, mas adiantou que seu posicionamento é contrário. Para ele, não parece razoável que um juiz de primeiro grau possa julgar um Senador e um Deputado Federal, mas não alguém que tenha prerrogativa no STJ.
De acordo com o ministro, a Corte Superior pode sim definir sua própria competência. “Não vejo como, em um sistema republicano, nós mantermos deputado e senador sendo julgado em primeiro grau, em crime comum, e um desembargador sendo julgado no STJ”.
Logo após a decisão do STF sobre o foro, o ministro Salomão foi o primeiro a enviar para o 1º grau uma ação penal contra governador, aplicando o princípio da simetria.
MPF
A manifestação do MPF entregue ao STJ sobre o tema foi diferente da feita no STF. Enquanto no Supremo a PGR defendeu a restrição do foro privilegiado para deputados e senadores, no Tribunal Superior o vice-procurador-geral da República Luciano Mariz Maia argumentou que os ministros da Corte são mais confiáveis para julgarem autoridades estaduais.
“A autoridade dos ministros do Superior Tribunal de Justiça transmite segurança e tranquilidade para investigados e denunciados, assim como para os cidadãos. É a garantia de que não temem nem se curvam ao Poder das elevadas autoridades nos estados membros ou no Distrito Federal. A confiança na autoridade de suas decisões é capaz de devolver paz social.”
Súmulas vinculantes
Após a decisão do plenário do STF, o ministro Dias Toffoli, do STF, encaminhou à ministra Cármen Lúcia, presidente da Corte, uma proposta de edição de duas súmulas vinculantes que estendam a decisão da Corte sobre o foro por prerrogativa de função a outros cargos federais, estaduais, distritais e municipais. Veja abaixo:
Veja a íntegra do voto do ministro Mauro.Proposta de súmula: A competência por prerrogativa de foro, prevista na CF/88 para agentes públicos dos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário e do Ministério Público, compreende exclusivamente os crimes praticados no exercício e em razão do cargo ou da função pública.
Proposta de súmula: São inconstitucionais normas de Constituições Estaduais e da Lei Orgânica do DF que contemplam hipóteses de prerrogativa de foro não previstas expressamente na Constituição Federal, vedada a invocação de simetria.
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Processo: APn 857
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