A gravação ambiental produzida por um dos interlocutores, na condição de vítima de um crime, com o objetivo de assegurar o seu direito, independe de autorização judicial, sendo ainda irrelevante a propriedade do aparelho utilizado.
Com base nesse entendimento, a 5ª turma do STJ considerou legal a gravação feita pela vítima de um defensor público condenado por solicitar pagamento de R$ 8 mil a ela e à sua filha para defender esta última em processo criminal por tráfico de drogas.
A quantia combinada deveria ser paga em parcelas de R$ 500. A primeira já havia sido paga, porém, constrangida com a conduta do defensor, a mãe procurou o MP/RR e o caso foi encaminhado à Polícia Civil.
Ela gravou a conversa telefônica em que acertavam o valor e o dia da entrega. O encontro também foi filmado pela vítima, quando o acusado recebeu a quantia em dinheiro referente à segunda parcela do acordo.
Corrupção passiva
O defensor foi denunciado pela prática do crime de corrupção passiva e condenado à pena de dois anos de reclusão e 20 dias-multa, em regime aberto, que foi substituída por duas penas restritivas de direitos. A decisão foi mantida pelo TJ/RR.
Em recurso ao STJ, o defensor público alegou que a prova seria ilegal, pois não houve autorização judicial para "a gravação clandestina produzida e induzida pela polícia", que forneceu o equipamento, de propriedade pública. Sustentou que o crime de corrupção passiva tem como vítima o Estado. Por isso, a pessoa que gravou conversa entre si e o réu deveria ser considerada testemunha dos fatos, e não vítima.
O relator do recurso, ministro Reynaldo Soares da Fonseca, ressaltou que no crime de corrupção passiva, o sujeito ativo é somente o funcionário público, sendo o sujeito passivo o Estado ou a Administração Pública e, secundariamente, a pessoa constrangida pelo agente público, "desde que não tenha praticado o crime de corrupção ativa".
Condição de vítima
O ministro explicou que a condição da pessoa constrangida pela solicitação, e que pagou o valor, é de vítima, e não de testemunha. Para ele, o fato legitima a gravação ambiental, realizada sem o conhecimento do agente dos fatos e independentemente de autorização judicial.
O relator frisou ainda que, conforme consta do processo, a mãe não praticou qualquer conduta no sentido de oferecer ou prometer vantagem indevida, efetuando os pagamentos somente pela solicitação do recorrente, figurando na realidade como vítima secundária do delito de corrupção passiva.
"A circunstância de a polícia haver fornecido o equipamento usado para a gravação também não macula o procedimento, porque a lei não exige autorização judicial para a gravação ambiental, realizada por um dos interlocutores, na condição de vítima, a fim de resguardar direito próprio. Diante disso, mostra-se irrelevante a propriedade do gravador."
Para o relator, mesmo que a gravação ilegal pela defesa fosse excluída, a condenação seria mantida mediante as provas, como os depoimentos da vítima, narrando pormenorizadamente todos os fatos, do próprio acusado, gravação de conversa em que ficou acertada a entrega do valor solicitado, bem como o encontro no dia e local acertados entre a vítima e o acusado.
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Processo: REsp 1.689.365
Confira a íntegra da decisão.