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STF amplia recursos de fundo partidário a campanhas eleitorais de mulheres

Ministros entenderam que deve ser equiparado o patamar mínimo de candidaturas femininas, 30%, ao mínimo de recursos do fundo a serem destinados.

15/3/2018

É inconstitucional dispositivo da minirreforma eleitoral que estabelece percentual mínimo de 5% e máximo de 15% de recurso de fundo partidário para campanhas femininas. Assim entendeu o plenário do STF nesta quinta-feira, 15, ao julgar ADIn que questionava artigo da minirreforma eleitoral de 2015.

Seguindo o voto do relator, ministro Fachin, a maioria dos ministros entendeu que deve ser equiparado o patamar mínimo de candidaturas femininas, 30%, ao mínimo de recursos do fundo a serem destinados. O plenário também decidiu que é inconstitucional a fixação de prazo para esta regra, como determinava a lei, e que a distribuição não discriminatória deve perdurar enquanto for justificada a necessidade de composição mínima das candidaturas femininas.

Proposta pela PGR, a ADIn julgada na sessão desta quinta-feira sustentou que não basta que a lei reserve percentual de vagas para candidatas - é preciso garantir que elas tenham recursos suficientes para disputar o pleito eleitoral em igualdade de condições com os homens. O dispositivo questionado (art. 9º da lei 13.165/15) estabelecia percentuais mínimo de 5% e máximo de 15% dos recursos para aplicação em campanhas eleitorais de mulheres, fixando ainda prazo de vigência da regra – "nas três eleições que se seguirem à publicação da lei".

A PGR sustentou violação ao princípio da igualdade e outros previstos na CF, e que o limite máximo de 15% previsto na lei produz mais desigualdade e menos pluralismo nas posições de gênero. “Se não há limites máximos para financiamento de campanhas de homens, não se podem fixar limites máximos para as mulheres.” Assim, pediu que se dê ao dispositivo impugnado interpretação conforme a CF para equiparar o mínimo de 30% de candidaturas femininas estabelecido pela lei eleitoral ao percentual mínimo de recursos do Fundo.

Decisão

O pedido foi acolhido pelo relator. Edson Fachin iniciou seu voto com palavras de Bertha Lutz em conferência de inauguração da ONU: “Nunca haverá paz no mundo enquanto as mulheres não ajudarem a criá-la”. A bióloga vocalizou ali o anseio das mulheres em ocupar a esfera pública, lembrou o ministro.

“Hoje, conclama-se o STF a robustecer a vedação à discriminação por gênero para realizar a promoção de uma sociedade plenamente justa, solidária e livre, e a promessa constitucional da igualdade, tudo nos limites e nas possibilidades da Constituição e da unidade da ordem normativa. Tal como a paz, não haverá verdadeira democracia enquanto não se talharem as condições para se tornarem audíveis as vozes das mulheres na política.”

Em seu voto, Fachin lembrou que, quando da edição da lei 9.504/97, os partidos passaram a ser obrigados a preencher, do número de candidaturas, o mínimo de 30% e máximo de 70% para candidaturas de cada sexo. Neste sentido, a distribuição de recursos fixada posteriormente por meio da lei impugnada, com piso de 5% “significa, na prática, que, na distribuição de recursos públicos, a agremiação partidária deve destinar às candidaturas quociente tal que os homens poderiam receber 95%”.

“Inexistem justificas razoáveis, nem racionais e muito menos constitucionais para essa discriminação. A autonomia partidária, insculpida na constituição, não consagra regra que exima o partido do respeito incondicional aos direitos fundamentais. (...) A autonomia partidária não justifica o tratamento discriminatório entre candidatura de homens e mulheres.”

Para o ministro, a inconstitucionalidade é manifesta. Assim, acolheu integralmente o pedido para dar interpretação conforme a CF ao art. 9º para equiparar o patamar legal mínimo de candidaturas femininas ao mínimo de recursos de fundo partidário a serem destinados, que deve ser interpretado como de 30% do montante do fundo alocado em cada partido para eleições majoritárias e proporcionais; e fixar que, havendo percentual mais elevado de candidaturas femininas ou mínimo de recursos globais do partido destinados a campanhas, lhe seja alocado na mesma proporção, se houver percentual mais elevado a 30%.

