Família
TJ/GO: namoro não é união estável
A simples existência de relacionamento amoroso entre homem e mulher, ainda que prolongado, não autoriza, por si só, o reconhecimento da união estável. Com esse entendimento a 4ª Câmara Cível do TJ/GO, por maioria de votos, seguindo voto do relator, desembargador João de Almeida Branco, negou provimento à apelação cível interposta por D.S.R.R, contra decisão do juízo da 3ª Vara da Fazenda Pública de Goiânia, que havia negado seu pedido de pagamento de pensão previdenciária feito em desfavor do Ipasgo e Estado de Goiás, sob a alegação de ter vivido em concubinato por vários anos com um magistrado, já morto. O colegiado também manteve na íntegra a parte final da sentença que condenou a autora a pagar as custas processuais e honorários advocatícios que restaram fixados no valor equivalente a 10% da pensão anual que receberia, além de ressalvar aos requeridos (Ipasgo e Estado de Goiás) o direito de postular pelas vias próprias a restituição do que indevidamente foi pago.
Segundo João de Almeida Branco, as provas produzidas nos autos não confirmam a certeza da união, já que não existe
O relator explicou que a união estável só pode ser comprovada se houver o objetivo de ambas as partes de constituir família e ponderou que o assunto deve ser analisado com muita cautela, para que se evite a equiparação de simples namoro ou romance eventual com a união estável amparada por lei. "Simples relações sexuais, ainda que repetidas, por largo espaço de tempo, não constituem concubinato, que é manifestação aparente de casamento, vivendo os dois sob o mesmo teto, como se casados fossem", afirmou Almeida Branco seguindo entendimento de Washington de Barros Monteiro, sobre convivência duradoura.
Para o magistrado, a recorrente não pode afirmar que tem direito adquirido sobre a pensão que recebia, pois ainda depende de ação correspondente para comprovar a sua convivência de união estável com o segurado do Ipasgo, o que, a seu ver, ainda está sendo discutido na atual ação declaratória. "Se tal direito ainda não foi implementado ao patrimônio jurídico da recorrente, não se pode afirmar a existência dele". Além disso, o magistrado elogiou e concordou com o ponto de vista do juiz de primeiro grau que havia ressaltado que "o direito adquirido é essencial que todas as exigências legais tenham sido cumpridas, o que investe o titular no direito de se opor contra eventual retirada mesmo quando ainda não tenha exercido esse direito. No caso da autora, constata-se que ela recebeu a pensão por cerca de 12 anos até que o Ipasgo houve por bem instaurar o processo para apurar se realmente fazia jus ao benefício, já que houve denúncia de que não fora companheira do falecido, não podendo ser considerada sua dependente".
Com relação ao argumento usado por D.S.R.R. referente ao prazo prescricional, para ver intocável seu direito de receber a referida pensão, o magistrado explicou que, em se tratando de prestação sucessiva, o direito deve ser assegurado à administração do Ipasgo que pode, a qualquer tempo, rever seus atos se constatar ilegalidades.
Na opinião de Almeida Branco a outra alegação da apelante de que seu direito à pensão foi reconhecido durante ação de justificação, é totalmente desprovido de veracidade, uma vez que esse procedimento é de jurisdição voluntária, destinado a constituir princípio de prova quanto à existência e veracidade de um fato ou de uma relação jurídica. "Não se assenta na possibilidade de dano irreparável ou de difícil reparação, bastando o interesse do requerente em constituir a prova, ainda que refutável, sobre objeto juridicamente relevante", enfatizou.
Ementa
A ementa recebeu a seguinte redação:
"Apelação Cível. Ação Declaratória de União Estável C/C Cobrança. Prova Perante o Ipasgo. Pensão por Morte do Companheiro. Improcedência. Preliminares.
1 - Deve ser rejeitada a preliminar de falta de fundamentação de sentença a quo, quando o julgador de primeiro grau, mesmo que de forma simples e concisa apresentou os seus fundamentos e sua convicção como forma de decidir, o que não quer dizer que tenha feito justiça ou injustiça.
2 - Quando a preliminar de nulidade dos depoimentos de testemunhas parcial não merece relevo, uma vez que contradita há de ser feita logo em seguida à qualificação das testemunhas, argüindo-se a sua capacidade ou impedimento. Depois de tomados os depoimentos a contradita oposta vem a destempo.
3 - Conforme previsto no art. 30, I, letra "a", do Código de Organização Judiciária do Estado de Goiás, compete à Vara da Fazenda Pública Estadual processar e julgar, "as causas em que o Estado de Goiás, suas autarquias, empresas públicas e fundações por ele mantidas, forem autoras, réus, assistentes, intervenientes ou oponentes, e as que lhes forem conexas ou acessórias".
4 - A Administração Pública pode rever de ofício os seus atos e anulá-los, quando encontrar nulidade que os maculem: o STF acabou por editar a Súmula 473, mas é bom que se respeitem direitos adquiridos, ato jurídico perfeito e demais regras que garantem a segurança jurídica.
5 - Para que se caracterize o direito adquirido é essencial que todas as exigências legais tenham sido cumpridas, o que investe o titular no direito de se opor contra eventual retirada mesmo quando ainda não tenha exercido esse direito.
6 - Tratando-se de prestação de trato sucessivo, em que é lícito ao beneficiário requerer o pagamento mesmo que tenha deixado de fazê-lo por tempo superior ao prazo prescricional alcança apenas as prestações anteriores, renovando-se o direito mês a mês, de modo que a administração pode, a qualquer tempo rever seus atos e se constatar ilegalidades, anulá-los com efeito ex-nunc.
7 - A ação de justificação é um procedimento de jurisdição voluntária, formalmente disciplinado no título de processo cautelar, destinado a constituir princípio de prova quanto a existência e veracidade de um fato ou de uma relação jurídica, onde o juiz não julga o mérito da prova, apenas homologa sua constituição.
8 - A segurança concedida por via mandamus, para garantir o devido processo legal, o contraditório e a ampla defesa, não deve adentrar ao mérito do ato administrativo, sob pena de estar o Judiciário interferindo <_st13a_personname productid="em outro Poder" w:st="on">em outro Poder constituído.
9 - "Reputa-se ato jurídico perfeito o já consumado segundo a lei vigente ao tempo que se efetuou", segundo o comando da Lei de Introdução ao Código Civil, em seu art. 6º, parágrafo 1º, mas é claro, se não existir qualquer vício no ato de originador.
10 - Não comprovando a autora os requisitos para a configuração da união estável, não há como lhe deferir o direito ao seu pretendido reconhecimento judicial.
11 - Sem o objetivo de constituir família, a entidade de fato poderá ser um mero relacionamento afetivo entre os amantes, não se caracterizando como união estável.
12 - Apelo conhecido, mas improvido". Ap. Cív. nº. 90.230-6/188 (200501349221), de Goiânia. Acórdão de 27.6.06.
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