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STF limita foro privilegiado a crimes durante e em função do cargo

Prevaleceu a tese do relator, Barroso, que foi acompanhado por seis ministros.

3/5/2018

Após cinco sessões plenárias discutindo o tema, o STF decidiu, nesta quinta-feira, 3, dar nova interpretação ao foro por prerrogativa de função. Agora, o foro por prerrogativa de função aplica-se apenas aos crimes cometidos durante o exercício do cargo e relacionados à função desempenhada.

Prevaleceu a tese elaborada pelo relator, ministro Luís Roberto Barroso:

1) O foro por prerrogativa de função aplica-se apenas aos crimes cometidos durante o exercício do cargo e relacionados às funções desempenhadas.

2) Após o final da instrução processual, com a publicação do despacho de intimação para apresentação de alegações finais, a competência para processar e julgar as ações penais não será mais afetada em razão de o agente público vir a ocupar outro cargo ou deixar o cargo que ocupava, qualquer que seja o motivo.

O voto de Barroso foi acompanhado integralmente por Rosa Weber, Cármen Lúcia, Edson Fachin, Luiz Fux e Celso de Mello.

Marco Aurélio também acompanhou o relator sobre limitar o instituto. O ministro divergiu apenas quanto à segunda parte da tese porque, para ele, assim que o réu deixa de ocupar o cargo, a prerrogativa deve ser cessada, independentemente do momento processual.

Uma segunda tese foi proposta na discussão. Alexandre de Moraes sugeriu que o foro fosse restrito aos crimes cometidos durante o mandato, independentemente de terem relação com a função. Ele foi acompanhado por Lewandowski e, parcialmente, por Dias Toffoli. Os três ficaram vencidos.

No início da sessão desta quinta-feira, Toffoli retificou seu voto e apresentou uma terceira tese, a qual abarca a situação de autoridades que têm prerrogativa e não sejam parlamentares - como se dá no caso concreto. O ministro propôs que a restrição ao foro seja ampliada a todos os cargos, e que seja declarada a inconstitucionalidade de constituições estaduais no ponto em que ampliam a prerrogativa de foro.

Sobe e desce

A discussão se deu no julgamento da questão de ordem na AP 937, que teve início em maio do ano passado. O caso concreto é de ação ajuizada pelo MP eleitoral contra o ex-deputado Federal Marquinho Mendes, por suposta compra de votos nas eleições municipais de 2008, quando foi eleito prefeito de Cabo Frio/RJ.

O processo começou a tramitar no TRE/RJ, mas no momento do recebimento da denúncia, já expirado seu mandato de prefeito, o processo teve de ser remetido à 1º instância da Justiça Eleitoral.

Em 2015, Mendes foi diplomado deputado, então o processo subiu para o Supremo. Mas, nas eleições municipais de 2016, Marquinho Mendes foi eleito novamente prefeito de Cabo Frio e renunciou ao mandato de deputado para assumir a prefeitura. Com isso, a competência voltaria para o TRE. Com as mudanças de competência e o risco de prescrição da pena, o relator decidiu remeter a questão de ordem ao plenário.

Com a decisão, foi determinada a baixa da ação penal ao juízo da 256ª zona eleitoral do RJ para julgamento, tendo em vista que o crime imputado ao réu não foi cometido no cargo de deputado Federal e em razão dele, e ainda que o réu renunciou ao cargo para assumir ao cargo de prefeito, tendo a instrução processual se encerrado na 1ª instância, antes do deslocamento do processo.

Retificação

Iniciada a sessão desta quinta, o ministro Toffoli anunciou que faria um adendo a seu voto, proferido na quarta, e uma retificação, no sentido de trazer balizamentos em relação a outros cargos e funções no que pertine à aplicação ou não do foro por prerrogativa de função.

Ele apontou que não se pode tão somente restringir o foro aos parlamentares – que é do que trata o caso concreto. Pelo princípio da isonomia, o ministro destacou que a interpretação deve ser aplicada a todos os que têm foro por prerrogativa.

Ele observou que, pela jurisprudência da Corte, não compete às Constituições estaduais estabelecerem foro por prerrogativa de função – e que elas o fazem. “Isso é matéria de legislação exclusiva da União, na forma do art. 22 da CF.”