O relator também declarou inconstitucional a expressão “três” contida no art. 9ª, no trecho em que diz "nas três eleições que se seguirem”, retirando o limite temporal da aplicação da norma; e, por arrastamento, o § 5a e §7 do art. 14 da lei dos partidos políticos (9.096/95).

Edson Fachin foi seguido integralmente pelos ministros Alexandre de Moraes, Luís Roberto Barroso, Rosa Weber, Dias Toffoli e Cármen Lúcia.

O ministro Ricardo Lewandowski acompanhou o entendimento do relator, votando por fazer apenas um adendo: que fosse declarada a inconstitucionalidade do trecho do artigo que diz “incluídos nesse valor os recursos a que se refere o inciso V do art. 44 da Lei no 9.096, de 19 de setembro de 1995". Fachin observou que, embora estivesse de acordo com a observação de Lewandowski, se restringiria ao pedido formal da inicial – no qual não consta a exclusão do trecho. O ministro Luiz Fux seguiu o entendimento de Lewandowski.

Tese diversa

Marco Aurélio e Gilmar Mendes foram os únicos ministros a entenderem em sentido diverso do relator. Os ministros, em divergência inaugurada por Marco Aurélio, entenderam por derrubar os limites de 5% e 15% dos fundos, mas sem o repasse de 30% das verbas.

Os votos foram no sentido da parcial procedência, limitando-se ao pedido formalizado. “Não vejo como atuarmos como legisladores positivos e fixar os 30% como percentagem para as campanhas das mulheres. Dou interpretação conforme a Constituição para limitar qualquer tentativa de fixar outros percentuais.”

"Eu sei que muitos de nós têm vocação enorme para o legislativo, talvez até devêssemos estar lá. Mas lá é o locus certo para fazer esse tipo de reforma. Uma matéria que é extremamente complexa, e que cada mexida já inspira a imaginação de novos jogos", disse Mendes.

Luta feminina

No início do julgamento, falou pela PGR o vice-procurador-Geral da República, Luciano Mariz Maia, que iniciou sua fala apontando a luta da mulher pelo reconhecimento de sua dignidade. Ele lembrou o assassinado da vereadora Marielle Franco, ocorrido na noite anterior, quarta-feira, 14, no RJ.

"A luta da mulher pelo reconhecimento da sua dignidade enquanto pessoa e pelo reconhecimento da sua igualdade traz exemplos de muita dor e de muito sangue. Hoje, uma semana após a celebração do Dia Internacional da Mulher, acordamos atingidos pelas balas que mataram a vereadora Marielle Franco no RJ, e atingem em cheio a democracia. A vereadora, uma mulher negra da comunidade mais carente do RJ, elevou sua voz para fazer silenciar as injustiças e foi silenciada covardemente. Mas se a ela tentaram calar e derrubar, devem saber que não se pode deter o rumo da história – e a história significa a força da mulher para ter o reconhecimento da sua igualdade."

O vice-procurador destacou que a lei acolhe várias violações à CF quando estabelece, sem razões, “diferenciação injustificável entre o que se estabelece para os homens e o que se estabelece para as mulheres”.

Representando amici curiae, falou pela Abradep - Academia brasileira de Direito Eleitoral e Político a advogada Poliana Pereira dos Santos; e, pela organização Cepia - Cidadania, Estudo, Pesquisa, Informação e Ação, falou a advogada Ligia Fabris Campos. “A inconstitucionalidade desse dispositivo é gritante, uma vez que cria por lei uma desigualdade em prejuízo de um grupo já desfavorecido, e assim, afronta frontalmente o princípio constitucional da igualdade entre homens e mulheres. Ou seja, homens podem ter 100% dessas verbas e mulheres ficam com até 15%", argumentou Campos.

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