Ele, assim, fez nova conclusão:

Em resumo, resolvo a questão de ordem no sentido de:

i) fixar a competência do STF para processar e julgar os membros do Congresso Nacional exclusivamente quanto aos crimes praticados após a diplomação, independentemente de sua relação ou não com a função pública em questão;

ii) fixar a competência por prerrogativa de foro, prevista na CF, quanto aos demais cargos exclusivamente quanto aos crimes praticados após a diplomação ou a nomeação, quando for o caso, independentemente de sua relação ou não com a função pública em questão;

iii) serem inaplicáveis as regras constitucionais de prerrogativa de foro quanto aos crimes praticados anteriormente à diplomação ou nomeação, conforme o caso, hipótese em que os processos deverão ser remetidos ao juízo de 1ª instância competente, independentemente da fase em que se encontre;

iv) reconhecer a inconstitucionalidade de todas as normas previstas em constituições estaduais, bem como na lei orgânica do DF, que contemplem hipóteses de prerrogativa de foro não previstas expressamente na CF, vedada a invocação de simetria. Nestes casos, os processos deverão ser remetidos ao juízo de 1ª instância competente, independentemente da fase em que se encontram;

v) estabelecer, quando aplicável a competência por prerrogativa de foro, que a renúncia ou a cessação, por qualquer outro motivo da função pública que atraia a causa penal ao foro especial após o encerramento da fase do art. 10 da lei 8.038/90 com a determinação de vista às partes para alegações finais, não altera a competência para o julgamento da ação penal.

No segundo item, afirmou, a tese atingiria um número expressivo de casos relativos a prefeitos, por exemplos, que são julgados, por força da CF, perante os TJs, tanto quanto a crimes cometidos após a diplomação, quanto a crimes cometidos antes da diplomação. Assim, em crimes anteriores à diplomação, os processos cairiam de imediato.

Voto de Gilmar

Último a votar neste julgamento, o ministro Gilmar Mendes criticou a Justiça em suas instâncias primárias, e afirmou que é necessária sua modernização. Ele alegou, ainda, que limitar o foro como proposto pelo relator seria incompatível com a CF. Por outro lado, entende “insustentável” manter o instituto da forma como é aplicado hoje.

Parte do voto do ministro foi tomada por crítica a pesquisa da FGV indicando que a restrição do foro tiraria 95% das investigações de políticos do STF. "Estudo tem mais erros do que páginas." O ministro destacou que números podem distorcer a realidade, e que os dados deveriam ser trazidos de forma imparcial. "A jurisdição prestada pelo Supremo está longe de ser pior do que aquela prestada pelas instâncias ordinárias."

O ministro apontou, assim como Toffoli, que o tribunal precisa rever a jurisprudência histórica que admite a ampliação da prerrogativa de foro pelas constituições estaduais. Considerando que praticamente todas estendem a prerrogativa, seria o caso, para Gilmar, de se adotar súmula vinculante: “É inconstitucional dispositivo de constituição estadual que disponha sobre competência do TJ para julgar autoridades sem cargo similar contemplado pela CF."

Caso acolhida a questão de ordem, Gilmar propõe a pronuncia de inconstitucionalidade de todas as prerrogativas e inviolabilidades previstas por lei.

Por fim, embora afirme estar convicto quanto ao caráter indevido da revisão da CF que a Corte realiza, o ministro anunciou que se alinharia à posição de Dias Toffoli – o qual entende que é de se declarar a aplicação aos demais cargos.

Concluindo, Gilmar Mendes acompanhou em parte o relator, fixando o momento da prolação do despacho que abre ao MP prazo para alegações finais; propôs a ideia da súmula vinculante, e a declaração de inconstitucionalidade a todas as normas que dão prerrogativas a membros do Judiciário e do MP; e entende que o mesmo critério que se adota para deputados e senadores seja aplicado também em relação aos demais ocupantes de funções: juízes, promotores, comandantes do exército, marinha e aeronáutica, membros do TCU. Os fatos que não disserem respeito à sua atividade, ou pelo menos que não guardarem relação com o exercício posterior à sua nomeação, ficarão na 1ª instância.

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